Investigação

Pirâmide até dentro do quartel

Bombeiros e policiais também são vítimas de esquema que promete renda alta e no final sempre quebra

Giovanni Sandes
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Publicado em 14/08/2013 às 0:17
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Bombeiros e policiais também são vítimas de esquema que promete renda alta e no final sempre quebra - FOTO: Reprodução do site
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Responsáveis por trabalhar pela segurança dos pernambucanos, bombeiros e policiais militares foram vítimas de uma pirâmide financeira que explodiu entre soldados, cabos e oficiais. A Lucro Limpo Reciclagem tem todos os elementos das principais pirâmides investigadas no País: se diz do ramo de marketing multinível, tinha foco em atrair mais pessoas para sua rede e pagava lucros altos em troca da cobrança pela adesão. A diferença para as outras dezenas de negócios é que ela cresceu e ruiu prejudicando quase que exclusivamente militares, que apenas esta semana começaram a denunciar o esquema à Delegacia de Repressão ao Estelionato do Recife.

A Polícia estima que foram cerca de 600 pessoas prejudicadas. Quem tomou prejuízos, rombos de até R$ 30 mil, acredita que o número pode chegar a 900 pessoas.

Como todas as empresas investigadas que exploram o sistema de pirâmide, a Lucro Limpo apareceu com uma “ousada” proposta de negócios: gerar altíssimos rendimentos a partir do tratamento de material reciclável.

A promessa da empresa que encheu os olhos de muita gente foi, a partir de uma adesão inicial de R$ 70 a R$ 2.800, pagar um rendimento fixo de R$ 880 por mês ao investidor, desde que ele indicasse mais cinco pessoas. Mas se o volume de pessoas indicadas fosse muito alto, o lucro mensal poderia chegar a R$ 14.500.

“Por cinco meses eu recebi direitinho. Depois o limite de investimento acabou. Foi quando todo mundo investiu mais. Eu peguei um empréstimo e apliquei R$ 11 mil. Foi quando a empresa desapareceu”, diz um bombeiro que não quer se identificar.

Apesar de toda a situação ter ocorrido no âmbito civil e não haver nenhuma relação com as instituições militares, as vítimas têm medo da exposição e de eventuais represálias da corporação, por isso evitavam denunciar o caso.

Mas os prejudicados, que perderam até R$ 30 mil, começaram a entrar em desespero porque o responsável pela Lucro Limpo (razão social Atmosfera Reciclagem), o soldado Nelson D’Angelo Junior, membro do Grupamento de Resgate, simplesmente desapareceu, a ponto de um processo administrativo ter sido aberto pelo Corpo de Bombeiros por deserção, o equivalente dos militares para o abandono de cargo entre os servidores civis.
Além de tudo isso, a Lucro Limpo ainda começou a apagar os seus rastros, incluindo a desativação do site da empresa.

“Realmente registramos vários boletins de ocorrência de soldados da PM e do Corpo de Bombeiros. Nós já estamos tomando as primeiras providências para investigar o caso”, explica o delegado de Repressão ao Estelionato, Rômulo Aires.

O delegado adianta que, a princípio, o problema gerado pela Lucro Limpo não parece estelionato. Se configurada a situação denunciada pelos militares, aparentemente trata-se de crime contra a economia popular, mesmo acusação que pesa contra outras empresas suspeitas de serem pirâmides, como a pernambucana Priples, a goiana BBom e a Ympactus Comercial, a Telexfree, que se apresenta como multinacional com sede brasileira no Espírito Santo.

MEDO DE EXPOSIÇÃO

O medo de ser identificado tem impedido os militares de fazer a denúncia sobre o caso do Lucro Limpo, de propriedade do soldado bombeiro Nelson D’Angelo Junior, na esfera administrativa, segundo o coordenador da Associação dos Cabos e Soldados de Pernambuco (ACS-PE), Renílson Bezerra dos Santos. Por meio de sua assessoria de imprensa, o Corpo de Bombeiros garantiu que não haverá represálias contra as vítimas que denunciarem o golpe e ainda incentivou a formalização das reclamações à corporação, para averiguação de possível crime militar.

“O que eu vejo é que a maioria das vítimas tem medo de aparecer. As pessoas não querem ser punidas no quartel”, enfatiza Renílson. “Os PMs e soldados só buscaram a Polícia como último recurso. Eles não querem exposição”, afirma o delegado de Repressão ao Estelionato, Rômulo Aires.

“Espero que agora um corajoso apareça e denuncie publicamente o problema, porque muitas pessoas já sofreram uma barbaridade com os casos mais conhecidos de pirâmides”, diz o coordenador da ACS-PE.

Procurado pela reportagem do JC, o Corpo de Bombeiros de Pernambuco, através de sua assessoria de imprensa, garantiu que a corporação não tem absolutamente nenhuma intenção de punir as pessoas que denunciarem o caso, principalmente tendo em vista que não há qualquer envolvimento da instituição no assunto. Toda a questão afeta a vida civil dos prejudicados, ou seja, a vida particular dos policiais e bombeiros, fora do universo militar.

Pelo contrário, informa a assessoria de imprensa dos Bombeiros, tendo em vista que o proprietário da Lucro Limpo é um bombeiro já investigado em um processo administrativo por deserção atualmente em curso, denúncias à corporação podem servir para motivar uma averiguação formal de prática de um eventual crime militar devido ao prejuízo coletivo imposto pelo esquema financeiro.

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