A discussão sobre a atividade da Companhia Recife de Desenvolvimento e Mobilização de Ativos (Recda), que tem como objetivo a venda de ativos da Prefeitura, enfrentou um debate político na sua criação, em março do ano passado, e envereda para o campo técnico. Atendendo a uma solicitação do Ministério Público de Contas (MPC), o Tribunal de Contas do Estado (TCE) instaurou uma auditoria especial para apurar a legalidade, economicidade e constitucionalidade da Recda. Tendo como relator o conselheiro Valdeci Pascoal, a auditoria encontra-se na fase de coletas de dados e ainda não há previsão de conclusão.
O processo vai apurar a legalidade e compatibilidade do objeto social da Recda em face à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e outras legislações, avaliar se há proporcionalidade e razoabilidade no retorno financeiro da empresa e se haverá prejuízos de longo prazo ao patrimônio municipal, já que a Recda irá trabalhar com a antecipação de receitas.
A Prefeitura do Recife usa como base exemplos de outras prefeituras, que lançaram operações semelhantes. No entanto, essas operações são questionadas pelo MPC. “Nós temos dúvidas porque o Tribunal de Contas da União já tem algumas decisões em relação a Prefeituras do País, como Belo Horizonte (MG) e Nova Iguaçu (RJ), apontado incompatibilidade deste tipo de operação financeira em relação à Lei de Responsabilidade Fiscal, caracterizando isso como uma antecipação de receita vedada pela Lei”, disse o procurador de Contas, Cristiano Pimentel.
Para o procurador, estrutura jurídica que a Prefeitura do Recife desenhou para a Recda está em desacordo com as decisões do TCU. “Também há pareces da Procuradoria da Fazenda Nacional, órgão jurídico do Ministério da Fazenda, apontando que não é possível este tipo de operação. Porque, ao fim, trata-se de uma contratação de dívida por parte da Prefeitura. Se a dívida ativa não for executada nos limites e proporções imaginados pelo município, quem vai ter que arcar com o pagamento, com o resgate desses títulos públicos lançados, vai ser o tesouro municipal, ou seja, recursos dos impostos”, argumenta Pimentel.
Desde a sua criação, a Recda está cercada de polêmicas. Na Câmara do Recife, houve um grande embate entre vereadores da base do prefeito Geraldo Julio (PSB) e os de oposição. A empresa é apontada como uma tábua de salvação do último ano do mandato do prefeito Geraldo Julio, que está com uma série de obras paradas por falta de repasses de recursos. O valor seria uma injeção importante para o ano eleitoral, em que ele disputará a reeleição. A gestão espera arrecadar R$ 55 milhões com os debêntures. No dia 11 de março, será lançado o terceiro edital da empresa. Os dois primeiros, em 2015, não atraíram instituições financeiras interessadas em administrar os ativos. Foram feitos ajustes para adequar à realidade econômica do País, que foi rebaixado em rankings de agências de classificação de risco.
O secretário de Finanças do Recife, Ricardo Dantas, pasta a qual a Recda está ligada, afirmou que ainda não foi notificado sobre a auditoria nem recebeu nenhum pedido de informação. Dantas defendeu que a lei que criou a Recda é constitucional e citou exemplos de operações semelhantes feitas nas prefeituras e Estados. “Está mais do que provada, tendo em vista várias outras empresas de Belo Horizonte, São Paulo, Rio, Goiás, e tantas outras que existem e já tiveram operações nessa seara. Todas elas transcorreram dentro das avaliações que foram feitas, consideradas legais e constitucionais. Nós temos a certeza de que a Recda estão plenamente dentro da constitucionalidade”, justificou.
No caso de Belo Horizonte, o secretário afirmou que o “parecer que não foi para frente” e que o TCU questionou apenas uma das operações. Sobre a viabilidade econômica, Dantas afirmou que só será vista a partir do momento em que a Recda começar a operar. “Só após a operação é que pode questionar ou não a operacionalidade”, disse.