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O papa Francisco deu nesta segunda-feira uma passo simbólico em favor da reconciliação na República Centro-Africana como uma visita à mesquita de um bairro muçulmano de Bangui, cenário de atrocidades em 2013 em um conflito com tom religioso. "Cristãos e muçulmanos são irmãos e irmãs", disse Francisco. "Os que clamam que acreditam em Deus também devem ser homens e mulheres de paz". Poucas horas depois, de forma igualmente simbólica, dois veículos lotados com muçulmanos com camisas estampadas com o rosto de Francisco chegaram ao estádio de Bangui para assistir à missa ao lado do papa.
Enquanto nenhum muçulmano se aventura a perambular por este bairro cristão, eles caminharam entre a multidão sendo aclamados por fiéis que gritavam "o ódio acabou!". O pontífice se reuniu com os líderes muçulmanos do bairro PK 5, em uma área que foi cenário de violência sectária. Ele foi recebido pelo imã Nehedi Tidjani, na presença de delegações católicas e protestantes. O papa falou às centenas de pessoas, incluindo deslocados, que vieram recebê-lo no interior da mesquita.
A visita aconteceu sob fortes medidas de segurança, com o apoio da força da ONU no país (Minusca). Os "capacetes azuis" ONU (10.900 homens em todo o país), o contingente militar francês (900) e a polícia centro-africana devem patrulhar Bangui até o fim da visita papal. O ministro das Finanças e do Orçamento, Abdalah Kafré Hassane, um muçulmano, fez um apelo em favor da "coesão social" para que os "muçulmanos não sejam mais trancados em seu reduto".
Nas imediações da mesquita aconteceram confrontos armados entre os Seleka, milicianos principalmente muçulmanos, e os milicianos cristãos e animistas, conhecidos como "anti-balaka". Para Jorge Bergoglio, esta visita emblemática foi a ocasião de ressaltar que não se pode confundir religião com conflito, e que a religião não deve servir de pretexto para interesses particulares. Para a Igreja, o conflito centro-africano é político, apesar de milícias da duas religiões se oporem.
Mauro Garofalo, da comunidade católica de Sant'Egidio, afirmou que a comunidade muçulmana esperava o papa com fervor e esperança. Depois da visita à mesquita, o pontífice seguiu para o complexo esportivo que leva o nome de Barthelemy Boganda, um sacerdote católico indígena, "pai da pátria", morto em 1960, pouco depois da proclamação da independência. No estádio, com capacidade para 30.000 pessoas, celebrou a última missa de sua viagem ao continente africano.
Policiais formavam vários cordões de isolamento, temendo possíveis atentados. A etapa de um dia e meio em Bangui já pode ser considerada um sucesso, apesar das críticas dos céticos. O papa, enérgico ante a espiral de vingança, foi recebido com fervor, apesar do ódio que persiste entre a população. No domingo, não citou a palavra muçulmano, consciente de que este conflito tem raízes políticas.
Francisco defendeu a unidade e pediu que as pessoas não cedam "à tentação do medo do outro, do desconhecido, do que não é parte de nosso grupo étnico, nossas opiniões políticas ou nossa confissão religiosa". Um Ano Santo, o "Jubileu da Misericórdia", sobre o perdão, começará em 8 de dezembro, mas foi inaugurado no domingo com a abertura de uma "porta sagrada" na catedral de Bangui. Francisco deixou Bangui no início da tarde para Roma, após três etapas na África, no Quênia, Uganda e República Centro-Africana.