Apesar do avanço da agenda de reformas e da queda na taxa básica de juros (Selic), a economia continua patinando e não há sinais de uma recuperação acelerada no médio prazo. Há quem projete crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) no ano que vem ainda abaixo dos 2% - após o 0,8% esperado para 2019.
A destruição provocada pela recessão, com empresas indo à falência e milhões de trabalhadores saindo do mercado, a perda de produtividade, as incertezas políticas que travam o investimento e o freio na economia internacional formam o cenário adverso para o Brasil.
"Nossa retomada é realmente frustrante e o ponto preocupante é que o mundo pode retardar ainda mais a recuperação", diz o economista Thiago Xavier, da Tendências Consultoria. A empresa projeta alta de 2% no PIB para 2020 e 2,6% para 2021 - número superior aos 2,5% previstos pelo mercado, segundo o Relatório Focus, do Banco Central.
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"Os 2,6% parecem uma luz de aceleração, considerando que são três anos (2017, 2018 e 2019) de PIB na faixa de 1%. Mas, se a gente analisa o período mais longo, vê a dificuldade para sair da crise", acrescenta Xavier. Cálculos da Tendência apontam que, apesar de o PIB poder voltar ao patamar pré-crise em 2021, o PIB per capita alcançará esse nível apenas em 2023.
Economista-chefe do Banco Votorantim, Roberto Padovani está entre os mais otimistas do mercado, com alta de 2,5% para 2020 e 2,5% para 2021 - segundo o Focus, o crescimento médio esperado para o ano que vem é 2,2%. Padovani afirma que se trata de uma recuperação lenta, mas sólida, e que ela não pode ser considerada uma retomada normal, dado o grau de devastação que a recessão deixou, principalmente em segmentos como da construção pesada e de óleo e gás.
Ainda de acordo com Padovani, estudos indicam que reformas estruturais levam até dez anos para consolidar seus efeitos na economia. "Estamos criando condições para que, no futuro, a atividade vá bem, mas não tem uma relação automática", diz. "Temos de avançar muito no ambiente de negócios, o que inclui tributos mais simples e qualificação de mão de obra, para estar num voo de cruzeiro mais perto de 4% ao ano."
Uma melhora no nível de investimentos também é apontada como essencial para acelerar o ritmo da economia. Hoje, os investimentos são da ordem de 15% do PIB. O economista José Luis Oreiro, professor da Universidade de Brasília, afirma que esse número teria de ir para 23% para que o País pudesse crescer entre 4% e 5%. "Vai crescer pouco nos próximos dois anos, porque falta demanda. A política fiscal é contracionista; a monetária começou a ficar levemente expansionista agora e o cenário externo é ruim", diz.
A economista Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do Ibre (Instituto Brasileiro de Economia), da Fundação Getúlio Vargas, destaca que o fator mais forte para o aumento do investimento no País - e também do PIB - é um ambiente de previsibilidade e confiança.
Apesar de a incerteza ter recuado recentemente, diz ela, ainda está em patamar elevado. O índice de incerteza da economia, calculado pelo Ibre, recuou com a aprovação da reforma da Previdência na Câmara, passando de 119 pontos em junho para 108,4 em julho, ainda próximo de 110 pontos, considerado o nível de "incerteza elevada". "Tem várias reformas em discussão, mas falta uma agenda. A reforma tributária, ninguém sabe como será. O investidor está cauteloso", diz Silvia.
Para a economista, um dos principais entraves ao crescimento - e que pode colocar o Brasil em uma posição complexa semelhante à do México - é a perda de produtividade. "O México conseguiu toda uma estabilidade macroeconômica, abriu sua economia, mas a produtividade não veio." Segundo Silvia, isso ocorreu porque empresas pouco produtivas acabaram sobrevivendo devido a ineficiências microeconômicas.
No Brasil, investimentos mal alocados, subsídios e regimes tributários especiais, como o Simples, também podem limitar os efeitos das reformas estruturantes. "Para o País crescer 3%, sem o mundo ajudar, tem de ter reformas mais severas", acrescenta Silvia, que projeta alta de 1,8% para 2020 e 2% para 2021.
Aceleração entra no debate
Diante da lentidão da recuperação econômica, medidas que acelerem o ritmo do Produto Interno Bruto (PIB) - e aliviem a situação de 13 milhões de desempregados - começam a ganhar espaço no debate. O próprio governo federal adotou uma delas ao anunciar, no mês passado, a liberação do saque de R$ 500 das contas do FGTS.
Economista-chefe da consultoria LCA, Bráulio Borges defende como estímulo econômico a redução mais significativa da taxa básica do juros (Selic). Em julho, o Banco Central cortou a Selic pela primeira vez desde março de 2018, passando a taxa de 6,5% para 6%.
Segundo Borges, como o País está em seu terceiro ano consecutivo com inflação abaixo da meta e as projeções indicam que deverá continuar assim até 2020, a taxa de juros deveria estar mais baixa, impulsionando consumidores e investidores a tomarem crédito e, assim, movimentarem a economia.
"O próprio BC já reconheceu, em ata, que a incerteza na economia é contracionista e desinflacionária. Feita a constatação de que a inflação está abaixo na meta, o BC deveria ter respondido a isso", diz Borges. Ainda de acordo com o economista da LCA, o governo agiu corretamente ao liberar o saque do FGTS, mas o impacto da medida no PIB pode ser neutralizado pela crise argentina.
O economista-chefe do Banco Votorantim, Roberto Padovani, também afirma que a política monetária é o grande instrumento econômico, mas diz também haver "um pouco de espaço" para medidas de incentivo no mercado imobiliário.
O professor da Universidade de Brasília José Oreiro defende um descontigenciamento do Orçamento do governo para estimular a demanda. Para ele, ainda assim, seria possível manter a relação entre dívida e PIB estabilizada ao aumentar o PIB.
O economista Thiago Xavier, da Tendências, afirma que acelerar os projetos de concessão na área de infraestrutura seria uma medida bem-vinda.