Os líderes ibero-americanos se preparam para discutir desenvolvimento na Guatemala, à sombra de êxodos em massa de migrantes na América Latina, que fogem da violência, da pobreza, da crise econômica e da repressão política.
Os governantes se reunirão na cidade colonial de Antigua, na Guatemala, nesta sexta-feira (16), na XXVI Cúpula Ibero-Americana, em meio à agitação regional pela saída de caravanas de migrantes centro-americanos que tentam chegar aos Estados Unidos.
"Uma Ibero-América próspera, inclusiva e sustentável" é o lema reunião, que já tem a participação de 13 presidentes confirmada, entre eles os do México e da Argentina, bem como os chefes de governo de Andorra e da Espanha e o rei espanhol Felipe VI.
Leia Também
Os presidentes de Cuba e Venezuela não anunciaram se comparecerão, segundo autoridades guatemaltecas.
"A Cúpula Ibero-Americana coincide com um momento particularmente especial para a região. Muitos dos movimentos migratórios que são recorrentes se tornaram mais visíveis", disse à AFP o analista político Erick Maldonado.
O especialista e ex-vice-chanceler da Guatemala considerou que a reunião ocorre com uma acentuação das causas que provocam fenômenos migratórios como pano de fundo.
"Estamos vendo como a retomada da violência e a deterioração das condições socioeconômicas, que são os motores que motivam a migração, continuam se manifestando", acrescentou Maldonado.
Autocrítica
Milhares de migrantes hondurenhos, salvadorenhos e guatemaltecos deixaram seus países em outubro e marcham pelo sul e centro do México em busca de novas oportunidades nos Estados Unidos.
Cerca de 8,5 mil migrantes centro-americanos integram pelo menos três caravanas que avançam no México, segundo a Comissão Nacional de Direitos Humanos deste país.
Os migrantes, entre os quais há inúmeros bebês, crianças, mulheres e idosos, tentam escapar da violência e da pobreza que atingem o norte da América Central.
Uniram-se ao êxodo nicaraguenses que fogem da repressão do governo às manifestações que pediam a renúncia do presidente Daniel Ortega. Outros encontraram refúgio na Costa Rica.
No América do Sul, pelo menos 2,3 milhões de pessoas deixaram a Venezuela desde 2015, de acordo com a ONU, diante da crise econômica e social enfrentada pela nação no governo de Nicolás Maduro.
"O empoderamento de regimes autoritários que dão pouco espaço de margem ao desenvolvimento de uma cultura democrática" na América Latina também são são algo "que motiva a migração", acrescentou Maldonado.
Sandino Asturias, do Centro de Estudos da Guatemala, considerou que os líderes da região não tiveram a capacidade de fazer uma "autocrítica" para reconhecer "o fracasso dos modelos econômicos estruturais na região", que incidem na migração forçada.
"O fenômeno (migratório) é claramente um grito desesperado de sociedades que estiveram totalmente marginalizadas e o fracasso dos governos", apontou Asturias. Diante disso, afirmou, a cúpula deve ir além das "boas intenções".
Maldonado afirmou que a reunião ibero-americana será "produtiva" se abordar integralmente o tema migratório.
"Se os governos da região forem sérios, deveriam fazer uma autocrítica, uma reflexão profunda de quais são as causas que hoje estão empurrando os êxodos em massa com as caravanas", acrescentou o sacerdote católico brasileiro Mauro Verzeletti, diretor da Casa do Migrante na Guatemala.
Criminalização
Verzeletti destacou a necessidade de ações "contundentes" para favorecer as populações mais vulneráveis e melhorar as condições trabalhistas na região.
O ativista criticou os governos da Guatemala e de Honduras, que pediram para investigar "os promotores" das caravanas de migrantes, "mas não estão investigando" se as políticas que eles mesmos adotaram "foram as melhores para frear a pobreza e a violência".
"Eu acho que o grande erro que está sendo cometido é criminalizar o fenômeno migratório; a migração é um direito", afirmou Asturias.
Ele indicou que o presidente americano Donald Trump "está chegando a medidas extremas em sua política anti-imigrante".
Trump criticou duramente as caravanas e pediu o fim da assistência econômica a El Salvador, Guatemala e Honduras se os êxodos não forem interrompidos. Também levou milhares de soldados à fronteira com o México para deter os migrantes.
"Nos preocupa muito que os Estados (latino-americanos), seguindo uma instrução proveniente de alguns governos, particularmente do governo dos Estados Unidos, tenham uma posição anti-imigrante e sobretudo xenófoba", afirmou Maldonado, indicando que a Cúpula é "uma grande oportunidade" para criar mecanismos para atacar a origem da migração.