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"Um ano depois, o assassino ainda está à solta": um Deus barbudo, armado com uma kalashnikov, ilustrou a capa da revista satírica Charlie Hebdo na edição atualmente nas bancas, um ano após o primeiro de uma série de atentados que mostraram a vulnerabilidade da França.
Com uma tiragem de um milhão de cópias, incluindo dezenas de milhares expedidas para o exterior, esta edição especial da Charlie saiu em meio a uma semana de cerimônias, que culminarão no domingo (10) com uma grande manifestação em Paris.
Em 7 de janeiro de 2015, dois irmãos jihadistas semearam a morte na sede da Charlie Hebdo, em um ataque que espantou o mundo, visando um pilar da democracia, a imprensa livre. "O 11 de setembro francês", descreveu o influente jornal Le Monde.
"Vingamos o profeta! Matamos Charlie Hebdo", gritaram os irmãos Said e Kouachi Sharif, antes de fugirem depois de dizimarem a redação da publicação (oito de seus membros foram mortos, incluindo cinco cartunistas), inimigos dos islamitas desde a publicação de caricaturas de Maomé em 2011.
Quatro outras pessoas foram mortas no ataque.
No dia seguinte, outro muçulmano radicalizado, Amédy Coulibaly, matou uma policial perto de Paris. Na sexta-feira dia 9, ele atacou um supermercado judaico, matando quatro judeus antes de ser morto pela polícia.
Os irmãos Kouachi foram mortos simultaneamente no nordeste de Paris.
Em três dias, os jihadistas, que reivindicaram pertencer à Al-Qaeda ou ao grupo Estado Islâmico (EI), mataram 17 pessoas.
Em 11 de janeiro, Paris se tornou a "capital do mundo", segundo as palavras de François Hollande. O presidente francês caminhou pela capital junto a cerca de 50 líderes estrangeiros.
Fissuras
No total, quase 4 milhões de manifestantes tomaram as ruas do país, a maior mobilização popular desde o Liberation em 1944. Em Londres, Madri ou Washington, as pessoas também marcharam cantando a Marselhesa e gritando "Je suis Charlie" ("Eu sou Charlie").
Mas esta bela expressão de solidariedade não escondeu as tensões na sociedade francesa. Apesar de denunciarem a violência, alguns muçulmanos tiveram dificuldades em se solidarizar com Charlie Hebdo.
Os professores também tiveram dificuldades em impor os minutos de silêncio em homenagem às vítimas, enquanto os assassinos foram, por vezes, glorificados na internet.
A França passou a questionar seu modelo de integração. Como os jihadistas, nascidos e criados na França, chegaram ao ponto de cometer tais atos extremos? O primeiro-ministro Manuel Valls denunciou um "apartheid territorial, social, étnico" no país.
A extrema-direita acabou por se beneficiar da tensão, registrando resultados históricos nas eleições territoriais em março (25% dos votos no primeiro turno) e, em seguida, nas regionais de dezembro (quase 28%).
Uma semana depois do massacre, Charlie Hebdo publicou uma nova caricatura do profeta com uma lágrima no olho.
Do Niger à Chechênia, manifestações violentas, por vezes fatais, irromperam no mundo muçulmano.
França em guerra
Após esta "edição dos sobreviventes", da qual cerca de oito milhões de cópias foram vendidas, os sobreviventes da Charlie Hebdo ainda tentam se recuperar, lutando para lidar com seus traumas, enquanto alguns deixaram o jornal.
Em outras partes, a vida retornou para os trilhos sob vigilância: as patrulhas se tornaram a norma em locais sensíveis. Apesar destas medidas, alguns judeus preferiram partir para Israel.
E este dispositivo de segurança não impediu que o horror voltasse a acontecer. Apesar de alguns ataques terem sido frustrados (contra uma igreja no subúrbio de Paris em abril) ou limitados (em um trem Thalys, em agosto), os jihadistas atingiram um novo patamar em 13 de novembro.
Naquela noite, uma dúzia de homens atacaram de maneira coordenada um estádio de futebol, bares e restaurantes e uma casa de shows. Eles matam 130 pessoas no pior ataque já cometido na França.
Desta vez, o "espírito de 11 de janeiro" não soprou sobre o país, colocado em estado de emergência. As manifestações foram proibidas, as ações policias se multiplicaram, os ataques contra o EI - que reivindicou os atentados - aumentaram na Síria e no Iraque.
"A França está em guerra", decretou François Hollande.