SECA

Fruticultura do Vale do São Francisco teme falta d'água

Governo evita elevar a vazão do rio para 'economizar' água. Produtores de fruta serão prejudicados

Adriana Guarda e Angela Belfort
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Adriana Guarda e Angela Belfort
Publicado em 28/10/2015 às 10:48
Foto: Arnaldo Carvalho/JC Imagem
Governo evita elevar a vazão do rio para 'economizar' água. Produtores de fruta serão prejudicados - FOTO: Foto: Arnaldo Carvalho/JC Imagem
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A Agência Nacional de Águas (ANA) manteve as vazões de água dos reservatórios de Sobradinho, na Bahia, em 900 metros por segundo e a de Três Marias em 500 metros cúbicos por segundo até o final de novembro. Nesta terça-feira, o reservatório de Sobradinho atingiu 4,96% do seu volume útil, o mais baixo já registrado desde a entrada em operação desse reservatório no final da década de 70. O nível é quase o mesmo de 2001, quando o País enfrentou um racionamento de energia.

A decisão vai prejudicar os produtores do Vale do São Francisco que podem ficar sem água para irrigar os seus plantios, caso não ocorram chuvas que alimentem o São Francisco, que nasce em Minas Gerais. Os empresários do Vale defendiam um aumento de 100 metros cúbicos por segundo na vazão do reservatório de Três Marias que está com 15,27% do seu volume útil.

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O volume útil indica a quantidade de água que pode ser usada para a geração de energia. É a quantidade de água acima do volume morto, quando não pode ser produzida energia. Segundo nota divulgada pela ANA, Três Marias é uma das reservas estratégicas para a segurança hídrica da bacia, que pode ser fundamental caso o próximo período úmido seja abaixo da média, o que vem ocorrendo nos últimos anos na região. A decisão da ANA teve a influência da Cemig que deseja ter mais água para poder gerar mais energia. 

A água do Velho Chico vem sendo poupada para produzir energia desde 2013 com alteração das vazões, principalmente da de Sobradinho. Ainda na nota, a ANA informa que os representantes dos usuários da bacia se prepararem, pois, dependendo das condições hidrológicas futuras, a vazão mínima poderá ser reduzida.

Preocupados com a negativa de aumentar a liberação de água para o Vale do São Francisco, os produtores vão iniciar uma articulação empresarial e atrair lideranças políticas para discutir à escassez hídrica.

“A situação no Vale é de uma bomba-relógio. A decisão da ANA vai significar uma crise financeira, econômica e social na região, justamente num momento em que a atividade se recuperava dos impactos da crise econômica mundial. Sem água as plantas vão morrer e a recuperação será lenta. As plantas levam quatro anos para se recuperar e 15 para voltar a produzir uma boa safra. Isso sem falar no prejuízo financeiro e social. O investimento em um hectare de uva chega a R$ 100 mil e no caso da manga é de R$ 35 mil. Hoje temos 25 mil hectares cultivados com as duas culturas no Vale. Os empresários também vão demitir os funcionários. Hoje o Vale emprega 150 mil pessoas”, diz o presidente do Sindicato Rural de Petrolina, Edis Matsumoto. O produtor explica que o grande volume de água utilizado na irrigação (17 m³/s) inviabiliza o uso de alternativa como carro-pipa.

Produtor do Projeto Nilo Coelho, Marcos Iuri Alencar diz que empresários e produtores aguardam um comunicado oficial da Cemig, da ANA e do ONS. “Produzo no Vale há 23 anos e esta crise está sendo pior até que a de 2001. Esperamos que o governo apresente uma solução para o problema. Da nossa parte não vislumbramos qualquer alternativa, porque o abastecimento só será suficiente até o final de novembro”.

População também pode ser afetada

O presidente da Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa), Roberto Tavares, disse ontem, que a produção de energia não pode estar à frente do abastecimento humano e que o setor elétrico deveria pagar pelos transtornos causados com a diminuição da vazão de Sobradinho realizada para poupar água e gerar energia. Em Pernambuco, pelo menos 22 cidades do Sertão são abastecidas com a água do Rio São Francisco

Segundo ele, as reduções das vazões de Sobradinho já causaram uma diminuição de 65 centímetros no nível do rio nos locais onde a Compesa faz a captação da água. “Temos dois sistemas que são paralisados duas vezes por semana, porque como a captação ficou num nível mais baixo, entra muita lama, plantas e sujeiras”, conta Roberto.

Na paralisação, é feita uma limpeza dos canos. Ele estava se referindo aos sistemas da Adutora do Oeste, que faz a captação em Orocó, levando a água para mais 13 municípios, e a Adutora do Sertão, que abastece Salgueiro cinco cidades. Também são abastecidos pelas águas do São Francisco Lagoa Grande, Santa Maria da Boa Vista e Petrolina.

“Temos recebido alertas de que talvez a vazão de Sobradinho fique em 800 metros cúbicos por segundo. Se isso acontecer, deve ocorrer uma baixa de mais 15 centímetros nos locais de captação da água”, comenta.

Essa redução vai tornar necessário uma captação de água flutuante com um custo estimado de R$ 12 milhões. A expectativa de Tavares é que esses recursos sejam bancados pelo governo federal porque a Compesa está construindo várias adutoras emergenciais por causa da seca no Agreste e Sertão do Estado. 

A vazão normal de Sobradinho é de 1,3 mil metros cúbicos por segundo e a redução de água diminuiu a quantidade de energia produzida pela usina de mesmo nome. No entanto, não há risco de racionamento, como ocorreu em 2001, porque agora há as térmicas e as eólicas produzindo mais energia. 

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