Em 2016, as mais de 17 mil entidades sindicais ativas em todo o Brasil arrecadaram R$ 3,5 bilhões, dos quais 71,52% provenientes de contribuição sindical obrigatória. O valor se aproxima do lucro da operadora de cartões Cielo (R$ 4 bilhões) e está bem acima dos resultados da Klabin (R$ 2,48 bilhões), brasileira fabricante de papeis para embalagens e caixas de papelão, no mesmo ano. Os dados sobre o sindicalismo no Brasil estão disponíveis no recém-lançado Portal de Relações do Trabalho (goo.gl/5MAKuH), do Ministério do Trabalho, e denunciam uma realidade de farra sindical existente no País.
Além do número de entidades representativas de trabalhadores ser exorbitante, muitas existem apenas para gerar arrecadação e formar lideranças políticas em vez de defender os interesses dos trabalhadores. “O papel dos sindicatos é importantíssimo. Através dele, o trabalhador negocia pleitos, como reajuste salarial e benefícios para sua categoria, assegura sua estabilidade na pré-aposentadoria, têm acesso a descontos em compras, planos de saúde e odontológico, entre outros. Por outro lado, o número de entidades no Brasil é uma imensidão frente aos sindicatos realmente atuantes”, opina o advogado previdenciário e trabalhista, Ney Araújo.
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Para se ter ideia do exagero no número de organizações brasileiras, no Reino Unido, há cerca de 170 sindicatos em atividade. Nos Estados Unidos, são 130. Na Alemanha, apenas 11. Perdemos até para os nossos vizinhos, os hermanos argentinos, cujo número de sindicatos está em aproximadamente 90. O trabalhador pode se proteger de organizações fraudulentas ao exigir a apresentação da carta sindical à entidade que representa sua categoria. O documento é emitido pelo Governo Federal e garante legalidade de atuação. Mesmo assim, acontece de o sindicato ser regularizado e não atuar em prol dos profissionais.
Na opinião da professora do curso de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e doutora em direito do trabalho, Ana Amélia Camargos, o uso do sindicalismo como atividade geradora de renda em benefício próprio é favorecido pela Consolidação das Leis do Trabalho, que garante a unicidade sindical – ou seja, a existência de um único sindicato por município ou Estado para cada categoria profissional – e o pagamento de uma contribuição obrigatória anual referente a um dia trabalhado por pessoa com carteira assinada, independente da filiação à entidade.
“Os sindicatos têm receitas garantidas por lei e não existe concorrência. Então qual o estímulo para que desenvolvam ações em prol dos trabalhadores? Se eu fundo um sindicato, ninguém mais pode organizar outro para defender os interesses da classe. É uma estrutura fadada ao fracasso. E tem mais: quando um trabalhador não se sente representado pela entidade sindical, não tem para onde correr, a não ser que aquela diretoria seja derrubada”, comenta.
Do total de dinheiro arrecadado com a contribuição obrigatória, 60% se destinam aos sindicatos. Atualmente, 80,9% dos trabalhadores brasileiros não são sindicalizados. Do total, 16,6% têm descrença na representatividade das instituições para sua categoria. Os dados são da pesquisa Aspectos das Relações de Trabalho e Sindicalização, produzidas pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) em parceria com o Ministério do Trabalho.
Para garantir uma representação mais plural e menos fadada à corrupção, muitos especialistas defendem a aprovação da liberdade sindical, que grosso modo representa a possibilidade de co-existência de diversas organizações para representar a mesma categoria e o fim da cobrança do imposto sindical obrigatório.
Com a medida, haveria uma concorrência entre os sindicatos, e estes seriam estimulados a brigar pela manutenção dos direitos trabalhistas para manter seus filiados. O fim do imposto obrigatório já está previsto na Reforma Trabalhista. O problema é que o texto da reforma fortalece o poder dos sindicatos ao definir que os acordos realizados entre patrões e empregados valem mais do que o texto da lei, mas retira de forma brusca os recursos das entidades, prática capaz de fragilizar as categorias profissionais.
“O imposto sindical precisa acabar, mas de forma progressiva. Não faz sentido dar poder aos sindicatos e retirar sua fonte de renda”, defende o advogado trabalhista Marcos Alencar. Além de pensar suas reformas trabalhistas e previdenciária, o Brasil precisa se preocupar com uma reforma sindical para acabar com a farra dos que geram lucro em cima da necessidade de representação dos trabalhadores.