O debate vai esquentar nesta quarta-feira (25) quando os senadores devem fazer uma sabatina na Casa Alta com o subprocurador Augusto Aras, indicado pelo presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), ao cargo de Procurador-Geral da República, um dos mais importantes postos do Brasil. Desde 2003, é a primeira vez que o indicado não é escolhido entre os que estão numa lista tríplice elaborada pelos membros do Ministério Público, o que já gerou críticas. “Não há ilegalidade na escolha, mas é salutar o respeito à lista tríplice da categoria, porque isso indica, no mínimo, um voto de confiança da classe”, resume o presidente da Associação dos Magistrados de Pernambuco (Amepe), Emanuel Bonfim.
"É atribuição do chefe do Estado, que é o presidente da República, nomear o Procurador Geral da República (PGR). Isso, em princípio, não é um problema. No entanto, a escolha do PGR via lista tríplice trouxe um fortalecimento da classe, um protagonismo dos procuradores", resume o advogado Delmiro Campos.
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Mas por que o cargo é importante? Ele é o chefe do Ministério Público Federal e exerce as funções do MPF junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Isso significa que a opinião dele é escutada nas duas instâncias mais altas da Justiça brasileira. “O Procurador-Geral da República é o fiscal da lei, titular de uma ação penal. Ele tem a autoridade para determinar se um crime vai ser investigado pela polícia ou não, entre outras atribuições”, explica Emanuel Bonfim.
Para Emanuel, o Procurador-Geral da República deve ter independência e capacidade técnica, além de ser despido de viés ideológico para cumprir suas funções. É aí que a indicação de Augusto Aras dividiu o meio político. Os políticos do PSL o consideram de "esquerda" porque no passado Aras chegou a defender posições de políticos petistas. Posição mais moderada tem o líder do DEM na Câmara, o deputado federal Elmar Nascimento, da Bahia, que considerou o nome dele uma garantia de um "PGR republicano com olhar na Constituição, uma excelente escolha".
Já na esquerda, a queixa é o fato do indicado ser simpático a pauta de costumes conservadora defendida pelo presidente Jair Bolsonaro. "Aras tem se posicionado com algumas posições contrárias à nossa. Nós somos a favor da criminalização da homofobia, do direito à união civil para pessoas do mesmo sexo, da adoção de crianças por esses casais", diz o senador Humberto Costa (PT-PE).
Aras chegou a dizer a veículos do Sul do País que é contra a criminalização da homofobia. A violência contra os homossexuais é um grande problema no Brasil. "Vamos ver como vai ser a postura dele na sabatina. O Senado pode recorrer ao Supremo Tribunal Federal que pode julgar os atos dele, caso ocorra um equívoco", acrescenta o senador Humberto Costa.
O impasse que se formou em torno do nome de Aras fez a ex-Procuradora-Geral da República Raquel Dodge pedir, há duas semanas, para "preservarem a democracia" no seu último discurso, quando visitou o STF ainda no cargo.
"A democracia é uma obra coletiva, da sociedade, das instituições... Nós levamos 30 anos para erguer a democracia e fizemos isso numa onda internacional de criação da democracia em vários países", disse Raquel à Folha de S.Paulo.
Na semana passada, Augusto Aras começou a visitar os senadores da oposição prometendo isenção na sua futura atuação. Na sabatina da Casa Alta, ele vai precisar dos votos de 41 senadores – do total de 81 – para ser efetivado no cargo.
"Nos últimos anos, a PGR ganhou uma independência e um grau de atuação nunca visto na história do País. Vamos descobrir, nos próximos dois anos, se fez diferença escolher um PGR que não estava na lista tríplice", conclui Emanuel.
O que faz o Procurador-Geral da República?
O que faz o Procurador-Geral da República (PGR)?
É o chefe do Ministério Público Federal (MPF) e exerce as funções do MPF junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), no Superior Tribunal de Justiça (STJ), sendo também o procurador-geral Eleitoral. O PGR deve sempre ser ouvido em todos os processos.
Como ele atua nos tribunais superiores?
No STF, o PGR pode propor ações diretas de inconstitucionalidade, representação para intervenção federal nos Estados e no Distrito Federal, além de propor ações penais públicas e cíveis. No STJ, o PGR pode propor representação pela federalização de casos de crimes contra os direitos humanos e ação penal.
Os últimos procuradores gerais da República indicados através da lista tríplice
-Raquel Dodge (2017 a 2019)
Atuou nas áreas criminal, defesa de direitos humanos, meio ambiente e patrimônio público, índios e minorias (demarcação de terras, resolução de conflitos, construção de escolas, saúde indígena), consumidor e ordem econômica, além da eleitoral. Foi indicada pelo presidente Michel Temer (MDB).
- Rodrigo Janot (2013 a 2017)
Desempenhou atividades na área do meio ambiente e dos direitos do consumidor da Procuradoria Geral da República. Foi presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), em mandato eletivo, de maio de 1995 a maio de 1997 e , por três vezes, atuou como conselheiro do Conselho Superior do MPF. Foi indicado pela presidente Dilma Rousseff (PT).
- Roberto Gurgel (2009 a 2011; 2011 a 2013).
Atuou na área de meio ambiente e patrimônio cultural. Integrou a Diretoria da ANPR, a partir de 1984, tornando-se presidente dessa associação de junho de 1987 a junho de 1989. Foi nomeado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
- Antonio Fernando (2005 a 2009)
Ele venceu a votação realizada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e encabeçou lista tríplice enviada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
- Cláudio Fonteles (2003 a 2005)
Católico e membro leigo da Ordem de São Francisco. Foi membro da Ação Popular, movimento estudantil ligado à esquerda católica que comandou a UNE na década de 60. Foi indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Radiografia dos Ministérios Públicos*
Ministérios Públicos Estaduais (26 estados): 12.298 membros e 31.309 servidores
Ministério Público do Distrito Federal e Territórios: 389 membros e 1.789 servidores
Ministério Público Federal: 1.135 membros e 9.036 servidores
Ministério Público Militar: 79 membros e 433 servidores
Ministério Público do Trabalho: 782 membros e 3.051 servidores
*Dados são do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP)