Cem dias é pouco tempo para qualquer gestão. Mas, mesmo sabendo disso, o atual presidente, Jair Bolsonaro (PSL), já assumiu anunciando, no último dia 23 de janeiro, que tinha 35 metas para implantar em 100 dias. Na economia, o principal foco do governo começou a tramitar nos últimos dias, com as discussões em torno do projeto de reforma da Previdência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados.
O primeiro avanço efetivo na Casa veio nesta terça (9) depois de várias horas de tumultos e bate-bocas na CCJ. Ao longo de mais de quatro horas, a bancada oposicionista fez uma série de manobras de obstrução da sessão para impedir a leitura do parecer do deputado Marcelo Freitas (PSL-MG). Mas, no final, o relator acabou apresentando seu parecer pela admissibilidade total da Proposta de Emenda à Constituição (PEC). Ou seja, para o deputado, não há nada no texto que fira a Constituição, e a proposta pode tramitar normalmente no Congresso.
O projeto é a grande aposta do presidente e do ministro da Economia, Paulo Guedes, para dar sustentabilidade política e econômica para cumprir os quatro anos de mandato. “Dentre elas (as metas), poucas foram cumpridas. E, mesmo as que foram implementadas, não representaram ganhos expressivos para a sociedade”, resume um dos consultores legislativos mais respeitados de Brasília, Luiz Alberto dos Santos, sócio da Diálogo Institucional e Análise de Políticas Públicas.
Das 35 metas, sete foram implantadas; uma foi cumprida em parte; dez estão em curso e 17, pendentes, segundo levantamento feito pelo consultor até o dia 30 de março. Elas vão desde uma simples prorrogação do prazo de validade das Declarações de Aptidão (DAPs) do Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf) – que foi cumprida – até a revisão do pagamento de aposentadorias indevidas do INSS ou a independência do Banco Central (BC). “Algumas das metas são inexequíveis no prazo apresentado, como é o caso da independência do BC”, resume Luiz Alberto.
A chegada da proposta de reforma da Previdência ao Congresso, segundo três economistas consultados pelo JC, é uma boa notícia. “Discutir uma reforma da Previdência era uma necessidade antiga no Brasil. Concordando ou não com a proposta, essa discussão sinaliza que o País vai começar a andar de novo”, resume a professora de economia do Insper Juliana Inhasz.
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Dificuldades
O déficit da Previdência é apontado pelos especialistas como um dos fatores que levam ao desequilíbrio das contas da União. O País é como uma família; quando gasta mais do que ganha, perde a capacidade de investir, planejar e até de crescer por causa do alto endividamento.
Também é visto como positiva a continuidade dos processos de concessões desenhados no governo do ex-presidente Michel Temer (MDB). “Houve leilões de sucesso em aeroportos e portos de responsabilidade da Secretaria de Parcerias de Investimento da Presidência da República (PPI). Um órgão criado no começo do governo Temer, que Bolsonaro teve a sensatez de preservar, mantendo e reforçando a boa equipe que havia lá, e que deu sequência ao que já vinha preparando. Na área de privatizações, a boa notícia é da última sexta-feira (5): a venda de uma grande subsidiária de gás da Petrobras. Agora acabou a herança positiva. O governo novo vai ter de mostrar a que veio. As equipes são boas. A liderança do presidente é que ainda é uma incógnita”, resume o professor da FGV Direito SP Carlos Ari Sundfeld, especialista em concessões.
O Aeroporto do Recife está entre os que foram a leilão em março último e vai passar a ser administrado pela empresa estatal espanhola Aena. O bloco Nordeste, com seis terminais, foi arrematado por R$ 1,9 bilhão. “Essas concessões vão demandar novos investimentos em construção, equipamentos, e isso é bom para a economia”, argumenta o professor de economia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Ecio Costa.
“Até agora, a atual gestão ficou em cima da reforma da Previdência. Não houve nenhuma medida importante de médio ou curto prazo na área econômica. A falta de articulação política e os comentários tolos do presidente, da sua família e de alguns ministros geraram desgastes que afetaram a economia”, explica o sócio-diretor da Ceplan Consultoria, Jorge Jatobá.
Ele se refere ao fato que o País entrou em 2019 com a expectativa de crescimento de 3% do Produto Interno Bruto (PIB). Em março, analistas revisaram para cerca de 2%. “As expectativas que alimentam a economia são formadas também a partir das propostas do governo, sua execução e articulação política”, conclui Jatobá.