TERRA ARRASADA

Pelo menos 56 prefeitos na mira do MPPE por transição turbulenta

MPPE apura indícios de desmonte da máquina ou interrupção de serviços

Marcela Balbino
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Marcela Balbino
Publicado em 20/11/2016 às 8:28
Foto: André Nery/JC Imagem
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"Não é porque o povo de Carpina não adoece, mas já sabe que não tem médico aqui no hospital. Então, os pacientes nem procuram mais". O desabafo veio do motorista Nilson Gomes, 39 anos, há sete funcionário da Prefeitura de Carpina, na Mata Norte. Em frente à Unidade Mista de Saúde, o condutor lamentava o desmonte pelo qual a cidade vem passando, não só na área da saúde, mas nos principais serviços públicos - da coleta de lixo ao fornecimento de remédios na farmácia. E a situação não está circunscrita à cidade, que tem pouco mais de 74 mil habitantes. Dados divulgados em primeira mão ao JC pelo MPPE, no âmbito da Operação Terra Arrasada, revelam que pelo menos 56 cidades do Estado enfrentam dificuldades na transição e alguns prefeitos eleitos devem arcar com a "herança maldita" dos antecessores.

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Em Carpina, o prefeito Carlos do Moinho (PSB) perdeu as eleições e, em outubro, demitiu funcionários terceirizados, o que afetou os serviços essenciais. O lixo tem sido recolhido de forma irregular e se amontoa em bairros mais periféricos. Na Unidade do Samu, inaugurada em 2013, há somente duas ambulâncias, uma para atendimento básico e outra para avançado. Uma delas está parada há três meses, com pneus carecas e precisando de reparo. No centro farmacêutico faltam remédios controlados, há apenas medicamentos básicos e insulina.

Na Unidade Mista de Saúde, só está em funcionamento o setor da emergência e, ainda assim, de forma precária. A reportagem ficou aproximadamente 40 minutos no local, à espera de pacientes, mas as cadeiras continuaram vazias. Estão fechados o bloco cirúrgico, a clínica médica, a pediatria e o laboratório. "Os médicos não querem mais vir porque estão com salários atrasado há meses e só vêm se receberem com adiantamento. Normalmente, no período da manhã, eram no mínimo 80 pessoas em busca de atendimento", conta Nilson.

O TCE recebeu sete denúncias sobre problemas na transição do mandato em Carpina. As denúncias do município são referentes, justamente, a atrasos de pagamentos de servidores, demissão de médicos e falta de medicamentos.

O procurador-geral do Ministério Público de Contas (MPCO), Cristiano Pimentel, observa que, em muitas cidades, mesmo com a folha atrasada os prefeitos priorizam o pagamento dos fornecedores em detrimento à manutenção dos serviços básicos de saúde e educação. "São esses critérios que precisamos ficar alerta", diz. Em algumas localidades, como Ribeirão, o promotor pediu bloqueio das contas.

No Grande Recife, cidades como Olinda, Itamaracá, Camaragibe e São Lourenço da Mata estão na mira do MPPE e os prefeitos receberam recomendações do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Público. Todos os prefeitos que receberam alerta ou não disputaram ou perderam as eleições, com exceção do gestor de Tabira, que saiu vitorioso.

Em Nazaré da Mata, a promotoria recomendou que o prefeito readmita profissionais de saúde. Segundo a entidade, dentre as práticas proibidas aos agentes públicos pela Lei das Eleições, está a demissão sem justa causa, remoção, transferência ou exoneração de servidor público, do início do segundo semestre até a posse dos novos eleitos. A exceção fica por conta da exoneração de cargos em comissão e dispensa de funções de confiança.

"Esse material é uma radiografia que tem mudado a cada dia. A recomendação é o primeiro aviso sério aos prefeitos para alertá-los. Se eles não disserem o que vão fazer para se adequar à situação, podem responder por atos de improbidade administrativa ou por uso de meios para se apoderar de dinheiro público", explica o promotor de Justiça Maviael Souza, do Patrimônio Público. As punições contra os políticos que descumprirem as recomendações podem culminar na suspensão de direitos políticos, devolução de dinheiro, aplicação de multas ou indisponibilidade de bens.

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Na Unidade Mista de Saúde de Carpina só está em funcionamento emergência - Foto: André Nery/JC Imagem
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Pacientes em Carpina já sabem da falta de atendimento no hospital e nem procuram mais unidade - Foto: André Nery/JC Imagem
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Pacientes em Carpina já sabem da falta de atendimento no hospital e nem procuram mais unidade - Foto: André Nery/JC Imagem
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Na farmácia faltam remédios - Foto: André Nery/JC Imagem
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Paciente em busca de remédios - Foto: André Nery/JC Imagem
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No Samu, uma das duas ambulâncias está parada com pneus carecas e defeito no motor - Foto: André Nery/JC Imagem
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Lixo se acumula em ruas da periferia de Carpina - Foto: André Nery/JC Imagem

INVESTIGAÇÃO

Em Carpina, o MPPE investiga se o dinheiro da prefeitura foi usado para pagamento de gastos da campanha do prefeito e da esposa dele. O promotor da cidade, Fernando Falcão, explica que, desde o fim das eleições, chegaram denúncias de atraso no pagamento de servidores e contratados temporários. E, segundo ele, surgiram suspeitas do desvio do dinheiro da prefeitura.

"A partir daí, começamos a fazer as investigações, apurar as irregularidades e têm alguns inquéritos civis que estão sendo construídos. Entrei com ação pedindo bloqueio das contas do município, mas chegou recurso da repatriação e ele conseguiu pagar ao menos servidores ativos e aposentados, mas depois que perdeu a eleição ele desligou ilegalmente diversos contratados temporários", afirmou.

CARPINA: GESTÃO CULPA ENXUGAMENTO

O prefeito de Carpina, Carlinhos do Moinho (PSB), foi procurado na prefeitura e pelo telefone, mas não foi localizado nem atendeu as ligações. Até mesmo a assessoria de imprensa foi dispensada.

Procurado, o secretário de Planejamento da cidade, Jorge Miguel, reconheceu os problemas e disse que foi necessário cortar cargos para que a prefeitura fosse entregue ao sucessor com as contas equilibradas.

Segundo ele, parte dos que foram dispensados já retornaram às funções e foi preciso adotar a medida para sair do limite da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Quanto ao atraso na folha de pagamento, ele grifou que "é um problema comum em quase todas as prefeituras."

Sobre a falta de remédios, ele cita a dependência dos convênios com Estado e a União e diz que alguns medicamentos deixaram de ser enviados desde a eleição. A questão do atraso no recolhimento do lixo, ele reconhece que houve atraso no pagamento dos salários dos funcionários responsáveis pela limpeza urbana, mas pontua que problema já foi regularizado. A falta de educação das pessoas, que jogam lixo nas ruas após passagem do caminhão, também foi apontada por ele como responsável pelo acúmulo de resíduos nas ruas. 

VEJA LISTA DE CIDADES NA MIRA DO MPPE

Sertão: 20

Belém de São Francisco
Itacuruba
Inajá
Ouricuri
Santa Cruz
Santa Filomena
Salgueiro
São José do Egito
Solidão
Tabira
Tuparetama
Flores
Sertânia
Verdejante
Serrita
Cedro
Cabrobó
Floresta
Carnaubeira
Bodocó

Agreste: 17

Bom Jardim
Casinhas
Cumaru
Iati
Passira
Pesqueira
Surubim
Vertente do Lério
Itaíba
Sanharó
Belo Jardim
Feira Nova
Poção
Tupanatinga
Buíque
Gravatá
Barra de Guabiraba

Zona da Mata: 15

Goiana
Limoeiro
Vitória de Santo Antão
Timbaúba
Glória do Goitá
Chã de Alegria
Itambé
Itaquitinga
Condado
Palmares
Primavera
Macaparana
Ferreiros
Água Preta
Carpina

Grande Recife: 4

Olinda
Ilha de Itamaracá
Camaragibe
São Lourenço da Mata

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