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Anistia Internacional alerta: tortura é rotina na Nigéria

De acordo com entidades de direitos humanos, policias e militares utilizam métodos como espancamento, tiros e estupro para torturar pessoas

Da ABr
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Publicado em 18/09/2014 às 11:10
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A Anistia Internacional divulgou nesta quinta-feira (18) um relatório de 60 páginas sobre casos de tortura na Nigéria. De acordo com a entidade de direitos humanos, é rotina no país africano a tortura de mulheres, homens e até crianças por policias e militares, que utilizam métodos como espancamento, tiros e estupro.

O relatório é o segundo de uma série de cinco que a entidade prepara dentro da campanha global contra a tortura. No começo do mês foi divulgado relatório sobre o México e ao longo deste ano e de 2015 também serão divulgadas as análises da entidade sobre o Marrocos, as Filipinas e o Uzbequistão.

O documento Bem-Vindo ao Inferno de Fogo: Torturas e Outros Maus-Tratos na Nigéria (do inglês Welcome to Hell Fire: Torture and Other Ill-Treatment in Nigeria) traz casos levantados entre 2007 e 2014 e aponta que frequentemente pessoas são detidas em grandes operações e sofrem torturas com o objetivo de extorquir dinheiro ou extrair confissões, muitas vezes com acusações falsas ou mesmo sem acusação formal.

O cientista político e assessor de Direitos Humanos da Anistia Internacional Brasil, Maurício Santoro, explica que a preocupação é com as consequências da perseguição do governo da Nigéria ao grupo extremista armado Boko Haram, que “tem cometido atentados e atrocidades”, como o rapto de 20 mulheres em junho, mas “evidentemente que a gravidade que o Boko Haram representa não pode ser uma carta branca para que a tortura seja empreendida no combate a ele”, alerta.

Desde 2009, entre 5 mil e 10 mil pessoas foram presas na Nigéria por suspeita de ligação com o grupo. A Anistia Internacional registrou desde 2007 cerca de 500 casos de tortura e a morte de 80 pessoas sob detenção, “possivelmente a maior parte delas em decorrência de tortura”, segundo Santoro. Os detidos não têm acesso a advogados, familiares ou tribunais e são submetidos a técnicas como extração de unha ou dente, asfixia, choque, violência sexual e espancamento. As vítimas também relatam práticas do tipo: ficar penduradas pelos braços e pernas, assistir à execução de outros presos, ter álcool e plástico derretido derramado sobre o corpo e rolar sobre garrafas quebradas.

As equipes da Anistia Internacional entrevistaram sobreviventes da tortura, seus parentes, advogados e policiais. Santoro afirma que a tortura é uma prática muito comum no país africano. “A gente está focando nessa questão do terrorismo, mas tem muitos casos que envolvem crimes comuns como roubo, adolescentes suspeitos de cometerem crimes, então é uma prática muito disseminada na sociedade nigeriana e que envolve desde questões políticas até suspeitas de crimes cotidianos”.

Ele lembra que a prática da tortura é inaceitável em qualquer circunstância e há 30 anos é considerada crime contra a humanidade, ou seja, não prescreve e não pode ser anistiado, como consta na Convenção das Nações Unidas Contra a Tortura, de 1984.

“São problemas que a gente vê em países como o Brasil. Uma vez que as pessoas acabam aceitando o uso da tortura, às vezes achando que isso vai ser uma maneira de combater o crime, abre-se na verdade uma porta para a total erosão do Estado de Direito. O policial que tortura, o agente de estado que tortura, vai acabar usando isso também para benefícios pessoais, para a extorsão, tentativa de se apoderar dos bens das suas vítimas, como aconteceu no Brasil, como acontece ainda”.

Para Santoro, apesar de o Brasil ainda ter relatos graves de tortura, o país tem dado passos positivos, com a criação das comissões da verdade, “que estão fazendo um trabalho muito importante para a investigação da tortura durante a ditadura, mas também para a sua persistência nos dias de hoje, inclusive com uma estrutura de segurança pública que é um legado da ditadura, um legado extremamente sombrio, extremamente sangrento e que continua a afetar a vida dos brasileiros cotidianamente”.

Outro desdobramento positivo, segundo o assessor, foi a instalação, em julho deste ano, do Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, uma obrigação que o Brasil tinha assumido em 2007 na ONU, que vai “possibilitar agora maior transparência, maior capacidade de cobrança, de prestação de contas com relação às ocorrências de tortura”, destaca Santoro.

No relatório sobre a Nigéria, a Anistia Internacional recomenda uma mudança na lei nigeriana, que ainda não tem a tipificação do crime de tortura, “então ela acaba sendo investigada como lesão corporal, como abuso de autoridade, o que não tem a mesma força”, explica o assessor. Também foi recomendada a criação de um mecanismo independente do governo para monitorar a polícia e investigar as denúncias de tortura e a supervisão do poder judiciário. “Quando o preso fica muito tempo sem ver um juiz, meses, às vezes anos, denunciar a tortura se torna praticamente impossível e a impunidade aumenta”.

Para a Anistia Internacional, é urgente que a Nigéria aprove uma lei para criminalizar a tortura e punir os culpados. Atualmente, não há investigação sobre os atos, muito menos responsabilização da cadeia de comando. Das centenas de vítimas identificadas, nenhuma foi compensada ou recebeu reparação do governo. O governo da Nigéria criou cinco comissões presidenciais e grupos de trabalho para analisar a reforma do sistema de Justiça criminal e erradicar a tortura, mas as recomendações não saíram do papel.

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