Bem antes da década de 1950, Pernambuco já havia fornecido à política nacional nomes que ajudaram a construir alguns dos rumos tomados pelo País. No entanto, a capital do Estado só pôde escolher o próprio governante por meio do voto direto em 1955. O eleito foi o engenheiro e urbanista Pelópidas Silveira, que já havia comandado o Recife por um breve período como interventor municipal em 1946 e alcançou a prefeitura pela segunda vez com a candidatura viabilizada pela Frente do Recife, coligação que reunia PSB, PTB e o Partido Comunista Brasileiro (PCB), então na semi-ilegalidade.
“A capital tinha setores oligárquicos tradicionais que expressavam o grande latifúndio da cana de açúcar, mas tinha também uma tradição operária grande e progressista muito forte. Com as primeiras eleições diretas do Recife, pela primeira vez havia oportunidade concreta dessas forças progressistas terem parcela do poder”, afirma o sociólogo José Arlindo Soares, autor de um livro sobre a Frente do Recife.
Pelópidas teve o apoio de setores da Igreja Católica, sindicatos e associações de bairro, graças à articulação do PCB e do PSB. “Ele tinha um diálogo muito bom com o Partido Comunista. A igreja tinha um lado conservador, mas um outro que era mais progressista. Esses setores de esquerda formaram a Frente do Recife e elegeram Pelópidas”, destaca a arquiteta Virgínia Pontual, que se dedicou a estudar o legado do ex-prefeito.
Na avaliação de José Arlindo Soares, o PCB foi o partido que deu o maior respaldo a Pelópidas. “Ele nunca foi comunista. Era um socialista-democrata-liberal, mas recebeu ajuda do PCB, que tinha muita influência sobre portuários e ferroviários, moradores de alguns bairros como Casa Amarela e Afogados e sobre a intelectualidade”, pontua.
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Some-se a esse capital político a atuação de Pelópidas em 1946, quando foi nomeado gestor municipal pelo interventor estadual José Domingues da Silva. “Ele fez uma revolução no Recife. Tabelou o peixe na Semana Santa, por exemplo. É uma coisa tão simples hoje que quase não dá para pensar que isso teve repercussão, mas teve. Também passou a administrar de forma cotidiana a coleta de lixo na cidade. A população sentiu que ali tinha um prefeito que cuidava da cidade”, opina José Arlindo Soares.
Apesar do ambiente favorável a sua candidatura, Pelópidas enfrentou resistência do grupo mais conservador da Igreja Católica, que orientiu os fiéis a não votarem nele. Também houve a tentativa de impugnar a candidatura do engenheiro sob a justificativa de ligação com o comunismo, mas o pedido foi julgado e rejeitado por unanimidade em setembro de 1955.
ELEIÇÃO HISTÓRICA
Os eleitores do Recife puderam escolher o prefeito apenas em 1955 porque até então a cidade era considerada zona estratégica de defesa do território nacional, o que atrelava o nome do gestor municipal à indicação do interventor estadual. O cenário mudou a partir de um projeto de lei do senador pernambucano Barros Carvalho (PTB).
Após a aprovação no Congresso, o projeto foi sancionado pelo presidente Café Filho em janeiro de 1955. No dia 3 de outubro do mesmo ano, os recifenses de ambos os sexos, maiores de 18 anos e alfabetizados, puderam ir às urnas. De acordo com dados do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-PE), havia 236.535 pessoas aptas a escolher o prefeito, mas o número de abstenção foi alto: 107.271. Dos 129.264 eleitores, 5.348 votaram em branco e 2.018 anularam o voto.
Na disputa eleitoral, Pelópidas enfrentou Paulo Germano Magalhães (PSD-PSP-PDC), deputado e filho do ex-governador Agamenon Magalhães, o ex-prefeito do Recife Antonio Alves Pereira (PRT-PL) e o ex-vereador Alcides Teixeira (PST). O engenheiro venceu a disputa com o dobro da votação dos rivais em uma prova de que sua passagem pelo Prefeitura do Recife em 1946, mesmo sendo uma imposição do interventor estadual, estava aprovada.
Enquanto Pelópidas abocanhou 81.499 votos (66,87%), Antônio Alves Pereira teve 23.322 votos (19,13%), Alcides Teixeira ficou com 11.028 (9,4%) e Paulo Germano Magalhães conquistou 6.049 (4,96%). “O segundo candidato mais votado era de um partido insignificante e representava famílias tradicionais, ligadas aos servidores de comércio”, informa José Arlindo Soares.