Lava Jato

Moro diz ao STF que divulgação de áudios de Lula não teve motivação política

Juiz responsável pela investigação da Lava Jato admitiu ter "se equivocado em seu entendimento jurídico"

Do Estadão Conteúdo
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Publicado em 29/03/2016 às 20:41
Fábio Rodrigues Possebom/Agência Brasil
Juiz responsável pela investigação da Lava Jato admitiu ter "se equivocado em seu entendimento jurídico" - FOTO: Fábio Rodrigues Possebom/Agência Brasil
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Em ofício ao Supremo Tribunal Federal (STF), o juiz Sérgio Moro, que conduz a Lava Jato na 13ª Vara Federal de Curitiba, pediu "escusas" à Corte e disse que a divulgação de áudios do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não teve intuito "político-partidário". A manifestação foi encaminhada ao ministro Teori Zavascki, que solicitou esclarecimentos a Moro ao determinar a remessa de todo o material das conversas de Lula ao Supremo. 

"O levantamento do sigilo não teve por objetivo gerar fato político partidário, polêmicas ou conflitos, algo estranho à função jurisdicional, mas, atendendo ao requerimento do MPF, dar publicidade ao processo e especialmente a condutas relevantes do ponto de vista jurídico e criminal do investigado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que podem eventualmente caracterizar obstrução à Justiça ou tentativas de obstrução à Justiça", escreveu o juiz.

Na peça, Moro admite que pode ter "se equivocado em seu entendimento jurídico" ao dar publicidade ao material, mas comenta cada uma das gravações divulgadas e justifica sua decisão. "Ainda que este julgador tenha se equivocado em seu entendimento jurídico e admito, à luz da controvérsia então instaurada que isso pode ter ocorrido, jamais, porém, foi a intenção desse julgador, ao proferir a aludida decisão de 16/03, provocar polêmicas, conflitos ou provocar constrangimentos, e, por eles, renovo minhas respeitosas escusas a este Egrégio Supremo Tribunal Federal", escreveu Moro.

Em 31 páginas, Moro argumenta que a interceptação telefônica estava amparada na lei e tinha "foco exclusivo" nas condutas de Lula e outras pessoas que não possuem foro privilegiado. Segundo o juiz, os diálogos do ex-presidente com autoridades que possuem foro privilegiado, como a presidente Dilma Rousseff, foram "colhidos fortuitamente". A divulgação, segundo ele, só foi feita com relação ao material que possui conteúdo "jurídico-criminal relevante" por revelarem tentativas de Lula obstruir a justiça. Moro argumenta ainda que não há provas de que qualquer autoridade com foro privilegiado grampeada nas conversas tenha atendido solicitação do petista para interceder junto à Justiça.

Ele diz ter agido, na condução dos processos sobre a Lava Jato, "em geral, com cautela e prudência" e informa o STF que não havia qualquer pedido de decretação de prisão cautelar de Lula "mesmo no caso envolvendo o ex-Presidente, apesar de todo esse contexto acima exposto, de aparente intimidação, obstrução e tentativas de influenciar indevidamente magistrados". 

Na quinta-feira, o plenário do Supremo Tribunal Federal deve analisar a decisão de Teori Zavascki que ordenou que Moro remetesse o material à Corte. Ontem, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, encaminhou parecer ao STF na qual alega que a posse de Lula na Casa Civil é válida, mas pede a manutenção das investigações com Moro.

"Entendeu este Juízo que, nesse contexto, o pedido do MPF de levantamento do sigilo do processo se justificava exatamente para prevenir novas condutas do ex-Presidente para obstruir a Justiça, influenciar indevidamente magistrados ou intimidar os responsáveis pelos processos atinentes ao esquema criminoso da Petrobras", escreveu Moro. O juiz informou a Zavascki que é praxe levantar o sigilo sobre interceptações telefônicas após o encerramento das diligências, para garantir publicidade ao processo.

Dilma

Ao Supremo, Moro afirmou que não há indicativos de que as autoridades com foro privilegiado que aparecem em conversas com Lula - como a presidente Dilma Rousseff e o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa - tenham concordado com tentativas do ex-presidente de obter influência junto à Justiça.

O juiz afirmou que o foco da investigação era o ex-presidente da República e disse que "não parece que era tão óbvio assim" que o diálogo com Dilma poderia ser relevante juridicamente para a presidente. Na conversa, a presidente diz a Lula que enviaria o termo de posse como ministro da Casa Civil antes da cerimônia na qual o petista assumiria o cargo.

"Quanto ao conteúdo, da mesma forma que os demais, entendeu este julgador que ele tinha relevância jurídico-criminal para o ex-Presidente, já que presente a apuração se a aceitação por ele do cargo de Ministro Chefe da Casa Civil teria por objetivo obter proteção jurídica contra as investigações. Considerando que a investigação tinha por foco condutas supostamente criminais do ex-Presidente e o conteúdo, na perspectiva criminal, juridicamente relevante do diálogo para ele, entendi que não haveria óbice na interceptação e no levantamento do sigilo. No momento, de fato, não percebidos eventuais e possíveis reflexos para a própria Exma. Presidenta da República", escreveu Moro. 

Mais diálogos

Moro informou ao STF que há uma "quantidade bem maior de diálogos interceptados" e que não foram divulgados e permanecem em sigilo. O material será remetido "em mãos e com as cautelas devidas" ao STF, segundo o juiz. "Não seria correto, portanto, afirmar que os diálogos foram juntados ao processo sem o maior cuidado", escreveu Moro. Constam nestes áudios, segundo o juiz, conversas com outro advogado que não é investigado, além de conversas de "índole eminentemente privada". 

Sobre a interceptação de Roberto Teixeira, advogado de Lula, Moro justifica que ele é supostamente investigado por participar do processo de compra do sítio de Atibaia. "Se o advogado se envolve em condutas criminais, no caso suposta lavagem de dinheiro por auxiliar o ex-Presidente na aquisição com pessoas interpostas do sítio em Atibaia, não há imunidade à investigação a ser preservada, nem quanto à comunicação dele com seu cliente também investigado", escreveu o juiz.

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