Em um duro golpe para aqueles que são considerados os dois homens mais poderosos do futebol, Joseph Blatter, presidente da Fifa desde 1998, e Michel Platini, presidente da Uefa desde 2007, foram suspensos por oito anos de qualquer atividade relacionada ao futebol.
O anúncio foi feito nesta segunda-feira pela justiça interna da entidade que comanda o futebol mundial.
O pagamento de 1,8 milhão de euros em 2011 de Blatter a Platini, supostamente por trabalhos de assessoria à Fifa concluídos uma década antes, sem um contrato escrito, resultou em um primeiro momento em uma suspensão provisória que chegaria ao fim em janeiro, à espera do veredicto de fato da questão.
Embora as acusações de corrupção não tenham sido mantidas, a justiça interna da Fifa considerou ambos culpados de "conflito de interesses" e de "gestão desleal". Platini deve pagar ainda uma multa de 80.000 francos suíços (74.000 euros), maior que a multa atribuída a Blatter, fixada em 50.000 francos suíços (46.295 euros).
Blatter contra-ataca
Cerca de uma hora após o anuncio da suspensão, Blatter anunciou em coletiva de imprensa que irá recorrer da decisão.
"Vamos recorrer no Comitê de Apelação da Fifa, em seguida no Tribunal Arbitral do Esporte (TAS) e depois na justiça suíça", afirmou o presidente demissionário da entidade, que se mostrou decepcionado com a Comissão de Ética da Fifa.
"Se vocês me perguntarem se me sinto traído, posso dizer que sim. Pedimos à Comissão de Ética que julgasse o comportamento ético, mas ignoraram as provas", disparou.
"Lamento que, como presidente da Fifa, eu seja um saco de pancadas. Sinto muito pelo futebol, sinto muito pela Fifa", continuou o dirigente.
Assim como Blatter, Platini também poderá recorrer da suspensão, mas o tempo joga contra o ex-jogador, já que o francês desejava disputar a eleição presidencial da Fifa, programada para 26 de fevereiro.
O advogado de Platini, Thibaud d'Alès, advogado de Michel Platini, criticou o "cinismo procedural" da justiça interna da Fifa, estranhando que os motivos da suspensão de seu cliente, necessários para abrir uma apelação, serão comunicados "somente na primeira metade de janeiro de 2016".
O suíço Blatter, de 79 anos e que em quatro décadas passou por diversos cargos na entidade que comanda o futebol mundial, já estava praticamente aposentado, mas esperava ter a possibilidade de presidir a Fifa até a eleição de seu sucessor no congresso extraordinário convocado para fevereiro.
Se tentar comparecer ao TAS diretamente, sem passar primeiro pelo Comitê de Apelação da Fifa, para agilizar o processo, Platini, de 60 anos, precisará da autorização da Fifa, algo que parece pouco provável, segundo fontes ligadas à entidade máxima do futebol mundial.
A data limite para a apresentação de candidaturas é 26 de janeiro, o que significa que o francês tem pouco tempo para tentar esgotar todas as vias de recursos.
Platini acusa farsa
O veredicto é um cartão vermelho para aquele que já foi considerado o melhor jogador do mundo, com três troféus da Bola de Ouro na carreira, anos de glória na Juventus de Turim e o título da Eurocopa-1984 com a França.
Desde 2007, Platini comandava o futebol europeu e nos últimos anos passou de aliado a inimigo número 1 de Blatter, que, na coletiva de imprensa nesta segunda-feira, afirmou considerar o francês "um homem honrado" e não guardar "sentimento de vingança".
Em comunicado transmitido à AFP após o anúncio da suspensão, Platini afirmou ser vítima de perseguição na Fifa e negou qualquer legitimidade ao veredito da Comissão de Ética.
"A decisão não me surpreende. Estou convencido que minha sorte já estava traçada antes da audiência de 18 de dezembro (a qual não compareceu, sendo representado por seu advogado) e que o veredito é o envoltório patético de um desejo de me eliminar do mundo do futebol", acusou.
"Tanto nos campos de futebol como no exercício de meus mandatos, meu comportamento sempre foi irretocável e estou em paz com minha consciência", continuou o francês.
Em conclusão, Platini afirmou que não desistirá de buscar seus direitos na justiça, tanto no TAS como na justiça comum.
"Estou decidido a recorrer, no momento que corresponda, à justiça civil para obter a reparação da integridade dos prejuízos que venho sofrendo há muitas semanas por este caso. Irei até o final para alcançar este objetivo", declarou.
Nesta segunda-feira, a Uefa declarou apoio a seu presidente, afirmando estar "extremamente decepcionada" pela suspensão de oito anos imposta a Platini, que "merece um processo justo".
Para o sueco Lennart Johansson, ex-presidente da entidade, a punição a Blatter e seu antecessor, Platini, "é um castigo suficiente".
"Penso que é um castigo suficiente, porque significa que nunca mais poderão voltar", afirmou Johansson, que perdeu as eleições para Platino e Blatter na frente da UEFA e da FIFA, destacando que o tempo lhe deu razão.
"Não tenho um sentimento de vitória, mas acho que se demonstrou a posteriori que tudo o que denunciei, pelo que lutei, não foi em vão. A verdade sempre vem à tona", afirmou.
'Annus horribilis'
A decisão desta segunda-feira pode ser considerada um momento que resume 2015 para a Fifa, considerado o 'annus horribilis' da entidade, marcado por escândalos de corrupção desde a detenção em 27 de maio em Zurique de sete dirigentes, incluindo o ex-presidente da CBF José Maria Marin.
O escândalo levou Blatter, que em 29 de maio havia sido reeleito para um quinto mandato que deveria prosseguir até 2019, a anunciar em 2 de junho que deixaria o comando da Fifa e a convocar um congresso para determinar seu sucessor.
Platini iniciou a corrida presidencial como o favorito, mas o que parecia um caminho tranquilo virou um calvário, com punições anunciadas como episódios de uma série.
À espera do que acontece com os recursos de Platini, a Fifa tem cinco candidatos à presidência: o suíço-italiano Gianni Infantino, o xeque do Bahrein Salman bin Ibrahim al-Khalifa, o príncipe jordaniano Ali bin al-Hussein, o sul-africano Tokyo Sexwale e o francês Jérôme Champagne.
O novo presidente da Fifa terá uma missão extremamente complicada de reconstruir a credibilidade de uma instituição dinamitada pela corrupção.
Até o momento, 39 dirigentes ou ex-funcionários da Fifa foram indiciados pela justiça dos Estados Unidos, acusados pela criação de um sistema de subornos que teria movimentado quase 200 milhões de dólares desde 1991.