CRISE HUMANITÁRIA

Guerra na Síria completa quatro anos e população é a maior vítima

Matéria especial do JC mostra a tragédia da população síria na visão da ONG Médicos Sem Fronteiras

MARCOS OLIVEIRA
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MARCOS OLIVEIRA
Publicado em 28/03/2015 às 18:00
MSF
Matéria especial do JC mostra a tragédia da população síria na visão da ONG Médicos Sem Fronteiras - FOTO: MSF
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O prolongado e rigoroso inverno que completa quatro anos este mês. Em uma estimativa conservadora, mais de 215 mil pessoas morreram – destas, 10.808 crianças – na guerra civil da Síria. Além disso, aproximadamente 20 mil opositores estão “desaparecidos” nas prisões do regime sírio. Uma situação de colapso, que deverá se agravar mais com a saída de organizações humanitárias, obrigadas a bater em retirada após terem membros sequestrados ou mortos.

“Um esforço humanitário internacional em larga escala é desesperadamente necessário na Síria”, clama a dra. Joanne Liu, presidente da principal baixa dentre as instituições que tiveram de abandonar a região, a ONG Médicos Sem Fronteiras (MSF), prêmio Nobel da Paz de 1999. Em 2013, eles mantinham seis hospitais em regiões controladas pelos insurgentes, oferecendo milhares de consultas, realizando partos e cirurgias.

O grupo convivia com a dificuldade de lidar com grupos como Jeish el Mujahideen, Islamic Front, Jahbat Al Nusra, diferentes facções do Exército de Libertação da Síria e o Estado Islâmico do Iraque e do Levante (ISIS, na sigla em inglês), que mais tarde teve seu nome alterado para Estado Islâmico (EI).

Mesmo com todo respaldo e o respeito internacional do MSF – atuante em 70 países, com uma equipe de 34 mil profissionais –, no ano passado eles tiveram cinco membros sequestrados no norte da Síria. Fato que resultou na retirada das atividades diretas desenvolvidas. Agora, eles atuam com médicos próprios em países próximos e enviando suprimentos para hospitais e médicos sírios.

Recentemente, um diretor médico de uma área sitiada próxima de Damasco relatou a dra. Joanne Liu que seu hospital improvisado recebeu 128 pacientes feridos após um grave bombardeio contra um mercado lotado. Sua equipe salvou 60 pessoas, mas 68 pacientes morreram, principalmente, pela falta de suprimentos e médicos.

A saída de quadros da entidade só reforça o estado de calamidade pública enfrentado pela população. O sistema de saúde na Síria foi devastado nesses quatro anos de conflito. O acesso a tratamento médico essencial agora se tornou praticamente impossível, seja pela falta de suprimentos e de corpo médico qualificado ou devido aos ataques a hospitais.

Relatórios de entidades apontam que dos cerca de 2.500 médicos que trabalhavam em Aleppo, segunda maior cidade da Síria, antes do conflito, menos de 100 permanecem nos hospitais ainda em funcionamento. Os demais fugiram, tornaram-se deslocados internos. Outros foram ainda sequestrados ou mortos.

Quadro que ganha mais instabilidade com a miscelânea de grupos que disputam o poder. A Síria não vive uma guerra entre grupos pró e contra governo, mas de vários movimentos armados que reivindicam o poder para si. O presidente Bashar al-Assad continua no poder com o controle de aproximadamente 60% do país. Mas o principal beneficiário do conflito é o Estado Islâmico, cuja maior parte do seu califado encontra-se por lá.

Os radicais promovem mortes, sequestros, decapitações e miséria, que poderiam ter menor dimensão se não fosse o imobilismo da Organização das Nações Unidas (ONU). Com um Conselho de Segurança reconhecidamente polarizado entre os membros com poder de veto (China, Rússia, França, Reino Unido e EUA), a organização se viu impedida de agir no país logo que as primeiras manifestações contra o regime ditatorial ganharam as ruas e foram duramente combatidas por al-Assad.

China e Rússia são aliados do governo sírio e rejeitaram desde o começo qualquer ação mais firme da entidade. Washington só passou a incluir a questão com mais destaque na sua agenda internacional após o EI se tornar uma real ameaça ao Ocidente. 

Um diálogo junto às forças oficiais que combatem o EI seria uma lógica a ser seguida pelas nações ocidentais, como sugeriu o secretário de Estado americano, John Kerry. Porém, fornecer ajuda ao presidente Bashar al-Assad e assegurar sua governabilidade, representaria relegar o povo sírio a desgraça imposta por uma ditadura que dura desde 1970.

(Leia entrevista com médico brasileiro que atuou na Síria na vesão impressa publicada neste domingo (29) no caderno de Internacional)

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