DINHEIRO

Educação financeira: crescendo e aprendendo a poupar

Educação financeira precisa começar cedo para as crianças se tornarem adultos financeiramente mais responsáveis

MARÍLIA BANHOLZER
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MARÍLIA BANHOLZER
Publicado em 27/05/2019 às 16:36
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Educação financeira precisa começar cedo para as crianças se tornarem adultos financeiramente mais responsáveis - FOTO: Foto: cortesia
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Aquela história dos pais falarem "compro quando a gente voltar" como fuga para explicar aos filhos que não têm dinheiro para tal aquisição precisa mudar. Discutir orçamento financeiro, de onde vem e para onde vai o dinheiro e a importância de poupar para poder realizar desejos e sonhos é necessário. Para especialistas em finanças pessoais, a educação financeira precisa começar cedo para as crianças se tornarem adultos que usam dinheiro de forma responsável. A realidade brasileira de 62 milhões de pessoas endividadas só mostra a urgência do debate.

A boa notícia é que falar sobre dinheiro tem sido uma rotina cada vez mais frequente entre as famílias brasileiras. Pesquisa do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil), em parceria com o Banco Central (BC), mostra que 85% dos entrevistados conversam em casa sobre o orçamento, sendo que metade (51%) discute com frequência – número que cresceu 7 pontos percentuais em relação ao ano passado. No entanto, 21% das pessoas só falam do tema quando a situação financeira não está boa. E mais: 15% assumem não tocar no assunto.

Pensando especialmente nos pequenos, a cooperativa financeira Sicred Pernambucred fez uma parceria com a Mauricio de Sousa Produções (MSP) para lançar uma série especial de revistas em quadrinhos da Turma da Mônica. A temática das revistinhas é "educação financeira para crianças" e trata de forma lúdica sobre juros, financiamento, orçamento familiar, entre outros temas. Somente em Pernambuco, 15 mil quadrinhos devem ser distribuídos entre os associados da cooperativa.

Mais de 62 milhões de pessoas estão endividadas no Brasil

"Quando criança não tivemos instrução para lidar com dinheiro. Hoje as pessoas têm se endividado, passam por problemas e acham que a raiz de tudo é o dinheiro. Precisamos quebrar esse ciclo. Por isso apostamos numa linguagem infantil, para atingir as crianças e, até mesmo, fazer os associados conversarem com seus filhos sobre finanças", explicou o diretor executivo da Sicred Pernambucred, Giovanni Prado.

A estudante Millena Danielle, 11 anos, pôde ler os quadrinhos com a Turma da Mônica falando de educação financeira. Para ela, ver os personagens, que já são velhos conhecidos, ajudou a gostar das revistinhas. "Foi legal, aprendi mais sobre de onde vem o dinheiro, sobre recompensas, o que é orçamento familiar. Alguns assuntos eu tive que perguntar aos meus pais, aí conversamos sobre isso", contou ela, que recebe mesada desde os nove anos.

Os pais da menina contam que ela recebe uma quantia fixa por mês, mas esporadicamente acaba recompensada pelos avós, por exemplo, por boas notas e bom comportamento. "Estou juntando R$ 20 por mês para poder comprar um celular. Aprendi que é preciso guardar dinheiro para pagar algumas contas e comprar coisas mais caras. Agora dou mais valor ao dinheiro. Quero ensinar minhas amigas da escola", disse Millena.

DEBATE NA ESCOLA

Além do ambiente familiar, educação financeira também tem sido debatida nas escolas. É o caso da Escola Encontro, no bairro das Graças, no Recife, que a partir deste ano incluiu a disciplina de Educação Financeira na grade curricular. São aulas de 30 minutos, uma vez por semana, em que crianças a partir dos quatro anos começam a entender a importância do dinheiro.

"Com os pequenininhos, começamos a conversar sobre se o que eu tenho na mochila é necessário. Depois falamos sobre os sonhos que podem, ou não, ser comprados. Com os maiores, a partir de 7 ou 8 anos, já falamos em mesada, como economizar, com o que gastar", resumiu a coordenadora da unidade de ensino, Patrícia Brito.

Segundo a pedagoga, a inserção da disciplina na rotina das crianças partiu de uma pesquisa com os pais. Após identificar o apoio e a necessidade de conversar sobre dinheiro com as crianças, os professores foram capacitados. Agora, além das lições de matemática, os pequenos também são ensinados a poupar e investir. "Tentamos tornar tudo interdisciplinar e envolver a família no processo", pontuou Patrícia.

Mãe de Sophia, de 8 anos, a servidora pública Deborah Hulak, 50, disse estar satisfeita com a inserção das conversas na escola em que a menina estuda, mas revela que esse tema sempre esteve presente em casa. "Acho excelente essa disciplina, já devia ter começado antes. Com essa idade, já tem acesso consciente aos bens de consumo, já entende o que é dinheiro, precisa saber cuidar dele também."

Temos que começar com a juventude, aqueles que estão começando a trabalhar, a ter o próprio dinheiro. Se as pessoas pouparem, significa que elas têm equilíbrio financeiro

Fábio Moraes, diretor de Educação Profissional e Financeira da Febraban

Deborah também é mãe de Larissa, 27, e reforça que mesmo os tempos sendo outros, as duas filhas têm se mostrado muito conscientes quando o assunto é finanças. "Não gosto de dinheiro na mão de criança. Sophia ainda não tem mesada, mas farei o mesmo que fiz com a Larissa. Darei um cartão de crédito com limite baixo. Ela precisa saber economizar e até se frustrar com a falta de limite. Acredito que isso educa", pontuou a servidora pública.

O Banco Central estuda, inclusive, medidas para estimular a educação financeira no País. Uma das ideias seria juros menores no crédito para quem participar de programas de educação financeira. Na visão do presidente do BC, Roberto Campos Neto, ao melhorar a educação financeira da população, haverá menor endividamento. "Criatividade e tecnologia são bem-vindas para ajudar a aumentar a educação financeira no País", ressaltou Campos Neto.

Como incentivar educação financeira com crianças e adolescentes:

CofrinhoÉ uma ótima prática apresentar o cofrinho para crianças pequenas. Através dele é possível explicar sobre a importância de poupar dinheiro.
MesadaA recomendação é de que a quantia esteja relacionada à idade - R$ 2 por ano de idade, por semana. Então, uma criança de 10 anos recebe R$ 20 por semana (R$ 80 por mês). É preciso estabelecer datas para que a criança saiba cuidar do dinheiro até o próximo dia de receber. Especialistas defendem que para crianças pequenas, sem muita noção de tempo, uma boa saída seria dar o dinheiro por semana. Os maiores podem receber por mês ou quinzena.
Moedas por tarefasNão troque atividades corriqueira que são 'obrigação da criança', como arrumar a própria cama ou o quarto, por recompensas. Mas você pode mostrar que 'atitudes extras' podem render um plus na mesada. Que tal ajudar a cuidar do jardim ou a lavar o carro? Ou até mesmo polir as panelas. Outras atividades domésticas podem ser uma saída para mostrar a importância de trabalhar para conquistar dinheiro.
Gastos anotadosConhecer as receitas e despesas é importante, pois na vida adulta isso pode ser determinante para a organização financeira.
DoaçõesCrie o hábito de convidar seu filho a doar brinquedos e roupas que ele não usa mais. Isso evita que ele se torne egoísta a acumulador. Mas lembre de inseri-lo no processo de separação e entrega.
EmpreendedorismoSe suas crianças têm um tino empreendedor, estimule. Tirar frutas do pé para vender, feirinha de brinquedos usados, ou fazer pequenas 'obras' para comercializar são algumas das práticas mais comuns. Uma criança empreendedora começa a conquistar seu dinheirinho e dar valor a isso.
Ler sobre dinheiroPresenteie com livros sobre o tema ou vá até bibliotecas ou livrarias e passe um tempinho por lá lendo e conversando sobre educação financeira. Leve em consideração as faixas etárias.

JOVENS INDISCIPLINADOS

Outra pesquisa do SPC Brasil, desta vez em parceria com o Sebrae, mostra que praticamente metade dos jovens com idades entre 18 e 24 anos, nascidos dentro da chamada Geração Z, não realiza o controle das finanças pessoais (47%). A principal justificativa é o fato de não saber fazer (19%), sentir preguiça (18%), não ter hábito ou disciplina (18%) ou não ter rendimentos (16%). Por outro lado, 53% afirmam controlar receitas e despesa. E apesar de bastante conectados, 26% ainda utilizam o tradicional bloquinho de papel para organizar o orçamento. Além disso, pouco mais da metade dos jovens entrevistados possui dinheiro guardado (52%), sendo as principais motivações os acontecimentos imprevistos (33%), viagens (21%) e compra da casa própria (19%).

Para o diretor de Educação Profissional e Financeira da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Fábio Moraes, é importante incentivar os jovens a poupar. "Temos que começar com a juventude, aqueles que estão começando a trabalhar, a ter o próprio dinheiro. Se as pessoas pouparem, significa que elas têm equilíbrio financeiro", comentou.

O administrador e diretor executivo da Sicred Pernambucred, Giovanni Prado, dá uma dica de como economizar sem sentir que isso será um peso, ou obrigação: "Tem que ter a conta de 10% do orçamento para guardar e outros 10% da diversão. Esse dinheiro você precisa gastar para compensar aquele que está poupando. Somos seres complexos, não aguentamos muito tempo sem diversão e só com obrigação."

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