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SOLUÇÕES URBANAS

Turismo no litoral de Pernambuco vive duas realidades

No Sul, praias como Porto de Galinhas e Carneiros colhem frutos da união do trade. Já no Norte, a Ilha de Itamaracá sofre com o abandono

Marília Banholzer e Mona Lisa Dourado
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Marília Banholzer e Mona Lisa Dourado
Publicado em 24/11/2019 às 7:01 | Atualizado em 11/03/2020 às 22:19
Fotos: Alexandre Gondin/JC Imagem
No Sul, praias como Porto de Galinhas e Carneiros estão em alta, já no Norte, a Ilha de Itamaracá sofre com o abandono - FOTO: Fotos: Alexandre Gondin/JC Imagem
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Pernambuco tem 187 quilômetros de costa, pontuados por belas praias, rios e manguezais. No Recife e em Olinda, destacam-se o patrimônio histórico e a riqueza gastronômica, além da vocação da capital para os negócios e eventos. Já o interior apresenta imensa diversidade cultural e de ecossistemas naturais. A 545 km do continente, desponta o Arquipélago de Fernando de Noronha. Apesar do potencial explícito para o turismo, deficiências na infraestrutura, na promoção e na capacitação ainda impedem o Estado de ter maior participação em um mercado que movimenta mais de US$ 152,5 bilhões (8,1% do PIB nacional em 2018) e gera 7,3% dos empregos no País. De hoje até quarta-feira, a série de reportagens Soluções Urbanas mostra como poder público e iniciativa privada precisam se articular para desenvolver o setor a partir dos municípios. Para encerrar e aprofundar as discussões, o SJCC realiza na manhã desta quarta-feira (27) um seminário, a fim de compartilhar os aprendizados de destinos que inovam para atrair turistas e promover qualidade de vida aos cidadãos.

Pernambuco conseguiu nos últimos anos avançar na diversificação de atrativos turísticos. Incluiu equipamentos urbanos e rurais no cardápio de opções. Mas ainda é o binômio sol e mar que atrai grande parte dos visitantes a lazer. Contraditoriamente, o litoral é a principal vitrine das disparidades socioeconômicas, acertos e desacertos do turismo no Estado.

No Sul, concentram-se os maiores investimentos em infraestrutura, grande oferta hoteleira (mais de 17 mil leitos) e governança consolidada do setor, com mais de 15 associações do trade só em Porto de Galinhas. No destino, que recebeu 1,2 milhão de visitantes em 2018, 30 mil pessoas trabalham direta ou indiretamente com a atividade, um terço da população de Ipojuca.

Porto de Galinhas é o principal chamariz do Litoral Sul do EStado

Apesar de igualmente rico em belezas naturais, cultura e história, no Norte o retrato é invertido. A região quase não guarda resquícios da efervescência das décadas de 1980 e 1990, quando era reduto de veranistas atraídos por festivais e inúmeras opções de entretenimento.

Hoje, contam-se nos dedos os hotéis (cinco, e algumas pousadas entre Paulista e Itamaracá). Não há sequer números oficiais sobre visitação turística, e, segundo a Associação Brasileira de Agências de Viagens em Pernambuco (Abav-PE), são poucos os receptivos locais que oferecem passeios ali. O presidente da entidade, Marcos Teixeira, diz que sua empresa, a Martur, leva 150 pessoas em média ao Litoral Norte por mês, contra 4 mil ao Litoral Sul. As razões? Desordenamento e insegurança intimidam, faltam restaurantes, e é gritante o descaso com o patrimônio.

Historicamente, o que ocorreu no Estado foi a migração há cerca de 30 anos dos investimentos privados para o Litoral Sul, levando governos a reboque, conta o coordenador do Programa de Pós-Graduação em Hotelaria e Turismo da UFPE, Sérgio Leal. "Os pioneiros de Porto de Galinhas não esperaram o poder público. Colocaram a mão na massa. A partir do sucesso, os governos municipal e estadual começaram a dar suporte e se tornaram parceiros do trade. Os resultados extrapolaram as fronteiras de Ipojuca e favoreceram todo o Litoral Sul, a exemplo de Carneiros (Tamandaré)". Já no Norte houve acomodação, avalia o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis no Estado (ABIH-PE), Eduardo Cavalcanti. "Carece de investimento público, mas o privado precisa se mexer."

Carneiros tem se beneficiado com o fluxo turístico no Litoral Sul

Para não seguir o mesmo rumo, em Porto de Galinhas a lógica é de renovação, garante o presidente do Convention & Visitors Bureau, Eduardo Tiburtius. "A política aqui é de união e de fazer os hotéis serem melhores, com reformas e equipamentos novos. Está na cultura empresarial, e temos que perpetuar." 

A diretora-executiva da Associação de Turismo de Porto, Brenda Silveira, acrescenta que a divulgação do destino também é contínua. "Estamos em feiras o ano inteiro, além de trazer fam tours e fam press à região. Este ano já vieram mais de mil agentes de viagem. Estimulamos o turista a viver o destino e contratar serviços de bugueiros, jangadeiros, restaurantes, para desenvolver toda a região."

De fato, a estrutura de Porto de Galinhas é a mais bem acabada do litoral: uma vila vibrante, cheia de produtos e serviços, limpa, organizada e policiada. Não significa, entretanto, que seja perfeita. A falta de saneamento é um problema, assim como a dificuldade de estacionamento. E, na alta temporada, o assédio de ambulantes. A Prefeitura de Ipojuca diz que a concessão do saneamento é da Compesa, e "faz cobranças constantes para que o projeto seja agilizado e concluído". Também estuda a implantação de sistema inteligente de estacionamentos, como o de zonas azuis, ainda sem previsão. Já os vendedores passaram por recadastramento, para maior controle.

Litoral Norte esquecido

Enquanto o Litoral Sul colhe os frutos do planejamento, o Norte padece com o ostracismo e um turismo residual de moradores de cidades próximas, como Olinda, Recife e João Pessoa. "O governo faz de Porto de Galinhas o garoto-propaganda, o que não está errado, mas não pode esquecer o Litoral Norte, que não aparece nem na promoção oficial do Estado. Por sua vez, os prefeitos não pressionam", ressente-se Marcelo Marenga, administrador do Hotel Casa Blanca, em Paulista, que dispõe de 110 apartamentos, mas cuja taxa de ocupação patina em volta dos 30%. "Nos últimos seis meses, operamos no prejuízo."

Para se ter ideia do abandono, no Forte de Pau Amarelo, em Paulista, canhões e até a placa informativa sobre o monumento do século 18 estão pichados e corroídos pela ferrugem. O lixo toma conta da área interna, onde lojas poderiam ser instaladas. Também faltam limpeza, sinalização e iluminação na PE-01, do giradouro ao Pontal de Maria Farinha, embora a via esteja em boas condições de tráfego. A Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Turismo e Cultura de Paulista espera o Iphan aprovar o projeto de requalificação do Forte para buscar verba para as obras, que devem ser iniciadas em março. Já a requalificação da PE-01 está prevista para terminar este ano.

O lixo toma conta da área interna do Forte de Pau Amarelo, onde lojas poderiam ser instaladas

Mais ao Norte, em Itamaracá, a presença de três unidades prisionais cobra um preço alto. Centenas de placas de "vende-se" denunciam a fuga dos veranistas assustados com a violência. O descuido com o destino, que já foi a joia da coroa do turismo do Estado, é flagrante na Praia do Pilar, onde o esgoto é lançado direto no mar.

Entre as deficiências, uma boa notícia: o Forte Orange, reformado e reaberto ao público em 2018, deve receber um museu com peças encontradas nas escavações arqueológicas realizadas ali. Outro atrativo da ilha, no entanto, o Projeto Peixe-Boi Marinho está fechado a visitantes. "Estive lá e foi frustrante. Não havia nenhuma informação", desabafa a fisioterapeuta paulista Luciana Rostodela, 37 anos. Em uma semana percorrendo de carro as praias do Estado, ela diz ser inevitável a comparação. "Em Carneiros e Porto, acesso, quiosques e serviços são muito melhores."

Dona de uma das barracas mais antigas da Praia do Forte, Gicélia Silva faz coro com a turista. "Aqui o visitante desce do veículo e só vê bagunça. É feio. A gente está abandonado. Nem prefeitura nem governo arrumam nada", conta, cobrando atenção. Segundo o secretário de Turismo de Itamaracá, Bruno Reis, a ilha "paga a conta" do presídio. "Houve um processo de favelização com a vinda das famílias dos presos para perto", lembra, reconhecendo dificuldades com limpeza e saneamento. "Estamos tentando recursos através de emendas parlamentares, para voltar a alavancar o turismo, isso envolve todas as instâncias do poder público."

Houve um processo de favelização com a vinda das famílias dos presos para perto

Bruno Reis, secretário de Turismo de Itamaracá

Sobre as alegações de que o Litoral Norte é preterido, o secretário estadual de Turismo, Rodrigo Novaes, afirma que a região "deve ser repensada". Para isso, iniciou aproximação com empresários através do projeto Bora Pernambucar, que identifica pontos positivos e gargalos nos municípios. "Já pactuamos ações e nos comprometemos a promover a região com publicidade."

No que diz respeito à infraestrutura, o último grande investimento do Estado foi entre 2010 e 2018 através do Programa de Desenvolvimento do Turismo (Prodetur). O contrato assinado com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) contemplou US$ 75 milhões, com contrapartida de R$ 50 milhões do governo de Pernambuco. Incluiu cerca de 50 obras, entre elas o Forte Orange, o 2° módulo do Cais do Sertão e o teleférico de Bonito (Agreste). O BID considerou a ação bem-sucedida e propôs novo contrato. Mas com as contas públicas desequilibradas, o Estado fica impedido de novos empréstimos. Em 2019, os recursos previstos na Lei Orçamentária Anual (LOA) para investimentos da Secretaria de Turismo, Esportes e Lazer são de R$ 18,6 milhões, cerca de um terço do orçamento de 2018: R$ 55,7 milhões. 

» SEMINÁRIO SOBRE TURISMO

Para debater caminhos possíveis para o turismo, o Sistema Jornal do Commercio de Comunicação (SJCC) realiza nesta quarta-feira (27) o Seminário Soluções Urbanas – Turismo, que reunirá especialistas, profissionais do trade, empresários, gestores públicos, estudantes e demais interessados no tema. As inscrições para o evento já estão abertas, são gratuitas e podem ser feitas até o dia 26 pelo e-mail [email protected] ou no site www.jc.com.br/seminariojc. O encontro ocorre das 8h às 12h30, no auditório do SJCC na Rua do Lima, em Santo Amaro.

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