Venezuela

Oposição venezuelana aposta em sua capacidade de mobilização

Oposição ao governo de Maduro convocou novamente a população venezuelana para comparecer a novos protestos para os dias 7 e 14 de setembro

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Publicado em 02/09/2016 às 22:42
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Oposição ao governo de Maduro convocou novamente a população venezuelana para comparecer a novos protestos para os dias 7 e 14 de setembro - FOTO: Foto: STR / AFP
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A oposição venezuelana começa a se reorganizar nesta sexta-feira (2), energizada pela gigantesca marcha de quinta-feira (1º), mas enfrenta agora o enorme desafio de conseguir que sua capacidade de mobilização force as autoridades a aceitar um referendo revogatório contra o presidente Nicolás Maduro.

A opositora Mesa da Unidade Democrática (MUD) anunciou uma "nova agenda de luta" e convocou protestos para 7 e 14 de setembro, embora o órgão eleitoral tenha advertido que não se deixará pressionar.

"Foi um estrondoso sucesso, a mobilização mais importante da América Latina. Ontem (quinta-feira), fizemos história", celebrou o secretário-executivo da MUD, Jesús Torrealba, ao anunciar que já começaram a preparar as próximas manifestações.

O balanço de um e outro lado são extremos. Torrealba garante que a MUD reuniu 1,1 milhão de manifestantes, mas a chanceler Delcy Rodríguez afirma que não foram mais de 30.000.

O analista Luis Vicente León vê como normal que o governo "minimize" a marcha. Ele destacou ainda o desafio que a MUD tem pela frente.

"O desafio mais duro para a oposição é transformar sua energia potencial em energia cinética. Porque essa marcha não muda o controle institucional", opinou o analista Luis Vicente León.

Mas, "uma vez na rua", acrescentou, "a estratégia ganhadora da oposição é ficar assim: mostrar que é maioria e lembrar que é o que quer essa maioria e que não ficará tranquila até conseguir".

Segundo institutos de pesquisa como Venebarómetro e Datanálisis, Maduro enfrenta um nível de impopularidade de pelo menos 75%, e oito em cada dez venezuelanos querem mudar o governo.

Pressionados pela crise econômica, os venezuelanos fazem filas quilométricas nos supermercados para comprar produtos subsidiados e regulados, diante da escassez de alimentos e de remédios e de uma descomunal inflação. Projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI) apontam para uma inflação de 720% em 2016.

"A marcha foi impressionante. Continuamos a pressionar para ter o revogatório... É não ter medo, porque temos que sair disso. É uma luta difícil, mas vamos conseguir", disse à AFP a dona de casa Damaris Montero, de 61 anos, que contou ter participado de uma manifestação no leste de Caracas.

Apesar da insatisfação popular e do bom desempenho nas eleições legislativas de dezembro passado, as quais deram maioria parlamentar à MUD, a oposição não conseguia reunir multidões desde as passeatas de 2014. Para os analistas, isso se deve, em parte, à lembrança da violência nesses protestos contra Maduro, no qual 43 pessoas morreram.

Na marcha de ontem, destacam os analistas, a MUD rompeu uma etapa de apatia e mostrou capacidade de mobilização.

Da catarse à ação?

Acusado pela oposição de servir ao chavismo, o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) divulgou que as quatro milhões de assinaturas (20% do padrão eleitoral) necessárias para convocar o referendo serão coletadas apenas na última semana de outubro.

A data exata será anunciada pelo CNE em 13 de setembro, motivo pelo qual a MUD convocou uma marcha para o dia seguinte. O objetivo é continuar pressionando, já que o cronograma apertado complica a possibilidade de que o referendo seja realizado este ano.

"A marcha não fará o CNE mudar o programado. Se a oposição se conformar com essa mobilização, ela perde. Daí que anunciou mais ações que vão aumentando em intensidade. A soma delas pode, sim, levar o Poder eleitoral a decidir agilizar o processo", comentou o especialista em Assuntos Eleitorais Eugenio Martínez.

E o tempo urge para a oposição. Se a consulta popular acontecer depois de 10 de janeiro de 2017, quando se completa o quarto ano do mandato presidencial. Nesse caso, se Maduro perder, deverá ser substituído por seu vice-presidente, como determina a lei. Se acontecer antes dessa data, haverá nova eleição à Presidência.

"Se todos exercermos a pressão democrática, forçamos na mesma direção, dada a situação econômica e social em que vive o país. Não vai ter remédio para o governo a não ser aceitar o referendo", disse o líder opositor Henrique Capriles, em recente entrevista à AFP.

A estratégia chavista

O governo não pretende ficar de braços cruzados diante desse movimento.

Os chavistas alegam que não vão permitir que a "direita fascista" lhes tire o poder para instaurar um modelo neoliberal "leal" aos Estados Unidos.

Depois da marcha, à qual o governo respondeu com uma concentração de militantes, Maduro disse ter preparado um decreto para suspender a imunidade parlamentar. Ele acusa a maioria opositora no Legislativo de planejar um golpe de Estado.

"Maduro não queremos te derrubar, queremos te revogar", disse Torrealba.

Já o presidente do Parlamento, Henry Ramos Allup, afirmou que "equiparar um referendo revogatório com um golpe de Estado é uma loucura".

"O que aconteceu ontem?! Não foram mais de 30.000 pessoas participando". -  garantiu a chanceler venezuelana, Delcy Rodríguez, ao apresentar ao corpo diplomático as "provas da agenda violenta" da oposição.

A ministra Delcy disse ainda que, graças às detenções preventivas de dirigentes opositores, desarticulou o "golpe de Estado" que estaria sendo gestado pela oposição com a passeata.

"Estavam montando um cenário que propiciaria, além disso, a intervenção da Venezuela", completou.

O ministro do Interior, general Néstor Reverol, que acompanhou a ministra das Relações Exteriores em sua exposição, afirmou que as detenções de vários dirigentes da oposição nos últimos dias "frustraram o golpe de Estado e derrotaram a violência na Venezuela".

O governo ainda guarda várias cartas na manga. Ao acusar a oposição de fraude na coleta de assinaturas para reativar o referendo, abre 8.600 recursos legais contra a MUD, uma ação no Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) e uma petição ao CNE para inabilitá-la como ator político.

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