Como ir além do papel do jornal e continuar relevante em uma sociedade dividida politicamente e permeada por fake news. O questionamento foi o fio condutor da conversa promovida nessa quarta-feira (3) pelo Jornal do Commercio e a Associação Nacional dos Jornais (ANJ) com diretores de redação de grandes jornais regionais brasileiros: Correio do Povo (RS), Gazeta do Povo (PR), Correio da Bahia (BA), Gazeta do Espírito Santo (ES), O Povo (CE) e Diário do Nordeste (CE). O encontro fez parte das comemorações do centenário do Jornal do Commercio.
“Só quem tem conteúdo pode ser multiplataforma e o nosso desafio é falar para o público através não só do papel, mas de todos os canais disponíveis: rádio, TV, web e mídias sociais”, afirmou Laurindo Ferreira, diretor de redação do Jornal do Commercio na abertura do encontro, que foi prestigiado por profissionais da imprensa, acadêmicos da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), CESAR, e Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), publicitários e representantes do Facebook.
Laurindo Ferreira falou ainda sobre o futuro do jornal impresso. “A questão central hoje não é se somos ou não jornal de papel, porque, na verdade, somos marcas. Marcas de credibilidade oriundas do papel, como o Jornal do Commercio, e que migraram para outras plataformas. Estamos todos construindo uma estrada para o futuro sem jamais esquecer a origem”, disse. O diretor de redação do JC ainda defendeu o jornalismo profissional frente às fake news. “Ter uma marca de 100 anos produzindo notícias é uma grande oportunidade de haver um contraponto, um antídoto para as notícias falsas, as chamadas fake news. Isso é jornalismo de marca, de qualidade, de respeito, de tradição. Se chegamos aos 100 anos é porque temos tudo isso”, reforçou Laurindo Ferreira.
O diretor do Correio do Povo, de Porto Alegre (RS), Telmo Flor, disse no encontro que os jornais continuarão se adaptando, como vêm fazendo, mas, para ele, o futuro é promissor. “Eu enxergo o jornal hoje com otimismo. A gente sabe das dificuldades que os jornais enfrentam nos últimos anos, mas a credibilidade é um esteio relevante. O jornal é um veículo cuja informação se pode confiar”, concluiu Telmo.
Para a executiva de redação de O Povo, do Ceará, Ana Naddaf, é necessário também aprender a dialogar com os novos públicos, uma discussão importante para jornais centenários. “Estamos tratando aqui de conteúdo e, para isso, é preciso se ver como consumidor. Temos no Instagram mais de 700 mil seguidores e no Facebook, 1,4 milhão. Nesta avalanche de comunicação, qual o nosso papel?”, indagou Ana.
A executiva de redação de O Povo citou Marcelo Rech, presidente da ANJ, quando disse que os jornalistas são os certificadores da realidade. “Somos quase um Uber da comunicação, atendendo a esse público sob demanda”, brincou Ana. Para ela, o jornal impresso ainda é muito importante. “Mudamos o formato do jornal e hoje desenhamos a capa levando em conta como ela será vista no Instagram. Já tivemos capa de impresso com 10 mil curtidas e mais de mil comentários. É um exemplo de jornal visto além do papel.”
A editora-chefe do Correio da Bahia, Linda Bezerra, falou pelo jornal mais “jovem” do grupo, com 40 anos de existência. Ela explicou que a grande virada aconteceu em 2008, com uma edição impressa toda colorida e uma equipe exclusiva para o digital. Mas o grande diferencial foi a busca crescente pela credibilidade. “Em 2014 criamos os canais digitais do Correio. Tínhamos 4 milhões de pageviews e hoje chegamos a 21 milhões. Tínhamos 8 mil exemplares impressos e hoje temos 30 mil exemplares de tiragem. Isso foi resultado de uma década de fortes investimentos tanto no digital quanto no impresso”, disse Linda.
O diretor da Gazeta do Povo, de Curitiba, Leonardo Mendes Júnior, também comanda um jornal de 100 anos, que em 2017 fez uma aposta radical. Extinguiu sua versão impressa, mantendo apenas uma revista aos domingos, e migrou para o digital. “Comercialmente focamos na assinatura digital, o que nos permitiu ser um jornal com amplitude nacional. Tivemos um crescimento de nossas marcas, aumento da audiência e crescemos entre os grandes. Temos, em número de leitores, 33,7 milhões. Somos o quarto em audiência no Brasil. Resultado de um planejamento forte”,
Leonardo afirmou ainda que é possível aprender com as fake news sobre o impacto de uma notícia. “A mentira sempre atrai, mas até quem produz notícias falsas sabe que uma informação vinda de uma fonte confiável é mais forte”, afirmou o diretor da Gazeta do Povo.