Contas públicas

Governador de mãos atadas para dar reajuste aos professores

Estado sofre hoje do mesmo mal da cigarra na fábula: durante a bonança não acumulou provisões

Leonardo Spinelli
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Leonardo Spinelli
Publicado em 30/04/2015 às 22:42
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Estado sofre hoje do mesmo mal da cigarra na fábula: durante a bonança não acumulou provisões - FOTO: JC Imagem
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O governador Paulo Câmara enfrenta nos últimos dias a greve dos professores de mãos atadas. Não tem dinheiro para começar a cumprir com a promessa de campanha de dobrar os salários da categoria. Não deverá ser a única greve que enfrentará ao longo de seu mandato por aumentos salariais. Isso acontece porque o Estado sofre hoje do mesmo mal da cigarra na fábula, que durante a bonança não acumulou provisões para o inverno. Apesar do empenho do governador em fazer economia nos seus primeiros meses de mandato, a medida chegou atrasada para Pernambuco. Nos últimos anos, os gastos do governo aumentaram de forma que o atual mandatário tem de realizar cortes ao invés de novos gastos, tanto em investimentos no seu capital humano como em infraestrutura, um indutor do crescimento. Notícia ruim não só para os professores, é também para todos os pernambucanos. Mas qual a causa disso?

Analisando os relatórios resumidos de Execução Orçamentária de 2010 a 2014, o economista pernambucano Pedro Jucá Maciel, avalia que o atual problema fiscal do Estado decorre da forte deterioração de suas finanças. Pernambuco saiu de um superávit primário de R$ 210 milhões em 2010, para um déficit de R$ 2,1 bilhões registrados no ano passado. Ou seja, saiu de um posição poupadora, com a qual tinha condições de pagar os juros sobre suas dívidas, para uma situação em que não consegue pagar os juros que, rolados adiante, são somados ao valor de sua dívida. Neste caso, há uma ponderação. “Uma parcela da culpa é da União, que fez política com o bolso alheio (dos estados) uma vez que desonerou tributos como o IPI dos carros e linha branca neste período, impostos que geram as transferências (através do Fundo de Participação dos Estados)”, disse. No período de quatro anos analisados, as receitas com transferências caíram de 35,8% da receita total do Estado para 33% no ano passado.

Mas isso não explica tudo e a administração estadual tem a sua parcela de responsabilidade, que pode ser avaliada pelo aumento das despesas primárias, resumidas em gastos com pessoal, custeio da máquina e investimentos. O montante dessas despesas passaram de 98,8% do total da receita primária (verbas de tributos, trasnferências e outras) para 107,8%. Ao gastar mais do que arrecada, isso “explica a deterioração da situação financeira do Estado”, avalia. 

Neste quesito, as despesas com investimentos foram a que menos contribuíram, já que houve uma redução de 12,5% sobre as receitas, para 12%, enquanto os gastos com pessoal aumentaram de 49% para 54,6% e com custeio de 37% para 41,2%. É aí que entra a fábula da cigarra. “Se vocês está pensando no futuro, não pode aumentar suas despesas”, comentou o especialista, que analisou com mais atenção as despesas com educação. Estas, no período de 2010 a 2014, registraram retração, passando de 11,8% das receitas primárias para 11,5%, com destaque para o ano de 2013, quando esse dispêndio representou um compromisso de 11%.

Para compensar a redução das despesas vindas de transferências, o governo federal passou a liberar o endividamento dos Estados e Pernambuco aproveitou a onda. “É até difícil politicamente não topar empréstimos, pois é muito raro a União liberar. Até porque, se o gestor não aproveitar, pode ser confundido como um mau administrador, que não se agarra às oportunidades de ter mais dinheiro para investir”, salienta o especialista. O problema, no entanto, é que o Estado não utilizou a folga orçamentária vinda de empréstimos para economizar, com vistas aos tempos de vacas magras como hoje.

POUPANÇA

Quando o Estado contrata um empréstimo com um banco, ele cumpre com a destinação daquele dinheiro contratado, para a construção de um hospital, por exemplo. Funciona como um financiamento de carro para o consumidor, que não consegue pagar o bem usando apenas a sua renda mensal. O problema é que o estado se comportou como um superendividado, aproveitou a folga financeira gerada pelo empréstimo para continuar aumentando a sua despesa mensal: com pessoal e custeio.

Assim como acontece na vida financeira das pessoas, quem aumenta as despesas, fica sem poupança. Para o Estado, o indicador de poupança corrente mede o quanto de receitas próprias sobra após o pagamento das despesas obrigatórias (pessoal e custeio) para investir. “Ao final de 2014, o que sobra da arrecadação do estado para expandir investimentos, sem se endividar, é apenas 2,4% das receitas”, diz. 

A pedido do JC, Pedro Jucá Maciel, analisou as finanças públicas de Pernambuco nos últimos quatro anos, material disponível em sua integridade no final da matéria.  “O comportamento das finanças públicas é cíclico. Há períodos de bonança, quando os estados estão pouco endividados e a atividade econômica se aquece e, nesse momento, abre-se espaço fiscal para ampliar as despesas. O ideal seria que os estados pudessem ‘poupar’ nesses períodos de bonança para enfrentar os períodos de ‘vacas magras’ sem forte arrocho sobre as políticas públicas”, escreve.

Ele destaca que o governo de Pernambuco implementou, no início deste ano, uma política diferente para restaurar as contas públicas. “O superávit primário no primeiro bimestre de 2015 foi R$ 470 milhões superior ao mesmo período de 2014, um aumento de 63%. Essa poupança fiscal pode ser atribuída a 51% expansão das receitas de tributos e 49% pela redução das despesas”, registra, salientando que a maior parte desse corte, no entanto, acontece onde é mais fácil cortar, ou seja, sobre os investimentos, que caíram 68% em relação ao mesmo período do ano passado. 

Isso acontece, avalia, pela falta de capacidade dos governos em cortar suas próprias despesas “devido às regras obsoletas e ineficientes que regem o nosso serviço público”. “Essas regras prezam pela forma e pelo rito ao invés de prezar pelos resultados alcançados. Cria-se a cultura de que, para ampliar ou melhorar as políticas públicas deve-se, necessariamente, contratar mais servidores e elevar custos, como se não houvesse ganhos de produtividade e redução de ineficiências no serviço público a serem perseguidas.”

AJUSTE FISCAL

Não é apenas o ministro Joaquim Levy que está com a tesoura nas mãos. Em fevereiro o governador Paulo Câmara anunciou seu plano de corte de gastos visando economizar R$ 320 milhões em 2015. Pelos primeiros números disponíveis, o projeto está no caminho planejado e no primeiro bimestre do ano o governo conseguiu entregar um superávit primário R$ 470 milhões superior ao mesmo período de 2014, num aumento de 63%. A poupança fiscal foi alcançada por um aumento de 10% nas receitas tributárias e pela redução de 6% nas despesas primárias. A redução dos investimentos foram reduzidas em 68%. As receitas oriundas de endividamento (operações de crédito) caíram 79%, devido à tendência atual do governo federal de restringir novas autorizações de endividamento para os Estados. 

Em valores, o resultado fiscal do Estado na comparação de bimetre contra bimestre ficou da seguinte forma. As receitas primárias passaram de R$ 4,59 bilhões no ano passado para R$ 4,83 bilhões este ano, numa diferença a mais de R$ R$ 239,1 milhões, sendo que a maior parte, R$ 214,6 milhões vieram dos tributos. Com relação às despesas, elas caíram de R$ 3,92 bilhões do ano passado para R$ 3,69 bilhões em 2105, numa diferença negativa de R$ 238,5 milhões. Apesar de as despesas com pessoal e custeio terem aumentado na comparação dos dois períodos, foi o investimento que mais contribuiu com essa economia, com o estado aplicando menos R$ 282 milhões. Já a receita advinda de operações de crédito foi reduzida de R$ 144,8 milhões no primeiro bimestre de 2014, para R$ 30,1 milhões este ano.

 

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