A paralisação das atividades da mineradora Samarco, em decorrência do rompimento de uma barragem de rejeitos em Mariana (MG), tem consequências que vão além dos impactos sociais e ambientais. Décima primeira maior exportadora do País, a empresa tem peso nas exportações de minério de ferro, um dos produtos que mais contribui para manter a balança comercial brasileira superavitária. Além disso, a arrecadação do município e do Estado em que a empresa está localizada são fortemente dependentes dos royalties da mineração.
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Entre janeiro e outubro, as exportações da Samarco somaram US$ 1,85 bilhão, ou 1,15% do volume de produtos exportados pelo País. No período, a empresa foi responsável por pouco mais de 15% do total de minério de ferro comercializado com o exterior, o segundo principal produto da pauta brasileira, atrás apenas da soja.
Desde o rompimento da barragem do Fundão, no dia 5 de novembro, a extração de minério de ferro na mina de Germano, a única da empresa, está paralisada. Dias depois do acidente, que soterrou o distrito de Bento Rodrigues e deixou ao menos nove mortos e dez desaparecidos, o governo embargou a licença de operação da unidade. Desta forma, a atividade no complexo industrial de Ubu, no Espírito Santo, onde a empresa faz a pelotização do minério de ferro, foi paralisada em 11 de novembro. Os estoques para venda devem se esgotar no início de dezembro, segundo previsão da empresa.
Segundo analistas, os efeitos na balança comercial, pelo menos no curto prazo, devem ser amenos. "Os estoques das empresas do setor estão altos e podem compensar a participação da Samarco no total de exportações", afirma o economista da 4E Consultoria Bruno Lavieri. "Mas nos primeiros meses de 2016, sem a safra agrícola, o minério de ferro deve ter um peso maior na balança e os efeitos da paralisação da mina devem ser mais sentidos."
A indústria brasileira também deve ser impactada pela tragédia com a Samarco. Em relatório recente, a consultoria LCA reviu suas projeções para o PIB deste ano (para -3,3%) e do próximo (-1,7%) e citou que um dos principais motivos é a deterioração na perspectiva para o setor, em parte por causa da paralisação da mineradora. "As nossas projeções para o PIB sofreram alterações associadas, sobretudo, aos efeitos do desastre ambiental de Mariana (MG), que deverá prejudicar significativamente a atividade da indústria extrativa mineral neste 4º trimestre e em 2016", diz a consultoria.
Arrecadação
A situação da Samarco também deve afetar a arrecadação, que já vinha caindo em função da retração acentuada nos preços do minério de ferro. Segundo dados da consultoria Fioito, a arrecadação da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem) em Minas Gerais este ano acumula queda de 27,8% de janeiro a novembro, ante igual intervalo do ano passado.
Na cidade de Mariana, a baixa é menor, de 16,4%, para R$ 83,71 milhões. Isso ocorre porque, após anos de briga judicial, a Samarco reconheceu há algumas semanas débitos com Mariana e Ouro Preto referentes à diferença na arrecadação da Cfem e fez um primeiro pagamento de R$ 10,551 milhões, sendo R$ 6,025 milhões para Mariana.
Do total arrecadado com a Cfem, 65% vão para o município produtor, 23% para o Estado e 12% para a União. Minas Gerais é a que mais arrecada, representando mais de 40% do total recolhido pelos governos estaduais. Entretanto, como o imposto só é pago no segundo mês subsequente ao fato gerador, o impacto da paralisação das atividades da Samarco após o acidente de 5 de novembro será sentido só a partir de janeiro.
"Esse prazo poderá ser estendido um pouco pela comercialização de estoques da empresa e minérios já extraídos e em fase de produção. Mas com a produção parada, a tendência é não arrecadar nada", diz Valdir Farias, diretor executivo da Fioito. "E ainda tem alguns impostos que incidem sobre a produção, como o ICMS e o próprio IRPJ, que também serão afetados."
O professor de economia do Ibmec-MG Felipe Leroy lembra que o grau de dependência da região e do Estado em relação à atividade extrativa mineral é muito elevado. "O município de Mariana praticamente inexiste sem a Samarco".
A empresa empregava cerca de 3,5 mil em 2014, sendo quase 2 mil em Minas. Sua receita operacional líquida foi de R$ 7,53 bilhões no ano passado, com 100% da produção voltada para exportação. "Pode ser que no médio a longo prazo outras atividades acabem amenizando um pouco o impacto econômico desse desastre, mas no curto prazo os danos são irreparáveis", diz Leroy.
"A paralisação da Samarco vai representar uma queda de 27% da nossa arrecadação, cerca de R$ 6 milhões por mês", afirma o prefeito de Mariana, Duarte Júnior (PPS).
Retomada
Leroy acredita que, passado o atual alvoroço, dentro de alguns meses a atividade da Samarco deve ser retomada, tanto em função das negociações políticas, já que os governos municipais e estadual dependem da arrecadação oriunda da mina, quanto com a pressão popular, considerando os empregos que a produção gera.
Manifestações a favor da Samarco, inclusive, já tiveram início. Em 17 de novembro, um grupo de mil pessoas fez uma passeata em Mariana em prol da manutenção das atividades da mineradora. Em Anchieta (ES), onde está localizado o complexo de Ubu, um ato com reivindicações semelhantes foi realizado na sexta-feira (27) Em redes sociais, surgiram grupos em defesa da empresa, como o "Fica Samarco" e "Somos Todos Samarco", que mobilizaram mais de 5 mil seguidores.
"Se a empresa paralisar definitivamente as suas atividades, podemos perder mais de 4 mil empregos diretos e indiretos em Mariana. Além disso, vai haver impactos no comércio local, trazendo enormes prejuízos para o município", ressalta o prefeito da cidade.
Ainda que reconheça a dependência da mineração, Leroy critica a falta de regulamentação no setor. Apesar de Minas Gerais ser o principal Estado produtor de minérios, ainda não existe um plano estadual de desenvolvimento dessa atividade. "O Pará já tem esse plano estadual, que serve para diagnosticar o comportamento do setor e nortear as medidas de regulamentação", aponta.
Já na opinião de Faria, da consultoria Fioito, o único aspecto positivo da catástrofe da Samarco é que o acidente pode acabar acelerando a aprovação do novo Marco Regulatório da Mineração (projeto de lei 5.807, de 2013). Um dos pontos do projeto é transformar o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) em uma agência reguladora, com maior independência, mais autonomia e melhorar infraestrutura para fiscalizar o setor. "É bem provável que o acidente resulte em uma pressão maior pela aprovação do texto, que já havia sido exaustivamente debatido", comenta.