Interior

Com barragens vazias e obras para concluir, Agreste de Pernambuco é castigado pela seca e cobra investimentos

Bacia leiteira sofre com falta de estrutura hídrica

Adriana Guarda
Cadastrado por
Adriana Guarda
Publicado em 21/01/2020 às 23:00
Alexandre Gondim/JC Imagem
A situação de emergência foi assinada pelo governador Paulo Câmara - FOTO: Alexandre Gondim/JC Imagem
Leitura:

No ano passado, as trovoadas não caíram no Agreste de Pernambuco. As trovoadas são reconhecidas pelos produtores agropecuários como chuvas fortes capazes de encher açudes e barragens. Sem essa chuva volumosa, o Agreste volta a enfrentar um período seco. No último sábado, o governador Paulo Câmara publicou decreto no Diário Oficial do Estado declarando a situação de emergência para 61 cidades da região, por um período de 180 dias. A publicação permite que os municípios possam buscar recursos junto aos governos estadual e federal para diminuir os problemas causados pela estiagem. A falta de água já atinge setores importantes para a economia da região, a exemplo da bacia leiteira, e retoma as cobranças sobre investimentos em infraestrutura hídrica.

>> Principais obras que levam água ao Agreste de Pernambuco ficam para 2021

O Agreste é conhecido como a região de maior déficit hídrico de Pernambuco. Não possui um rio como o São Francisco, tem reservatórios de água menores que os do Sertão e o solo não é rico em água. Mesmo com todas essas adversidades, os produtores de leite mantêm – heroicamente – uma atividade com produtividade acima da média nacional, que investe em melhoramento genético e desponta em segundo lugar na produção de leite do Nordeste e em oitavo no País.

“Mais uma vez está tudo seco. Sem trovoada no ano passado, não deu pra fazer água e garantir pastagem para o gado. O resultado foi o aumento do preço dos insumos e a necessidade de comprar água para os animais, enquanto o preço do leite continua o mesmo”, lamenta Washington Azevedo, um dos diretores do Sindicato dos Produtores de Leite de Pernambuco (Sinproleite-PE) e liderança do Movimento S.O.S Produtores de Leite. Ele adianta que na próxima semana o grupo pretende entregar um documento ao governo Paulo Câmara, detalhando a situação da bacia leiteira e apresentando demandas dos pecuaristas para contribuir com o desenvolvimento da atividade nesse cenário.

As vacas leiteiras se alimentam de concentrado (farelo de milho, soja) e de volumoso (palma, bagaço de cana, silagem de milho), mas nos períodos de seca os produtores precisam investir no concentrado, pela falta do alimento natural. Os produtores afirmam que o saco de 40 quilos do farelo de milho saltou de R$ 30/R$ 32 para R$ 48 e R$ 50; enquanto o de farelo de soja saiu de R$ 67 para R$ 90.

“No Sertão, soubemos que já teve morte de bicho, mas aqui (no Agreste) ainda estamos conseguindo segurar porque estamos comprando água para o rebanho. Uma vaca toma, em média, 50 litros por dia e o carro-pipa chega com valor entre R$ 100 e R$ 150, dependendo da localização da propriedade. Mesmo assim, os animais perderam peso e a produtividade já caiu 40%”, lamenta Azevedo. A produtividade média de uma vaca no Brasil é de 6 litros de leite por dia, enquanto em Pernambuco é de 14 litros por dia.

No documento que será apresentado ao governo do Estado, o movimento S.O.S Produtores de Leite vai apontar a necessidade de expandir o plantio da palma, de cavar poços profundos, da limpeza de barragens, de concluir grandes obras como a Adutora e o Ramal do Agreste e de terminar a construção de barragens, que vem sendo adiadas por falta de recursos tanto estaduais quanto federais.

Hoje, Paulo Câmara está no Agreste para inaugurar o Sistema de Abastecimento de Água de Jucati, que também vai beneficiar Garanhuns. A obra teve investimento de R$ 6 milhões e vai levar água para cerca de 15 mil habitantes, sendo 100% da população urbana da cidade de Jucati e das localidades de Neves (distrito) e São Pedro (em Garanhuns).

DESSALINIZADORES

O secretário estadual de Desenvolvimento Agrário, Dilson Peixoto, diz que uma das estratégias para aliviar os impactos da estiagem no Semiárido será a instalação de 170 sistemas de dessalinização nos próximos meses. Coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Regional e executado em parceria com o Estado, o Programa Água Doce (PAD) vai investir R$ 36,9 milhões, sendo R$ 33,2 milhões da União e R$ 3,7 milhões de contrapartida estadual para atender a 60 mil pessoas em 21 municípios do Semiárido.

“Lançamos a licitação agora em janeiro e esperamos começar as obras até março. Desses 170 sistemas que vão dessalinizar água salobra, 80% vão ficar no Agreste e o resto no Sertão. Existem poços na região que foram perfurados e estão vedados porque a água é salobra”, destaca o secretário. Na avaliação dele, também é preciso aumentar a oferta de água e acelerar a liberação de recursos para obras.

“A gente espera que este ano haja uma solidariedade do governo federal em relação a isso. As cidades que decretaram situação de emergência são abastecidas pelo programa de pipas (Operação Carro-Pipa), mas como choveu e a oferta diminuiu, é preciso retomar. Temos um convênio de R$ 100 milhões com o governo federal dentro do programa Água para Todos, que não teve um centavo liberado no ano passado. Desse recurso, 25% seria para sistema de abastecimento de água e 75% para a construção de pequenas e médias barragens”, cobra.

O Ministério do Desenvolvimento Regional informa que o decreto de situação de emergência das 61 cidades venceu ontem, mas elas continuarão recebendo assistência até que chegue o novo decreto do Estado para o MDR. De acordo com relatório de ontem da Agência Pernambucana de Água e Clima (Apac), dos 75 reservatórios monitorados no Estado, 18 estão em situação de colapso. Jucazinho está com 1,2% do total.

Bacia Leiteira em Pernambuco

Sertão

Bodocó
Exu
Ouricuri
Granito
Afrânio
Araripina

Agreste

Águas Belas
Bom Conselho
Buíque
Caetés
Capoeiras
Garanhuns
Iati
Itaíba
Lajedo
Paranatama
Pedra
Saloá
Tupanatinga
Venturosa
Alagoinha
Altinho
Belo Jardim
Cachoeirinha
Ibiorajuba
Pesqueira
Poção
Sanharó
São Bento do Una
São Caetano
Tacaimbó
Arcoverde
Manari

O retrato da Bacia Leiteira

27 é o número de municípios produtores
2 milhões de litros é a produção diária
106.520 é o número de produtores
1,89 milhão é o número de animais
8ª é a posição de Pernambuco no ranking nacional
2ª é posição no ranking do Nordeste

Desempenho da produção de leite (em litros)

2012 - 2.368.091 
2013 - 1.875.856 
2014 - 1.622.600 
2015 - 1.699.228 
2016 - 1.883.356
2017 - 1.472.315 
2018 - 1.830.288 
2019 - 2.000.000

O rebanho de Pernambuco

2012 - 2.393.886 
2013 - 1.989.543 
2014 - 1.974.826 
2015 - 1.958.213 
2016 - 1.908.801 
2017 - 1.793.423 
2018 - 1.843.033 
2019 - 1.899.604

PRINCIPAIS OBRAS HÍDRICAS FICAM PARA 2021

Obras estruturadoras de segurança hídrica poderiam ter amenizado o impacto da seca no Agreste pernambucano ainda em 2019. Mas nem mesmo a Adutora do Agreste, iniciada em 2013, foi concluída. Além dela, há outras três adutoras que estão sendo construídas pelo governo do Estado: Serro Azul, Custódia e Alto do Capibaribe. Todas essas intervenções atenderão os municípios agrestinos com abastecimento de água.

No caso da maior delas, a Adutora do Agreste, atrasos nos repasses federais seriam o principal motivo para a demora. No entanto, de acordo com a Secretaria de Infraestrutura e Recursos Hídricos (Seinfra) do Estado, a obra tem nova previsão de conclusão estabelecida para 2021, já que teve convênio prorrogado em mais dois anos. Quando estiver em operação, 22 cidades do Agreste e uma no Sertão (Arcoverde) serão atendidas, beneficiando 1,2 milhão de habitantes.

Orçada em R$ 1,4 bilhão, o empreendimento terá investimento de 1,25 bilhão do Governo Federal e contrapartida de R$ 141,5 milhões do Estado de Pernambuco. Segundo o Ministério de Desenvolvimento Regional (MDR), atualmente, a obra encontra-se com 61,42% de execução física. Com a execução da segunda fase da obra, ainda não conveniada, o número de cidades beneficiadas passará para 68.

A Adutora do Agreste será alimentada pelo Eixo Leste da Transposição do Rio São Francisco. No entanto, é necessária a conclusão do Ramal do Agreste, obra que está em execução pelo governo federal. O MDR disse em nota que "obra foi uma das prioridades da Pasta em 2019, com investimentos de R$ 591 milhões ao longo do ano". No entanto, com início em 2018, e previsão de entrega em fevereiro de 2021, a intervenção está com 47,68% de execução física.

Situado no norte de Pernambuco, próximo à fronteira com a Paraíba, o Ramal está orçado em R$ 1,67 bilhão. Entre os municípios que serão abastecidos estão Caruaru, Santa Cruz do Capibaribe, Belo Jardim e Arcoverde. Com essas duas obras previstas apenas para o ano que vem, a Seinfra de Pernambuco espera entregar ainda em 2020 outras intervenções de menor porte, mas que têm capacidade de amenizar os reflexos da estiagem no Agreste.

Ainda no primeiro semestre devem entrar em funcionamento a Adutora de Custódia, iniciada em março de 2019. O investimento é de R$ 31 milhões e deve atender 40 mil pessoas. Também devera ser entregue a Adutora Alto do Capibaribe, iniciada em abril do ano passado. O investimento de R$ 82 milhões deve beneficiar 230 mil pessoas.

De acordo com o cronograma do governo do Estado, fica para o fim deste ano a entrega da Adutora de Serro Azul, que deve atender 1,5 milhão de pessoas. A obra iniciada em abril de 2018 tem investimento previsto em R$ 200 milhões.

A secretária estadual Fernandha Batista, titular Seinfra em Pernambuco, revela que este ano serão investidos mais de R$ 1,5 bilhão em obras de segurança hídrica. "Essas intervenções são obras para o primeiro uso, que é cozinhar, tomar banho, esse tipo de atividade que dá qualidade de vida. Mas entendemos que essas intervenções também fortalecem as cadeias produtivas que hoje funcionam no Agreste", resume.

Cronograma de entrega das adutoras em Pernambuco:

Adutora de Custódia
Extensão: 23 quilômetros
Será alimentada por uma estação elevatória pertencente ao Sistema Moxotó, em Sertânia.
Início: março de 2019
Previsão para conclusão: primeiro semestre de 2020.
Investimento: R$ 31 milhões.
População beneficiada: 40 mil.

Adutora Alto do Capibaribe

Início: abril de 2019
Previsão para conclusão: Junho de 2020
Investimento: R$ 82 milhões.
Extensão: 70 quilômetros.
Cidades beneficiadas: nove no Agreste pernambucano e uma na Paraíba.
Adutora será alimentada por águas da Transposição do Rio São Francisco para o Rio Paraiba no município de Barra de São Miguel, na cidade paraibana.
População beneficiada: 230 mil pessoas.

Adutora de Serro Azul

Início: Abril de 2018
Previsão para conclusão: Final do segundo semestre de 2020
Investimento: R$ 200 milhões
Extensão: 58 quilômetros.
Cidades beneficiadas: Belo Jardim, Sanharó, Caruaru, Tacaimbó, São Bento do Una, São Caetano, Santa Cruz do Capibaribe, Toritama, Bezerros e Gravatá
População beneficiada: 1,5 milhão de habitantes

Adutora do Agreste - 1ª Etapa

A obra foi iniciada em junho de 2013 e tem previsão para conclusão em dezembro de 2021, pois o convênio foi prorrogado em mais dois anos. Serão beneficiadas 23 cidades, sendo 22 no Agreste e uma no Sertão (Arcoverde), o que corresponde a 1,2 milhão de habitantes. A adutora terá 772 quilômetros de extensão e já foram executados 598 quilômetros, o que corresponde a 77% do total de tubulações assentadas. Com a execução da segunda etapa da Adutora do Agreste – ainda não conveniada – o número de cidades beneficiadas passará para 68, além de 80 localidades. 

Outras obras hídricas em Pernambuco:

Sistema de Poços de Tupanatinga

Apesar da obra não depender das águas do Rio São Francisco (Eixo Leste), o Sistema de Poços de Tupanatinga também integra o conjunto de empreendimentos pensados pelo Governo do Estado, que visam antecipar o uso da Adutora do Agreste. A obra consiste na perfuração de uma bateria de 20 poços, de 300 metros de profundidade, em média, para a produção de uma vazão de 200 litros de água, por segundo, para alimentar a Adutora do Agreste.
Início da obra: maio de 2019.
Previsão para conclusão: 2o semestre de 2020
Investimentos: R$ 54 milhões
Cidades beneficiadas: Venturosa, Pedra, Buíque, Tupanatinga, Itaíba, Águas Belas e Iati.
População beneficiada: 215 mil habitantes

Adutora do Moxotó (distrito de Rio da Barra, zona rural de Sertânia) - EM OPERAÇÃO

Extensão da adutora: 70 quilômetros.
Cidades beneficiadas: 10
Investimento: R$ 85 milhões
População beneficiada: 400 mil
Já estão sendo atendidos os municípios de Arcoverde, Pesqueira, Alagoinha, Belo Jardim, Sanharó, São Bento do Una e Tacaimbó. Até o final do ano, serão atendidas as cidades de São Caetano, Venturosa, Pedra e Brejo da Madre de Deus.

Adutora de Pirangi – EM OPERAÇÃO

Iniciou a operação em março de 2017 para levar água de Catende, na Zona da Mata Sul, para a Barragem do Prata, em Bonito, no Agreste. Reforça o Sistema Produtor Prata destinando até 500 l/s oriundos de captação no Rio Pirangi, no município de Catende, a fim de preservar o volume acumulado na Barragem do Prata, prolongando o alcance da oferta de água através deste manancial.
Extensão da adutora: 27 quilômetros.
Investimento: R$ 64 milhões.
Cidades beneficiadas: Dez, entre elas, Caruaru e Santa Cruz do Capibaribe.
População beneficiada: 800 mil pessoas.

Últimas notícias