ENTREVISTA

Paes Landim: "A extinção da Sudene foi um ato cruel"

Um dos poucos integrantes do PSB que ainda continua no governo federal, superintendente da Sudene acusa a falta de vontade política para recriação da autarquia

Ayrton Maciel
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Ayrton Maciel
Publicado em 16/03/2014 às 6:00
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Cota do PSB no governo federal, indicado pelo governador do Piauí, Wilson Martins, e no cargo desde maio de 2013, o superintendente da Sudene, Luiz Gonzaga Paes Landim, acusa a falta de vontade política e de unidade dos líderes da Região de não justificar a recriação da Sudene. Afirma ainda que a extinção do órgão teve motivação política.

JORNAL DO COMMERCIO – A Sudene recriada é só uma sombra da Sudene de Celso Furtado?
PAES LANDIM –
Pela ausência de elementos constitutivos da vontade política nordestina, essa recriação (2007) até hoje não justificou seus fins. A má vontade do governo federal com a Sudene fez com ela chegasse à extinção. Para isso, dividiu os governadores do Nordeste, para não ter que enfrentá-los conjuntamente. Quebrou a noção de unidade regional. Isso começou no governo Fernando Henrique Cardoso e se acentuou nos demais governos (Lula e Dilma). Este é um País de falsos consensos. Há um recrudescimento das disparidades (regionais). Algo precisa ser feito. Ou se faz a mobilização política para que a Sudene possa articular os governadores e se redefina o pacto federativo ou corremos sério risco de sermos condenados ao subdesenvolvimento.

JC – Isso é resultado da disputa política regional?
LANDIM –
É falta de mobilização política, é o esgarçamento da vontade política dos governadores e políticos da Região, que baixam a cabeça. Não se unem, não usam a sua força política para se contrapor às forças econômicas daqueles que querem o Nordeste como reserva de mercado de seus produtos (industrializados) e dos seus interesses. Só o Ceará importa de São Paulo 40% de tudo que consome. Então, se não for mudada a sistemática de ICMS, se não for feita a diferenciação de taxas de juros, não atrairemos investidores.

JC – A Sudene idealizada seria indutora do desenvolvimento. Por que fracassou?
LANDIM –
Ela foi indutora. Agora, o Brasil, como outros países, foram engolfados pela onda neoliberal. Em função disso, o planejamento foi deixado de lado. A Sudene como órgão eminentemente de planejamento foi vítima, ideologicamente, dessa concepção neoliberal de Estado. Sem mobilização política, sem a presença do Estado não se pode falar em política de desenvolvimento regional. Essa discussão não está internalizada nos segmentos burocráticos decisórios do País. Continua sendo uma carta de intenção.

JC – Então, o que falta à Sudene só os políticos podem resolver?
LANDIM –
Falta vontade política, porque o Nordeste é uma das regiões mais diagnosticadas do mundo. O que deve ser feito, está aqui no acervo da Sudene. Falta o operacional, e para fazer precisa de dinheiro, para ter dinheiro precisa de vontade política em torno de objetivos. Sem o que, o governo vai usando a velha tática da divisão (da Região), independentemente do partido no poder central.

JC – Em 1971, na Sudene, o general-presidente Emílio Médici denunciou o uso político dos recursos do órgão. Faltou a ele coragem para acabar com a influência e os desvios, apesar de todo o poder que tinha?
LANDIM -
O fato é que, mesmo com a ditadura, a Sudene foi respeitada e preservada. Nunca o Nordeste cresceu tanto. No período democrático, foi uma decepção. O problema da região não é a indústria da seca, é crescer. A indústria da seca foi um malefício, mas o problema é: ou se bota dinheiro aqui barato, ou se cria programas de desenvolvimento, ou se aplica 30% do orçamento federal aqui ou vai-se depender sempre dessa proteção social do Bolsa Família, Bolsa Renda, Bolsa Estiagem. Quando a Sudene mobilizava 2,5 milhões em frentes de trabalho era viável se falar em indústria da seca, hoje tudo é cartão magnético. Ficou restrito aos carros-pipa.

JC – No período democrático, a corrupção foi citada por Fernando Collor, que a fez mote da campanha presidencial (1989). O governador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA) avisou, em 1994, que a corrupção iria acabar com a Sudene.
LANDIM – ACM foi um grande político, um grande executivo, mas não é referência de ética política para ninguém. Tinha as suas brigas por disputa de espaço político nacional. ACM não é referência. Certamente, foi disputa política entre ele e outros políticos, inclusive do seu Estado. O fato é que a Sudene aprovou mais de 22 mil projetos, gerou 433 mil empregos e uma injeção de R$ 13 bilhões (valor atualizado).

JC – Apesar da falta de estrutura, Pernambuco foi um Estado privilegiado nos governos Lula e Dilma?
LANDIM –
Não tínhamos o órgão de coordenação do desenvolvimento regional, então cada um foi cuidar de si. Não vou condenar ninguém por isso. Tenho que ver o todo. Não adianta Pernambuco, por habilidades ou circunstâncias históricas, estar bem na foto, ter colocado o seu burro na sombra, se os outros (Estados) estão ao sol. Importante é que todos estejam ao abrigo de boas condições econômicas e financeiras.

JC – Em relação ao tratamento dado à Sudene, como comparar os governos FHC, Lula e Dilma?
LANDIM –
Governo que extingue o órgão (FHC), com a conivência dos políticos regionais, que baixaram a cabeça, se curvaram, sobre esse o que dizer? Agora, o Lula, pressionado pela mobilização da sociedade nordestina, recriou a Sudene. Ato louvável, mas a sua implementação está indo a passos lentos. Por quê? Porque, não se faz desenvolvimento regional sem dinheiro. Como é que a Sudene investe R$ 6 bilhões (2013) e só o programa (nacional) de sustentação industrial do BNDES tem R$ 300 bilhões? A extinção da Sudene foi um ato impensado, um ato cruel. Lula a recriou, mas o projeto levou mais de três anos no Congresso Nacional, onde temos 153 deputados da Região. Depois de aprovado, o governo levou um ano e meio par indicar o primeiro superintendente.

JC – O senhor tem, hoje, vinculação partidária?
LANDIM –
Eu estou aqui por uma indicação do governador do Piauí (Wilson Martins), do PSB) e, evidentemente, foi uma indicação política. Se tiver de ficar aqui, fico. Se vier outro, mesmo por critério político, não tem problema. Enquanto eu tiver tinta na caneta, o que eu tiver de fazer, eu vou fazendo. Na hora que disserem que têm outro para o cargo, saio.

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