Memória

Eleições no Recife: as maiores tretas em linha reta da América Latina

Quadro atual não destoa em nada de outros períodos eleitorais vividos na capital pernambucana, quando adversários viraram aliados e aliados tornaram-se adversários

Renata Monteiro
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Renata Monteiro
Publicado em 30/01/2020 às 15:25
Foto: Arquivo Pessoal/Roberto Magalhães
Quadro atual não destoa em nada de outros períodos eleitorais vividos na capital pernambucana, quando adversários viraram aliados e aliados tornaram-se adversários - FOTO: Foto: Arquivo Pessoal/Roberto Magalhães
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Todo início de ano eleitoral é a mesma coisa: basta os pré-candidatos começarem a se movimentar em torno da viabilização dos seus nomes para a disputa que as tretas começam a surgir. Na história do Recife, não foram poucas as vezes em que, justamente nessa época, aliados viraram adversários e adversários viraram aliados. 

Neste momento, inclusive, essa corda já está tensionada tanto na base do governo quanto na oposição. De um lado, o senador Fernando Bezerra Coelho se articula para que o presidente estadual do MDB, o deputado federal Raul Henry, seja candidato à Prefeitura do Recife, deixando para trás a aliança que o partido possui com o PSB do governador Paulo Câmara e do atual prefeito da cidade, Geraldo Julio. 

Os deputados federais André de Paula (PSD) e Túlio Gadêlha (PDT) também estudam o lançamento das suas candidaturas, bem como a deputada Marília Arraes (PT), ex-PSB. Todos os parlamentares estão em partidos que compõem a base do governo.

Na oposição, vários nomes já se colocaram como pré-candidatos para a disputa desse ano, como o ex-governador Mendonça Filho (DEM) e os deputados federais Daniel Coelho (CID) e Silvio Costa Filho (REP). O grupo, porém, ainda divide-se entre os que defendem o lançamento de múltiplas candidaturas e aqueles que acreditam que um único nome deve representar o coletivo na tentativa de derrubar o deputado federal João Campos, principal cotado do PSB para a sucessão de Geraldo Julio.

Mas como eu disse no início desse texto, esse tipo de quadro não tem nada de novo quando o assunto são eleições municipais no Recife. Desde a redemocratização, os pleitos na cidade já sofreram algumas reviravoltas inacreditáveis devido a rompimentos e alianças bem pouco prováveis. No retorno das eleições diretas, por exemplo, os maiores representantes da esquerda em Pernambuco eram Jarbas Vasconcelos e Miguel Arraes. A relação, amistosa naquele momento, evoluiu poucos anos depois - em 1992, mais especificamente - para uma rusga que nunca foi sanada.

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Naquele ano, Arraes tentou fazer de Eduardo Campos, seu neto, vice de Jarbas na corrida pela prefeitura. Como o agora senador da República não aceitou a arrumação, Arraes lançou Eduardo como candidato, mas ele acabou perdendo o pleito. Anos mais tarde, em 2010, o herdeiro político do “Doutor Arraes” concorreria novamente com Jarbas, desta vez pelo cargo de governador, e venceria o emedebista de lavada, com 82,84% dos votos.

No início dos anos 1990, porém, o rompimento abriu espaço para que membros do PFL (atualmente DEM), que eram opositores ferrenhos do MDB durante a ditadura militar, se aproximassem de Jarbas. Eram os primórdios da coligação União por Pernambuco. Em 1994, como um dos primeiros reflexos dessa reorganização política, Jarbas apoiou a campanha de Gustavo Krause para o governo do Estado contra Miguel Arraes, mas o socialista venceu a disputa.

Em 1996, esperava-se que Jarbas apoiasse o nome de João Braga, que era seu secretário de Infraestrutura, para a disputa municipal, mas o emedebista optou pela aliança com Roberto Magalhães (então PFL). Braga, então, provocou um racha no MDB, saiu do partido levando vários filiados e ligou-se ao PSDB para concorrer à prefeitura. Ele foi o principal opositor da chapa MDB-PFL, perdeu, mas anos depois, quando Jarbas assumiu o governo estadual, ambos se reaproximaram.

O PT ENTRA EM CENA

Se a indecisão atual do PT sobre o lançamento da candidatura de Marília Arraes a prefeita parece confusa, é preciso relembrar que o partido do ex-presidente Lula acumula idas e vindas com seus indicados e aliados pelo menos desde que o agora deputado estadual João Paulo se preparava para deixar a chefia do Executivo municipal após cumprir dois mandatos, em 2008.

Na ocasião, o nome de João da Costa, que acabou sendo escolhido pelo partido e venceu a eleição, não foi unanimidade entre os petistas. Maurício Rands, Pedro Eugênio e até o agora senador Humberto Costa chegaram a ser cotados, mas a vontade do então prefeito acabou falando mais alto. João Paulo e João da Costa, contudo, acabaram rompendo relações pouco depois da eleição.

Em 2012, mais confusão no ninho petista pernambucano. Devido à briga dos Joões, a sigla realizou prévias entre João da Costa e Maurício Rands para decidir quem seria o candidato naquele pleito, mas o resultado não serviu para muita coisa, já que o partido decidiu que Humberto Costa encabeçaria a chapa ao lado de João Paulo.

A essa altura, a aliança que o PT possuía com o PSB, partido que indicou o vice de João da Costa - Milton Coelho -, já havia ido para o espaço. Naquele ano, o governador Eduardo Campos tomou a dianteira nas articulações socialistas para o pleito e lançou o nome de um técnico até então desconhecido da sua equipe, Geraldo Julio, que atropelou os petistas já no primeiro turno, vencendo com 51,15% dos votos. O PT ficou em terceiro lugar nessa disputa, atrás de Daniel Coelho (CID), que na época estava no PSDB.

Petistas e socialistas só voltariam a aliar-se em 2018, durante a campanha à reeleição do governador Paulo Câmara.

Com o cenário que se desenha para o pleito de 2020 - com prováveis disputa entre primos, desembarques da base e embate de egos no grupo de oposição -, só nos resta aguardar para saber que tretas a campanha eleitoral desse ano nos reserva. A contar pelo histórico político do Recife, certamente de tédio não poderemos nos queixar.

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