Sete de julho de 1980 certamente não foi um dia como outro qualquer no Recife. Milhares de pessoas foram às ruas e se aglomeraram pelos 24 quilômetros entre o Aeroporto Militar do Ibura, hoje Base Aérea do Jordão, e o Palácio dos Manguinhos, na Avenida Rui Barbosa, nas Graças. O motivo de tanta agitação era justificável. Pela primeira e até hoje única vez, o maior representante da Igreja Católica pisaria em solo pernambucano. Exatamente às 15h42, o papa João Paulo II desembarcou na capital, após passagem por Salvador. Ao descer foi recebido pelo governador Marco Maciel e pelo arcebispo de Olinda e Recife, Dom Hélder Câmara, que recebeu um forte abraço e um beijo na testa.
Um efetivo de 300 policiais foi destacado para fazer a segurança durante o trajeto do sumo pontífice pelas ruas do Recife. Insuficiente frente às quase 500 mil pessoas que vieram de várias partes de Pernambuco e até de outros Estados para poder vê-lo. O papamóvel fez todo o trajeto a uma velocidade média de 20 km/h. A medida que passava, a multidão invadia a pista a pé ou em bicicletas na tentativa de encontrar um melhor lugar para se aproximar do papa. Quando chegou à Avenida Boa Viagem, encontrou as pessoas acenando com lenços brancos nos terraços dos edifícios. O comboio seguiu pela Avenida Antônio de Góis, passou pela Ponte do Pina até chegar à Ilha Joana Bezerra, onde uma grande estrutura esperava o santo padre para a realização de uma missa. Muitos se encontravam no local desde a véspera.
A chegada de João Paulo II à area central da cidade causou grande tumulto. Pelo menos 1.500 pessoas foram atendidas nos postos de saúde montados nas proximidades do palco. Uma mulher chegou a ter um infarto pouco após o início da missa. “Eu posso morrer do coração agora, mas estou feliz porque vi o papa lá de cima do viaduto, acenando para mim” disse, na época ao, Helena Maria da Silva Azevedo, então com 50 anos, enquanto era atendida em uma das unidades. Outro detalhe curioso da passagem do papa pelo Recife aconteceu nas maternidades. Pelo menos sete crianças nascidas naquele dia foram batizadas com o nome de João Paulo. A primeira foi o filho de Maria Verônica e Nelson Fernando Barreto, que nasceu à 0h, na Maternidade Bandeira Filho, em Afogados. Após todos os compromissos, o papa pernoitou no Palácio dos Manguinhos e no dia seguinte rumou para Teresina.
As lembranças ainda permeiam o imaginário da professora Maria Auxiliadora Leal da Silva, que diz ter alcançado uma graça pedida durante o cortejo do papa. “Recordo daquela figura carismática, de sorriso simples. Foi uma emoção muito forte. Naquela época já era possível perceber que ele era uma pessoa especial enviada por Deus. Eu estava vivendo um problema na época. Meu sobrinho tinha desaparecido e há vários dias não tínhamos notícias dele. Pedi, em silêncio, que ele me ajudasse. No dia seguinte meu sobrinho apareceu sem nenhum arranhão”, relatou.
Quem também recorda os detalhes daquela visita é o atual arcebispo de Olinda e Recife, dom Fernando Saburido, então monge do Mosteiro de São Bento. “Saí a pé de Olinda até a Ilha Joana Bezerra para acompanhar a missa. Ele era uma pessoa realmente santa, preocupada especialmente com as famílias e a juventude”, disse. Dom Fernando ainda encontrou João Paulo II em duas oportunidades. “A primeira vez que tivemos contato foi em 2001, em Castel Gandolfo, na Itália, e no próprio Vaticano quando me tornei bispo-auxiliar. No ano seguinte voltei ao Vaticano para participar de um encontro de bispos. Nesta oportunidade cantamos o ‘João de Deus’ e fiz um discurso para ele”, acrescenta.