Duas eleições no final de 2015 – a presidencial na Argentina e a parlamentar na Venezuela – marcam o fim de uma era nos dois países, governados há mais de uma década por um mesmo movimento político e quase sem oposição.
Na Argentina, a eleição do presidente Mauricio Macri representa o fim de 12 anos de governos kirchneristas, inaugurados por Nestor Kirchner em 2003. Ele foi sucedido pela mulher, Cristina Kirchner – do mesmo Partido Justicialista (ou Peronista). Ela foi reeleita em 2011, um ano depois da morte do marido.
Na Venezuela, os chavistas estão no poder desde 1998, quando Hugo Chávez foi eleito presidente pela primeira vez. Antes de morrer de câncer, em 2013, ele fez seu sucessor, Nicolás Maduro. Mas no dia 6 de dezembro de 2015, pela primeira vez em 17 anos, o chavismo perdeu a maioria parlamentar. A oposição elegeu 112 dos 167 representantes (dois terços) da Assembleia Nacional, tendo poder para propor mudanças importantes, como a reforma da Constituição e a saída antecipada de Maduro, cujo mandato presidencial termina em 2019.
Tanto na Argentina, quanto na Venezuela a economia pesou no voto. Os Kirchner assumiram o poder quando o pais começava a superar à crise de 2001 – a mais séria da recente história, marcada pela recessão, uma queda de 20% do Produto Interno Bruto (PIB) e a moratória da divida externa. Mesmo sem acesso ao mercado financeiro internacional, entre 2003 até 2011, a economia argentina cresceu em media 8% ao ano – graças, em parte, a alta dos preços das commodities.
“A situação muda quando a China, grande compradora de commodities, para de crescer tanto e os preços dos produtos que exportávamos caem”, explicou o economista Fausto Spotorno. “Soma-se a isso o fato de o governo de Cristina Kirchner gastar mais do que tinha, produzindo um déficit fiscal.” Para evitar a saída de dólares do pais, em outubro de 2011, o governo limitou as operações cambiais, praticamente impossibilitando a compra de dólares (ou qualquer moeda) no mercado oficial.
Para os venezuelanos, o impacto da queda dos preços das commodities foi muito maior. Segundo o analista politico Jorge Castro, “a Venezuela foi o país do mundo mais afetado” pela redução do valor do barril de petróleo, porque “98% de seus recursos” provém da exportação desse produto.
“Com a queda do preço do petróleo, os venezuelanos perderam 60% de seu poder de compra e ficaram sem dinheiro, inclusive, para importar produtos da cesta básica”, disse Castro. “Além do desabastecimento, o país tem uma inflação anual de 140%”.
As longas filas nos supermercados e a falta de soluções do governo para problemas que afetam a maior parte da população, levaram muitos chavistas a votar na oposição. “Mas para enfrentar uma crise dessa dimensão, é necessário unir esforços, num país dividido”, disse o analista politico Roberto Bacman. “E o governo venezuelano, acostumado a controlar todas as instituições durante tanto tempo, não deu sinais de estar aberto a um diálogo com a oposição.”
Segundo Bacman, a Argentina enfrenta um desafio parecido: uma nova etapa na qual o presidente terá que dividir o poder com o Congresso. “A Argentina é um país de instituições fracas, mas com uma sociedade mobilizada”, explicou Castro. “O êxito do governo depende na sua capacidade de acertar o rumo nos primeiros meses que, nesse caso, significa fazer com que a economia volte a crescer depois de quatro anos de estancamento.
O problema, segundo Spotorno, e que tanto num país, quanto no outro, não existem muitas alternativas: a conjuntura internacional é muito menos favorável e os ajustes, além de necessários, não podem mais ser adiados.