Nesta entrevista ao JC, Roberto Magalhães defendeu a reforma política, com o fim da reeleição e o voto distrital. Também disse que não é hora para o impeachment de Dilma e afirma não ver como o DEM se fundir com o PTB. E acredita que a corrupção na Petrobrás é um caso bem mais grave que o Mensalão
JORNAL DO COMMERCIO - O senhor acha que há clima hoje para fazer uma reforma política no Brasil?
ROBERTO MAGALHÃES - De imediato, talvez não haja clima. Mas o presidente da Câmara já desengavetou o projeto que foi aprovado no Senado. E como durante 11 meses a Comissão de Justiça não deu parecer, ele requisitou o prejeto e levou a plenário e criou uma comissão provisória, que já está instalada. Ele deu uma entrevista que me deixou impressionado. Ele se mostrou entusiasmado. Quer tirar da gaveta o Pacto Federativo, a Reforma Tributária. Se isso acontecer, vamos ter um debate a nível de uma Assembleia Constituinte. Vai ser realmente um acontecimento. Eu diria que é uma necessidade urgente que se faça a reforma política, a começar pelo aperfeiçoamento do sistema eleitoral. Porque o sistema eleitoral se constitui um dos fatores que alimentam a corrupção no País, porque cada dia é mais cara a corrupção. Eu li no jornal, até gostaria de saber se é verdade, que o marketeiro de Dilma recebeu de R$ 70 milhões de honorários pela campanha. Na hora que fica caro, quem é que tem dinheiro para pagar isso? Ninguém tem, mas tem que ter alguém para financiar. E ninguém financia, salvo quando é uma coisa pequena, por amizade, etc, mas determinados valores, ninguém vai contribuir sem ter alguma vantagem, ou obtida ou em perspectiva.
JC - De acordo com o perfil que o senhor vê hoje no Congresso, que tipo de reforma política podemos esperar?
MAGALHÃES - Todos que estão lá se elegeram nesse sistema absolutamente superado e indutor da corrupção. Por maior que seja a vontade e o prestígio de Eduardo Cunha dentro da Câmara, todos que estão lá, deputados e senadores, se elegeram nesse sistema. Eu não quero com isso dizer que todos são corruptos, não. Mas sem dinheiro ninguém se elege mais nesse País. Mudou muito entre o Brasil e a Política de 1982, quando eu me elegi governador com o voto direto, e outras eleições que participei, até 2010, houve uma mudança muito grande, tudo ficou muito caro. Os votos de independência, aquele voto, eu por exemplo, das quatro eleições de deputado, em três eu tive mais de 200 mil votos, a maioria no Recife e no Grande Recife. Inclusive nas duas últimas eleições minhas, não tive nenhum prefeito, nenhum vereador, nada. Porque não tinha dinheiro. Você para ter um prefeito, vai ter que colaborar com um dinheiro para a eleição dele. Vereador a mesma coisa. Então, você ter 10, 15 municípios, é muito dinheiro. Como todos se elegeram nesse esquema, é difícil uma maioria para reverter todo esse processo. Quais seriam as formas de reverter? Você tem que alterar o sistema de voto. Hoje é o voto proporcional e com lista aberta. Vai se estender a deputados que não se elegeram, aí você tem acumula votos para outro candidato, com as sobras. O primeiro problema é esse e está geminado com outro. Além de haver as sobras, você vota em um e elege outro, tem o problema o agravante das coligações proporcionais. Os pequenos partidos ou se tornam caminho para os poucos votados, aí junta para um que é o dono do partido, ou no máximo três, ou através da coligação com um grande partido. Tudo isso vai distorcendo o processo. Qual é a solução? O PSDB defendia o voto distrital, com o Estado todo dividido e deputados federais e estaduais votados por distritos. No voto distrital, o voto não é proporcional, é majoritário. Você se candidata pelo município e se elege por ele. Recife não teria menos de 20 municípios, pela população. Em Pernambuco, os distritos devem ficar muito grandes. Mas há de se encontrar uma fórmula. A maioria dos países desenvolvidos têm o voto distrital, como Inglaterra, França, Estados Unidos. As propostas para melhorar essa situação são: primeiro, o voto distrital. Porque aí vai ficar mais barata a eleição ou menos cara. A segunda proposta, meu partido já defendeu e o PT já defendeu, mas perdemos em duas legislaturas. A Câmara não aceitou nem a lista fechada dos deputados e nem o financiamento público. A lista de voto fechado, o que é isso? A conveção do partido elege que vão participar da lista e o voto é no partido que vai beneficiar todos. Embora haja também a possibilidade da lista fechada flexível, em que se vota nos candidatos e os mais votados vão ficando na frente. Mas há também uma proposta que defendo desde que me tornei deputado, em 91, que é o modelo alemão de pós-guerra, ainda no tempo da Alemanha Ociental. É o voto distrital misto. Acho que esse não há o que discutir. Eu não porque não está instalado no mundo inteiro. Você tem a solução elitista do voto partidário buscando elegeruma elite e ao mesmo tempo tem o voto eminetemente popular, que é o voto distrital. Metade eleita pelo voto distrital e metade eleita pelo voto nominal. O mais importante é que o no voto distrial, o eleitor tem dois votos. Ele vota no candidato distrital de sua escolha e vota na lista de qualquer partido. Agora o PSDB, que era pelo voto distrital, está defendendo o voto distrital misto.
JC - E sobre a reeleição?
MAGALHÃES - O primeiro item de uma reforma política seria acabar com a reeleição de presidente. Quem criou isso foi Fernando Henrique e, na minha opinião, infelicitou o País. Os candidatos chegam e ficam no primeiro mandato cuidando da reeleição. Por que estamos pagando a gasolina cara? Porque dona Dilma não queria que a classe média que tem automóvel ficasse sem gasolina contra ela. SEmelhante também foi o problema na energia, que quis baratear e deu no que deu. Estamos pagando o buraco que ficou. Para moralizar tem que acabar a reeleição de presidente da república. Eu acho difícil, mas se por acaso houver a infelicidade de manter a reeleição, que pelo menos não seja no cargo, tenha que sair e se descompatibilizar.
JC - Então, manteria a reeleição para governador e prefeito?
MAGALHÃES - Não, tem que acabar com tudo. Eu acho que tem que ser como era na Constituinte de 1946. Presidente cinco anos e deputado, quatro anos. Mas eu acredito que possa dar cinco para todo mundo. Eu sou pela coincidência eleitoral. Do ponto de vista do gasto das eleições, é uma barbaridade. Você sai de uma eleição e já está em outra.
JC - O senhor sempre foi contra a reeleição?
MAGALHÃES - Sempre.
JC - E por que o senhor disputou a reeleição quando foi prefeito do Recife?
MAGALHÃES - Disputei porque existia, eu era o mais forte. Tem uma coisa: eu me afastei por dois meses, passei para Raul Henry. Fiquei dois meses afastado da Prefeitura. Não entendia que estava certo de manhã estar na rua e de tarde e de noite ficar despachando. A força de um Executivo é muito grande.
JC - Qual sua opinião sobre o financiamento público da campanha?
MAGALHÃES - Não ainda ser a favor nem contra. Eu fiz muitas palestras e o povo é unanimimente contra o financiamento público dizendo que é um absurdo o povo ter que pagar a campanha de tanta gente que eles não conhecem e que na maioria não tem sequer, para eles, acredibilidade que é necessário. Então, está condenado pela vontade popular. Eu acho que é perder tempo. O PT tá doido por isso, porque o partido quanto mais organizado e maior, mais beneficiado. O dinheiro, o poder público já gasta com eleição uma fábula. Tem o fundo partidário que os partidos recebem. Não vejo possibilidade de ser aprovado.
JC - O senhor é a favor do Impeachment da presidente Dilma?
MAGALHÃES - Eu votei contra Dilma ano passado, em Marina e depois em Aécio. Agora, está mais difícil resgatar a credibilidade e o respeito do governo e reerguer a economia do País. A questão do impeachment poderá ser uma hipótese se o País continuar adernando, mas só o futuro dirá. O Impeachment nasce nas ruas e não se viabiliza se não tiver o apoio da opinião pública.
JC - O senhor compara o caso da Petrobrás ao do Mensalão? Qual o mais grave?
MAGALHÃES - Eu acho que isso que aconteceu com a Petrobrás, os comentaristas e articulistas, cientistas políticos, esse Petrolão é uma reedição do Mensalão. O Petrolão é muito mais grave que o Mensalão. Começa logo pelo volume. Tudo que foi arrecadado no Mensalão foi R$ 130 milhões. Só um dos que fizeram a delação premiada, transferiu R$ 182 milhões. Foi mais do que todo o Mensalão.
JC - Acredita em punição para os envolvidos?
MAGALHÃES - A dona Dilma está fazendo a leniência com as empresas. Ela vai soltar essas empresas todas, elas vão pagar uma multa e pronto. Inclusive, na minha opinião, atropelando o Judiciário.
JC - Como o senhor vê a relação de Dilma com o Congresso?
MAGALHÃES - A não ser que ela continue com a rejeição que tem atualmente perante o povo brasileiro, porque político, que não tem apoio popular, que não tem voto, é praticamente um leproso. Se ela não conseguir equilibrar as finanças, ela vai ter muita dificuldade com o Congresso. Mas se ela for aos poucos ajeitando... Por que é que ela tem 39 ministros? Para poder contemplar os partidos e conseguir apoio. Não é para oura coisa não. O problema é que, com exxecção da nomeação de um ministro (Joaquim Levy, da Fazenda) que tem as ideias defendidas por Aécio Neves na campanha, e que está aí tentando equilibrar a economia, ela continua o mesmo.
JC - Ela pode melhorar essa relação? Reentemente, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), devolveu uma medida provisória.
MAGALHÃES - Mas logo depois aprovou vários vetos, inclusive um contra o Nordeste. O Congresso recentemente prorrogou o Fórum de Desenvolvimento criado pelo Marechal Castelo Branco nos anos 60, a Zona Franca de Manaus, foi prorrogada por 50 anos. E logo depois fizeram outro prorrogando os benefícios para as indústrias automobilísticas do Nordeste por 40 anos. Aprovaram a do Amazonas, mas desaprovaram a de Pernambuco, que também beneficiariam os outros Estados.
JC - O senhor faz parte de um partido que já foi um dos maiores do País, mas hoje está diminuído. Como vê essa expectativa de fusão com o PTB?
MAGALHÃES - Não acredito na fusão com o PTB. Eu já fui do PTB, fui presidente do PTB de Pernambuco, quaando deixei meu partido após a derrota para senador em 86. E depois fui de novo, fui de novo com um grupo com Armando Monteiro, José Múcio, Piaulyno, José Chaves e Joaquim Francisco, inclusive, eu era eleito pelo PSDB, eu Zé Múcio e Piauilyno. Propus, em nome dos seis, irmos todos para o PSDB, mas Sérgio Guerra vetou e o partido decidiu ficar com Sérgio Guerra. Até fiquei muito contrariado. Puxa, eu não valho mais do que seis? Na minha visão, cada partido tem o seu perfil, alguns até têm ideologia, doutrina. Por que o DEM sempre se coliga com o PSDB? Porque nós somos próximos.
JC - O senhor é a favor de uma fusão com o PSDB?
MAGALHÃES - Não porque a gente desparece, somos muito pequeninhos. Aí não será fusão, será incorporação. A gente dilui. Eu acho que o perfil do PTB não é exatamente o perfil do DEM. Tanto que as posições no Congresso não muito próximas. O DEM é oposição e o PTB é situação.
JC - Veria algum partido com o qual o DEM poderia se fundir?
MAGALHÃES - Eu ainda nem pensei, até agora eu destinei um minuto de minha massa cinzenta para pensar nisso. Porque nessa altura da vida, o DEM deve buscar o que for melhor para ele. Se eu concordar, eu fico. Se não concordar, fico sem partido. Eu não tenho mais futuro político, já encerrei minha carreira.
JC - O senhor defende a cláusula de barreira?
MAGALHÃES - Claro que defendo. Ela já foi aprovada. E foi aprovada com prazo de dez anos para vigorar. Quando chegou no décimo ano, alguns partidos pequenos com pessoas de prestígio fizeram um trabalho junto do Supremo Tribunal Federal e foi derrubada a lei. Mas eu acho que volta.
JC - Até que ponto esse crescimento da oposição e a fragilização do governo pode influenciar na eleição de 2016?
MAGALHÃES - Eu não tenho opinião formada sobre isso. Tanto poderá ocorrer um movimento de fusões partidárias, como poderá ocorrer muita divisão, sobretudio na base do governo. Acho que a base do governo petista, que está com 12 anos, nunca esteve tão pouco homogênea e unida como agora. Isso tem que acontecer, porque há uma coisa chamada fadiga do tempo. Isso acontece nas relações humanas também. Um giverno de muito tempo cansa. É muito imprevisível, quando se trata de uma eleição proporcional é mais fácil, mas uma eleição majoritária é imprevisível. Há aquelas lideranças dominantes, mas mesmo essas cansam. Há uma fadiga.