Representantes de povos indígenas realizaram, na manhã de sexta (21), uma cerimônia religiosa para celebrar a descoberta de dois sítios arqueológicos, no ano passado, na Gamboa, região portuária da cidade do Rio de Janeiro, com artefatos e ossadas dos primeiros índios brasileiros, datados de 3 a 4 mil anos atrás.
Integrante da etnia Tupinambá, Anápuáka Muniz Tupinambá Hã-hã-hãe explicou que o ritual também é uma forma de chamar a atenção das autoridades para a importância de se preservar e divulgar esse patrimônio brasileiro. O grupo promoveu o ritual em locais do centro da capital fluminense.
“Aqui é a região do Porto Maravilha, que está sofrendo uma ampla revitalização e onde está sendo construído um corredor cultural. A questão da cultura indígena, no entanto, ainda não foi abordada e estamos aqui para afirmar religiosamente que queremos espaço para trazer para essa área todo o material arqueológico, de cemitério, que temos não só nesse município, mas também em outros, para termos um espaço para pesquisa e de proteção e divulgação da nossa cultura”.
O evento foi promovido pela organização não governamental Raízes Históricas Indígenas no prédio do Instituto de Pesquisa e Memória Pretos Novos (IPM), na Rua Pedro Ernesto, na Gamboa, que abriga o Cemitério dos Pretos Novos e agora também o sítio arqueológico sambaqui, onde foram encontradas cerâmicas que comprovam o primeiro contato entre os índios brasileiros e os colonizadores portugueses na região.
Depois, o grupo se dirigiu até a Rua Sacadura Cabral, também na Gamboa, onde há outros achados de sambaqui, finalizando o ritual na Praça da Harmonia, onde existiu um mercado de escravos.
O arqueólogo e historiador Reinaldo Tavares, que foi um dos pesquisadores que encontraram os sítios, disse que a descoberta foi uma grande surpresa.
“Estávamos procurando a delimitação espacial do cemitério dos Pretos Novos e foi então que encontramos, primeiramente, o sítio de contato entre europeus e os tupinambás, e depois, na última sondagem pela rua, esse sítio pré-histórico, o que foi uma surpresa, pois só sabíamos de vestígios dele na região por documentos antigos. Hoje, os sítios estão registrados e protegidos e estamos aqui buscando a interação da comunidade com o seu patrimônio”.
O arqueólogo explicou que o sítio sambaqui é da época dos paleoíndios brasileiros, com material arqueológico que apresenta indícios de uma sociedade de pescadores e coletores. Existem sambaquis em todo o litoral brasileiro, com resquícios de caixas de sepultura e de locais de convivência, onde a sociedade vivia e enterrava seus mortos. No sítio da zona portuária, foram encontrados também ossos de peixes queimados, lascas bipolares de quartzos para manipular peixes e resíduos de alimentos.
O cemitério de escravos foi descoberto durante obras em um imóvel particular do século 18, na Gamboa. A região era conhecida em meados do século 19 como “a pequena África”. Quando os escravos chegavam ao Rio de Janeiro, desembarcavam na Gamboa. Os ossos encontrados no local pertenciam a pessoas jovens, em sua maioria, pré-adolescentes.