O Brasil não faz mais parte da elite dos países com título de grau de investimento. Na última quarta-feira, a agência de classificação de risco Standard & Poor’s (S&P) rebaixou a nota de crédito do País de BBB- para BB+. Com a mudança, ingressamos no grupo dos “junk” (lixo na tradução literal), integrado pela Rússia, Hungria, Turquia, Bulgária e Indonésia. Na escala da S&P, os “junk” estão no chamado primeiro grau especulativo, fora da lista dos países com baixo risco de inadimplência. O rebaixamento abre precedente para que outras agências reduzam a nota brasileira ainda este ano.
“É como se tivéssemos sido rebaixados para a segunda divisão e colocados no mesmo patamar de países emergentes de menor qualidade. Dos Brics, apenas Brasil e Rússia estão com a nota BB+ na S&P”, comenta o sócio-diretor da Ceplan, Jorge Jatobá. A China tem nota AA-, enquanto na Índia e a África do Sul estão classificadas como BBB- (entenda a escala de risco na arte abaixo). Nos últimos anos, os países emergentes têm demonstrado pouca constância na escala. Dos 30 classificados pela S&P, 24 conquistaram o grau de investimento, mas apenas 13 mantiveram o selo de bom pagador. No caso do Brasil, o rebaixamento veio com apenas sete anos de conquista (em 2008).
Jatobá destaca que o corte da nota do Brasil é resultado de um processo que começou antes das eleições, com sinais de crise e esgotamento político da gestão Dilma Rousseff. “Os erros se acumularam. O envio da proposta orçamentária de 2016 para o Congresso com déficit foi a gota d’água. O governo se mostrou hesitantes, não apresentou uma proposta consistente de retomada econômica. Cada hora era uma proposição diferente. Isso sem lar na falta de diálogo entre a Presidência e o Congresso. Esse quadro político e econômico fez a S&P dar essa nota”, acredita.
A incerteza política e econômica é característica comum ao grupo dos “junk”. No início deste ano, a Rússia perdeu o grau de investimento de duas agências de classificação (S&P e Moody’s). Os conflitos políticos com países vizinhos, a exemplo da Ucrânia, e a queda no preço do petróleo deixaram a economia vulnerável e influenciaram no rebaixamento. Atualmente, o país acumula indicadores piores que os do Brasil, no caso do PIB e da inflação, com taxas de -4,6% e 15,8%, respectivamente. “A Hungria também não tem uma trajetória econômica tranquila. A maneira como eles estão tratando a questão migratória na Europa (tentando evitar a entrada de refugiados do Oriente Médio) é uma demonstração de que a economia não suporta mais pressões”, pontua Jatobá. A taxa de desemprego na Hungria é de 6,8% (inferior a do Brasil). Indonésia, Turquia e Bulgária também não conseguem fazer decolar suas economias.
Na avaliação do economista da Guide Investimentos, Ignacio Crespo Rey, a perda do grau de investimento do Brasil pode significar turbulência também para outros emergentes. “O cenário se tornou mais desafiador para os emergentes, depois que o preço das commodities começaram a cair e a China deixou de apresentar crescimento mais forte. Essas mudanças estão fazendo com que as agências de rating rebaixem as notas, avaliando que reformas esses países fizeram nos últimos anos e o quanto essas medidas foram bem sucedidas”, destaca.
Para evitar novos rebaixamentos e retomar o selo de bom pagador, o Brasil terá que demonstrar um política consistente de recuperação econômica, além de um plano que restabeleça a credibilidade da política econômica do governo. “Mas não é isso que está acontecendo. A dívida brasileira está aumentando porque o País gasta mais do que arrecada. E quando isso acontece o Brasil é obrigado a emitir títulos da dívida. Hoje a dívida brasileira é de 68% do PIB (R$ 3,5 trilhões) e tem uma tendência de alta”, observa Jatobá. A relação PIB versus é um dos termômetros da saúde fiscal de um país. No orçamento para 2016, o Brasil não vai conseguir gerar um resultado primário positivo (poupança para pagar os juros da dívida). Isso significa que terá que se endividar mais para arcar com o pagamento desses juros.
DIANTEIRA E LANTERNA
Enquanto o Brasil vai precisar fazer o dever de casa para reverter o rebaixamento, países como Alemanha, Canadá, Austrália, Dinamarca e Noruega figuram na elite do grau de investimento, com a maior nota (AAA) na escala de classificação. São economias com capacidade forte de para honrar seus compromissos.
Na direção contrária está a Argentina, único país classificado pela Standard e Poor’s com a nota SD, que caracteriza um devedor sem condições de arcar com suas dívidas. “Argentina tem credibilidade zero. Nenhum investidor sério colocaria dinheiro lá sem ter a consciência de que corre altíssimo risco. É como se fosse um time da 4ª divisão”, compara Jatobá. Outro vizinho que não vai bem é a Venezuela, com nota CCC (denotando vulnerabilidade e dependência de condições favoráveis para honrar seus compromissos financeiros). Já o Chile é bom pagador, com nota AA- na Standard & Poor’s.