A prisão na Bolívia de Cesare Battisti deflagrou nesse domingo (13) uma operação no governo Jair Bolsonaro para tentar cumprir a promessa de campanha do presidente de extraditar o italiano para o seu país, onde foi condenado à prisão perpétua por quatro assassinatos nos anos 1970. A ação, contudo, foi frustrada por uma decisão do governo da Itália, que enviou uma aeronave para buscar Battisti em Santa Cruz de La Sierra.
O governo brasileiro chegou a informar a vinda do preso ao Brasil antes de seguir para a Itália, mas as autoridades italianas já haviam decidido levar Battisti diretamente ao país.
Durante as eleições, Bolsonaro prometeu entregar o italiano, mas Michel Temer se antecipou e, em 14 de dezembro - um dia depois de o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux suspender uma liminar que garantia sua permanência no Brasil - autorizou a extradição.
Desde então, Battisti permanecia foragido e seu nome foi incluído no alerta vermelho da Interpol. Na tarde de sábado ele foi abordado por policiais bolivianos enquanto caminhava em uma via pública de Santa Cruz de La Sierra. Estava de cavanhaque e óculos escuros. Para ser enviado à Itália, o governo boliviano decretou a saída obrigatória de Battisti, o que equivale à deportação no Brasil.
No domingo pela manhã, Bolsonaro foi às redes sociais comemorar a detenção. O presidente se colocou à disposição dos italianos e convocou uma reunião de emergência com os ministros da Justiça e da Segurança Pública, Sérgio Moro, das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, e do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno. O Itamaraty e a Justiça informaram, em nota conjunta, que estavam "tomando todas as providências necessárias", em cooperação com os governos da Bolívia e da Itália "para cumprir a extradição de Battisti e entregá-lo às autoridades italianas".
O governo Bolsonaro deixou à disposição um avião da Polícia Federal (PF) para trazer o italiano de volta ao País. A aeronave da PF foi deslocada a Corumbá (MS), na fronteira com a Bolívia, e ficou à espera.
Heleno afirmou, ao fim do encontro no Palácio da Alvorada, que Battisti passaria, em princípio, pelo Brasil e que faltava apenas um acerto sobre detalhes do voo. A rota e o horário ainda não estavam definidos. Por falta de autonomia para chegar à Europa, Battisti trocaria de avião em território brasileiro.
Recusa
O governo italiano, porém, já havia decidido levar Battisti diretamente ao país e enviou uma aeronave para buscá-lo em Santa Cruz de La Sierra. A informação veio a público por meio do presidente do conselho de ministros da Itália, Giuseppe Conte. O premiê disse ter telefonado para Bolsonaro e agradecido a colaboração do Brasil. O presidente da Itália, Sergio Mattarella, pressionou publicamente para que o preso fosse apresentado "imediatamente à Justiça do país".
O ministro da Justiça da Itália, Alfonso Bonafede, afirmou que o voo direto, sem passar pelo Brasil, permite que Battisti cumpra a pena completa a que foi condenado pelos homicídios: a prisão perpétua. Battisti provavelmente ficará preso na prisão de Rebibbia, próxima a Roma, disse o ministro.
Caso ele fosse enviado pelo Brasil, seriam impostas as regras do acordo de cooperação para extradição entre os dois países, que segue limites fixados com base nas leis brasileiras e na Constituição de 1988.
O STF só autoriza a entrega de foragidos detidos no Brasil caso o país estrangeiro, que requer a extradição, se comprometa a não aplicar a prisão perpétua, nem a pena de morte e ainda limitar o tempo máximo de prisão a 30 anos, como vigora no País com base no Código Penal.
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O procurador Vladmir Aras, ex-secretário de Cooperação Jurídica Internacional da PGR, disse que a pena na Itália é perpetua, mas, como em todos os países da Europa que a possuem, há um dever de revisão obrigatória após um máximo de 25 anos. "A pena tem de ser revista depois de 26 anos. Aí o réu pode obter livramento condicional. Fica mais 5 anos sob liberdade vigiada. Se tiver bom comportamento, a pena fica extinta."
No fim da tarde, em nota divulgada pelo Ministério da Justiça, o governo brasileiro confirmou a transferência direta da Bolívia para a Itália e afirmou que o importante era Battisti responder pelos seus crimes.
Operações
O STF determinara a prisão cautelar, mas Battisti escapou do País. Uma das suspeitas da PF, que fazia buscas pelo foragido desde então, era de que ele havia encontrado abrigo nas embaixadas da Venezuela ou da Bolívia, por causa da orientação política de esquerda dos presidentes Nicolás Maduro e Evo Morales.
Battisti fez um pedido de asilo ao governo do presidente da Bolívia três dias depois de Temer assinar o decreto de extradição. No documento, o italiano vinculou sua fuga à eleição de Bolsonaro e ao que chamou de "nefasta coincidência" da chegada ao poder de dois governos de "ultradireita" no Brasil e na Itália.
Em 21 de dezembro, durante divulgação do balanço anual das atividades da PF, o então diretor-geral Rogério Galloro informou que já haviam sido realizadas cerca de 30 operações em busca de Battisti. À época, o chefe da PF afirmou que ele seria encontrado de qualquer forma devido à cooperação entre forças policiais brasileiras e internacionais. Para tentar encontrar o italiano, a PF chegou a ir endereços de antigos amigos, em embaixadas e procurou seus rastros em um barco na região amazônica.
Fugas
O italiano deixou seu país após ser condenado por quatro assassinatos cometidos entre 1977 e 1979. Em 1981, foi para a França e, no ano seguinte, partiu para o México. Em 1990, voltou à França e, em 2004, Battisti chegou ao Brasil, onde foi preso em 2007. Entretanto, no último dia de governo, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva concedeu asilo político a Battisti e evitou sua extradição.