Em depoimento à Polícia Federal, o executivo Júlio Camargo, da japonesa Toyo Setal, afirmou que o ex-ministro José Dirceu (Casa Civil) atuou junto ao ex-presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli e sinalizou entrada no governo da Venezuela para tratar de interesses da empresa.
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Um dos delatores do esquema de corrupção na estatal, o executivo, no entanto, negou o pagamento de propina ao petista e também ressaltou que, apesar das investidas de Dirceu, a empresa não teve interesses atendidos.
Camargo afirmou que procurou Dirceu após ser informado que a Petrobras iria alterar um modelo de contratação que beneficiava a empresa e tentou "manter os moldes" em que a Toyo era contratada pela Petrobras.
Na fala, ele conta que Dirceu disse ter feito "gestão junto a Gabrielli" no sentido de entender por qual razão a Petrobras iria mudar a sistemática.
Mesmo com a tratativa do ex-ministro, o modelo foi alterado pela estatal. Dirceu não teria dito, de acordo com ele, se manteve contato com outras pessoas sobre o caso.
Camargo disse ainda que, em outro momento procurou Dirceu para solicitar que o ex-ministro intervisse junto ao governo da Venezuela para tentar resolver problemas na execução de contratos da empresa com o país.
À PF, o executivo relatou que Dirceu indicou que conseguiria a "entrada" da Toyo com o presidente da PDVSA, estatal venezuelana de petróleo, mas o comando da japonesa não o autorizou as negociações.
Camargo contou que teve cerca de 20 encontros com Dirceu, em seu escritório ou em sua residência, e que o conheceu numa festa, quando o petista já tinha deixado o governo Lula.
O delator afirmou que "nunca ofereceu vantagens" ao ex-ministro e que, em um aniversário, deu uma garrafa de uísque e outra de vinho ao petista e que autorizou diversas viagens do ex-chefe da Casa Civil em seu avião. Camargo reafirmou que fez doações ao PT.
Para a defesa do petista, o depoimento não traz nenhum ato irregular dele, uma vez que ele não estava no governo e ainda porque as tratativas não tiveram resultado.
O ex-ministro é investigado na Justiça Federal do Paraná por suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro. A suspeita da PF é que sua empresa de consultoria prestou serviços a empresas que desviaram dinheiro da Petrobras ou se os contratos eram apenas uma maneira de disfarçar repasses de recursos do esquema de corrupção.
O juiz Sérgio Moro já determinou a quebra do sigilo bancário e fiscal da JD Consultoria e do próprio petista. A JD Consultoria faturou R$ 29 milhões em contratos com cerca de 50 empresas nos últimos nove anos, segundo informações da defesa do ex-ministro.
Sem dar detalhes, Camargo disse ainda que a Toyo tratou com o ex-ministro Antonio Palocci sobre a implementação de um fundo garantidor e que a empresa sinalizou com um contrato de consultoria com o petista caso este fundo fosse implementado para garantir as obras das refinarias Premium I e Premium II.
CUNHA
No mesmo depoimento, Júlio Camargo ainda citou três conversas que manteve com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que também é investigado na Operação Lava Jato.
O executivo disse que conheceu Cunha ocasionalmente em um hotel de luxo do Rio de Janeiro, quando ele ainda era líder do PMDB na Câmara e que trataram do setor de portos. Em 2013, o Congresso discutiu a medida provisória que regulamentou o segmento portuário no país.
Camargo disse que a empresa tinha interesses em ter investimentos na área e informou isso ao deputado.
Segundo o delator, Cunha prometeu que, se Camargo obtivesse financiamento com bancos japoneses para os projetos portuários brasileiros, ele faria "gestões" para a contratação da Toyo. O executivo ressalvou que o projeto não avançou e os dois perderam contatos.
O presidente da Câmara disse que não teve acesso ao depoimento de Camargo, mas que na época da discussão das normas para o setor de portos "todos me procuravam para orientação". "Ele, se não me engano, foi um deles".
O peemedebista afirmou que só orientou o executivo sobre as mudanças na legislação e que havia previsão para investimento do setor privado em área fora do porto. "Apenas orientei que ele tinha esse direito desde que investisse ou tivesse financiamento para isso."