ENTREVISTA

'Combate à lavagem ficaria prejudicado', diz presidente do Coaf

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, proibiu o compartilhamento de informações de órgãos de controle sem aval de Justiça

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Publicado em 31/07/2019 às 12:37
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O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, proibiu o compartilhamento de informações de órgãos de controle sem aval de Justiça - FOTO: Foto: Reprodução/Redes Sociais
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O presidente do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), Roberto Leonel, considera que o sistema de combate à lavagem de dinheiro no País está comprometido. Na primeira entrevista após a decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, de mandar parar investigações que se apoiem em informações bancárias e fiscais compartilhadas por órgãos de controle, Leonel disse que há impactos concretos no trabalho do conselho.

Pela decisão de Toffoli, qualquer informação mais detalhada precisa de aval da Justiça. "Apenas a movimentação global não é útil na maioria dos casos", afirmou o chefe do Coaf.

Confira a entrevista com Leonel:

No recurso que apresentou ao STF, a Procuradoria-Geral da República argumenta que a decisão de Toffoli desmantela o sistema de lavagem de dinheiro no País. O sr. Concorda?

Não cabe ao Coaf questionar decisões judiciais. No entanto, não há como negar a preocupação com o impacto imediato da decisão liminar e, principalmente, caso seja mantida no julgamento de mérito. Nesse cenário, a efetividade do sistema brasileiro de prevenção e combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo, que tanto evoluiu nos últimos anos, ficaria sensivelmente prejudicada.

É possível dimensionar a quantidade de casos que podem ser anulados com a restrição imposta pelo Supremo?

O Coaf não tem acesso direto ou controle sobre os processos judiciais, inquéritos e procedimentos de investigação criminal objeto da suspensão determinada pelo STF. Assim, não temos como mensurar a quantidade de casos impactados. No entanto, para dar uma ideia do volume de informações produzidas pelo Coaf, apenas no ano de 2018 foram produzidos e enviados às autoridades competentes 7.345 Relatórios de Inteligência Financeira (RIFs). Nos últimos cinco anos, foram mais de 27 mil relatórios.

Será preciso fazer adaptações para que o Coaf continue realizando seu trabalho?

No âmbito interno, o Coaf continua recebendo normalmente as comunicações de operações suspeitas e em espécie dos setores obrigados a informar. Da mesma forma, continua analisando todas as informações recebidas, sem alteração em seus procedimentos. Quanto à disseminação de informações provenientes do sistema financeiro, por precaução, solicitamos a análise de nosso assessoramento jurídico, uma vez que a decisão do Supremo Tribunal não traz determinações específicas para o conselho.

Relatórios globais são suficientes para subsidiar pedidos de quebra de sigilos bancários ou fiscais? Pelo que a Procuradoria afirma, não são.

Para tentar ilustrar como apenas a movimentação global não é útil na maioria dos casos, imagine, por exemplo, um supermercado popular, cujo perfil seja de vendas principalmente em dinheiro. No entanto, os recursos financeiros que chegam na conta bancária da empresa são oriundos de transferências eletrônicas. Isso não é normal. Seria esperado que a conta recebesse depósitos em dinheiro. O que pode estar ocorrendo, por exemplo, é a venda de reais para doleiros. A movimentação global não demonstraria essa realidade.

Tem mais exemplos?

Outro caso que pode ser afetado é quando um banco faz a comunicação de operações suspeitas em que relata que o cliente em questão pode ser um "laranja". (O cliente) Consta como diretor de uma empresa, movimenta valores expressivos, mas não demonstra conhecer detalhes do negócio nem de suas operações.

E no caso de identificação de movimentações financeiras do tráfico de drogas? Como essa decisão afeta o trabalho?

Há um tipo de situação simples, mas de grande relevância para a sociedade, que também pode ser citada como exemplo: comunicações de operações suspeitas relatando a fragmentação de saques ou depósitos em espécie, também conhecida como "smurfing", técnica muito utilizada pelo narcotráfico.

Como isso funciona?

Nesse caso, uma única operação de alto valor é fracionada em pequenas operações realizadas no mesmo dia ou em dias próximos. Isso é feito para tentar evitar que a instituição financeira envie uma comunicação automática devido ao valor em espécie ou que seja obrigada a identificar o portador dos recursos. A comunicação poderia ainda estar enriquecida com detalhes como o fato de as cédulas depositadas estarem úmidas ou com forte cheiro, reforçando os indícios dessa tipologia clássica. Nessa situação, a análise apenas do montante global não permitiria a identificação dessa prática.

Procuradores afirmam que a decisão afeta compromissos assumidos pelo País com organismos internacionais. Qual a consequência?

Uma eventual avaliação do Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo (Gafi) de que o Brasil teria deixado de cumprir recomendações do órgão poderia fazer o País ser considerado internacionalmente como uma jurisdição que não tem uma estrutura efetiva de prevenção e combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo, o que aumentaria a percepção de risco de outros países ao fazer negócios com o Brasil, encarecendo transações e dificultando a obtenção de crédito internacional.

A Operação Spoofing usou relatório do Coaf sobre movimentações de suspeitos de hackear dados de autoridades. Foi respeitada a decisão de Toffoli?

O Coaf não comenta casos específicos.

O julgamento do mérito no Supremo está marcado para novembro. Para o sr., deveria ser antecipado?

Seria importante para a segurança jurídica e o bom andamento dos trabalhos que houvesse uma decisão definitiva do STF com a maior celeridade possível.

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