Pelos caminhos que andei como repórter, no começo da década de 1990, cobri a inauguração de uma caixa d’água nas imediações do Curado, Zona Oeste do Recife, pelo então governador Miguel Arraes. Pernambuco era muito mais pobre, e o chefe do executivo inaugurava uma grande caixa d’água que ia levar o bem às comunidades mais próximas. Era de impressionar o carinho dos populares com aquele homem, que retribuía conversando, abraçando e sorrindo. Era cordial com os repórteres, mesmo com uma iniciante. No entanto, quando não queria responder, fazia o pigarro ficar mais forte. E não adiantava gravar a conversa: ficava ininteligível.
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Já no governo Lula (2003-2010), em Catende para cobrir um evento do qual participaria o então ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto. Vi uma multidão andando, quase em fila indiana, no acostamento da estrada. O carro parou em frente a uma vendinha. E perguntei:
– O que é isso?
– É o velho arraia que está lá na Usina Catende. Estou fechando a venda para ir também.
A resposta foi de um pequeno comerciante, que se juntou aos outros. Uma multidão chegou ao evento da usina, principalmente para ver Arraes, embora o evento tivesse a presença de um ministro. Na Zona da Mata, Arraes arrastava multidões e votos, o que muito contribuiu para as suas votações tão expressivas.
Mas o que fez a presença dele ser tão forte na Zona da Mata? No seu primeiro governo, foi fechado o Acordo do Campo, proporcionando a milhares de canavieiros o recebimento de um salário mínimo no começo da década de 1960. Na época, o então governador apoiou a criação de sindicatos e associações locais. E isso trouxe, também naquele tempo, outra conquista: a carteira assinada para quem cortava cana-de-açúcar.
Em 1986, Arraes “entrou pela porta que saiu”, como dizia a propaganda da sua campanha. Nesse segundo mandato, lançou o Chapéu de Palha, que naquele tempo empregava os canavieiros em obras públicas na entressafra – período em que os cortadores de cana ficam sem trabalhar.
CRISE
O terceiro e último governo foi o mais complicado. A economia pernambucana passou a se arrastar (com um crescimento médio de 2% do PIB), a inflação crescia, o Estado tinha dificuldade até para quitar a folha de pagamento. Implantou um grande programa de eletrificação rural. Ainda nesse mandato, e mesmo sendo socialista, tentou vender a Celpe para arrecadar recursos, mas não conseguiu, porque os seus opositores suspenderam a iniciativa na Justiça.
Para obter recursos, Arraes autorizou o neto Eduardo Campos, à frente da secretaria da Fazenda estadual, a fazer uma operação com os precatórios. Houve suspeita de fraude porque os recursos deveriam ser usados somente para pagar dívidas judiciais. A história trouxe um desgaste político grande para Miguel Arraes e foi parar na Justiça.
Até hoje há quem diga que isso contribuiu para sua derrota ao governo na eleição de 1998. Os precatórios foram parar no Supremo Tribunal Federal (STF), que inocentou avô e neto.