Escândalo

EUA, o grande ausente dos 'Panama Papers'

EUA aumentaram consideravelmente nos últimos anos seu arsenal de luta contra a fraude e a evasão fiscal e não hesitam em impor pesadas sanções contra os infratores

Da AFP
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Publicado em 08/04/2016 às 15:32
Foto: Marcos Santos/ USP Imagens
EUA aumentaram consideravelmente nos últimos anos seu arsenal de luta contra a fraude e a evasão fiscal e não hesitam em impor pesadas sanções contra os infratores - FOTO: Foto: Marcos Santos/ USP Imagens
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Da China à Rússia, passando por Argentina, Islândia ou Reino Unido, as revelações dos "Panama Papers" atingem uma série de governantes e funcionários de alto escalão de todo o mundo, mas até o momento não incluíram o maior ator das finanças mundiais: os Estados Unidos.

Apenas um punhado de americanos foram mencionados por terem transferido uma série de seus bens a paraísos fiscais e empresas offshore com a ajuda do famoso escritório de advogacia panamenho Mossack Fonseca.

David Geffen, magnata da música e co-fundador do estúdio de cinema DreamWorks junto a Steven Spielberg, é mencionado nos "Panama Papers", mas nenhum peixe grande americano - político, grande empresário ou banqueiro - foi vinculado ao escândalo.

"Há muitos americanos, mas são simples particulares", declarou à AFP Marina Walker Guevara, diretora-adjunta do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, em inglês), que coordenou a investigação jornalística deste vazamento em massa de documentos.

Então quer dizer que os Estados Unidos são um modelo de transparência financeira? Longe disso. "Isso não quer dizer que o país está à margem do sistema offshore. É inclusive um ator importante", responde Walker Guevara.

Sua ausência nos "Panama Papers" não é uma prova de respeitabilidade e a princípio pode ser explicada por uma certa reticência em recorrer a uma país hispanófono, quando opções muito mais cômodas estão ao alcance da mão.

"Os americanos têm tantos paraísos fiscais aos quais recorrer", resume para a AFP Nicholas Shaxson, autor da obra de referência "Os paraísos fiscais. Investigação sobre os estragos das finanças neoliberais".

As ilhas Cayman e Virgens, vizinhas e anglófonas, vêm imediatamente à mente, mas os americanos que querem manter suas atividades em segredo não precisam nem mesmo procurar fora do país.

Estados como Delaware ou Wyoming oferecem, por algumas centenas de dólares, a possibilidade de criar empresas de fachada sem ter que identificar o proprietário real.

Mais grave ainda, os bancos americanos devem certamente "conhecer seus clientes", mas podem ignorar esta obrigação e abrir uma conta em nome destas empresas offshore, garantindo, assim, aos seus verdadeiros proprietários uma discrição total.

O departamento do Tesouro americano se comprometeu a corrigir estas falhas, que foram utilizadas por traficantes de armas e drogas e que valem aos Estados Unidos a terceira posição da lista de territórios mais opacos... bem à frente do Panamá, segundo a ONG Tax Justice Network.

"Estamos dando os últimos retoques a uma norma", disse à AFP um porta-voz da divisão do Tesouro encarregada da luta contra os crimes financeiros (a Fincen).

 

SANÇÕES

Outra razão, mais virtuosa, pode explicar o escasso número de americanos nos "Panama Papers".

Preocupados pelos sonoros escândalos que envolveram grandes bancos suíços, os Estados Unidos aumentaram consideravelmente nos últimos anos seu arsenal de luta contra a fraude e a evasão fiscal e não hesitam em impor pesadas sanções contra os infratores.

Resultado, segundo Shaxson: "alguns paraísos fiscais ficam aterrorizados com a ideia de ter clientes americanos porque sabem que os Estados Unidos têm a capacidade de prejudicá-los".

Os Estados Unidos se focaram particularmente nos bancos suíços, que agora aceitam os clientes americanos a contragosto por medo de incorrerem em descumprimentos e serem alvos de graves sanções.

Precisamente por ter ajudado clientes americanos a burlar o fisco, UBS e Credit Suisse foram multados com 780 milhões de 2,6 bilhões de dólares, respectivamente.
Apesar destas explicações, o escasso número de americanos envolvidos alimentou a tese de que os "Panama Papers" teriam sido orquestrados pela CIA para desestabilizar alguns países, sobretudo a Rússia.
"As autoridades russas veem a CIA por trás de qualquer um que a critique", declara Walker Guevara, que não exclui que os 11,5 milhões de documentos dos "Panama Papers" terminem por expor revelações escandalosas sobre cidadãos americanos.

"É uma massa imensa de documentos e pode haver alguma coisa oculta que ainda não descobrimos", afirma.

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