Memória política

Livro resgata o feminismo nos tempos de resistência à ditadura

Obra que será lançada no Recife retrata a luta de mulheres contra a ditadura militar e denuncia o machismo em organizações de esquerda

Beatriz Albuquerque
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Beatriz Albuquerque
Publicado em 19/01/2014 às 6:10
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Obra que será lançada no Recife retrata a luta de mulheres contra a ditadura militar e denuncia o machismo em organizações de esquerda - FOTO: Arquivo Pessoal
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Mil novecentos e setenta. No período de repressão mais intenso da ditadura militar brasileira, logo após a instauração do AI-5, novos movimentos sociais começavam a emergir no País, entre eles o feminismo. O livro Da guerrilha à imprensa feminista – a construção do feminismo pós-luta armada no Brasil (1975-1980), escrito pelas ex-presas políticas Rosalina Santa Cruz e Amelinha Teles, retrata a luta das mulheres contra a ditadura civil e militar e em defesa da anistia dos presos políticos.

Além disso, denuncia o machismo existente dentro das próprias organizações de esquerda. O livro será lançado no Recife, nesta terça-feira (21), a partir das 18h30, na sede do SOS Corpo.

Com narrativa feminista, a história é contada a partir do relato das protagonistas e dos arquivos dos jornais Brasil Mulher (1975-1980) e Nós Mulheres (1976-1978). Além do depoimento das própria autoras, o livro traz entrevistas realizadas com outras nove feministas, como Terezinha Zerbini, Joana D’Arc e Iara Prado. O ponto de partida da obra foi a tese de doutorado de Rosalina Santa Cruz, defendida na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC), em 2004, e o livro de Amelinha, A Breve História do Feminismo no Brasil (editora Brasiliense).

A decisão de escrever um livro que retomasse a história do feminismo surgiu em 2012, quando ambas trabalhavam para implantar a Comissão da Verdade no País. “Amelinha é minha companheira de muitos anos de militância política e feminista. Ela foi editora do jornal desde o número zero e eu desde o número 5. Então, depois que defendi meu doutorado, reunimos o material de pesquisa que já tínhamos, mas fizemos um texto mais de resgate do que teórico”, explicou Rosalina.

Rosalina e Amelinha se conheceram em 1976, trabalhando como editoras do jornal Brasil Mulher. “Esse trabalho foi importante porque era difícil se manter no Brasil. Eu fui presa duas vezes, mas não queria sair daqui, porque nesse período o meu irmão estava desaparecido”, disse Rosalina Santa Cruz. Ela é irmã do pernambucano Fernando Santa Cruz, desaparecido em 23 de fevereiro de 1974. Ele, possivelmente, foi mais uma das vítimas do DOI-Codi.

A imprensa feminista representava, naquele momento, uma alternativa à imprensa oficial e, inclusive, aos jornais clandestinos da esquerda que não tratavam a questão da mulher. Temas como aborto, sexualidade livre, contracepção e inserção da mulher no mercado de trabalho eram algumas das bandeiras levantadas pelas feministas. Com o lema “o privado é político”, elas tentavam levar o cotidiano das relações de gênero para a discussão política. No Brasil, o movimento teve como base os ideais marxistas, diferenciando-se do feminismo francês e americano.

As mulheres representavam 12% dos militantes de esquerda no período de transição. Em geral, elas atuavam na conscientização política dos operários e, inclusive, na luta armada. Apesar das organizações lutarem por ideais democráticos, essas mulheres eram discriminadas pelos militantes do sexo masculino.

“O ambiente era machista. Nós rompemos com isso de forma diferente das mulheres da geração anterior, que eram mais companheiras. Nós iniciamos no movimento estudantil e participamos ativamente na luta armada”, rememorou. Para a pernambucana, a esquerda brasileira continua sendo machista. “A esquerda não é diferente da sociedade brasileira, que ainda mantém costumes muito conservadores”, avaliou.

As autoras continuam militando pela causa das mulheres e nas questões que envolvem os direitos humanos. Para o lançamento do livro no Recife, optaram pela sede do SOS Corpo – instituto Feminista para a Democracia. A organização autônoma, fundada em 1981, propõe-se a contribuir para a democratização da sociedade brasileira por meio da promoção da igualdade de gênero. O evento é aberto ao público.

SERVIÇO:


Lançamento do livro Da guerrilha à imprensa feminista - a construção do feminismo pós-luta armada no Brasil (1975-1980), editora Intermeios, de Rosalina Santa Cruz e Amelinha Teles

Terça-feira (21), no SOS Corpo - Rua Real da Torre, 593, Madalena, Recife.

Hora: a oartir das 18h30

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