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Os amores de Gabriel Mascaro

Cineasta recifense fala de cinema e família

Luísa Ferreira
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Luísa Ferreira
Publicado em 06/11/2011 às 9:17 | Atualizado em 19/12/2022 às 11:34

O cineasta recifense Gabriel Mascaro, 28 anos, não troca Pernambuco por nada. Afinal, o filho Calun, a esposa Rachel, a casa com jardim no Centro, o Mercado da Boa Vista e a Praia de Calhetas estão bem aqui. Gabriel, conhecido por filmes como Avenida Brasília Formosa e Um lugar ao sol, conversou sobre esses e outros amores com Luísa Ferreira. Confira a íntegra da entrevista publicada na edição de hoje do JC, na revista Arrecifes.

JC – Como começou sua relação com o cinema?

GABRIEL MASCARO – Quando estudava rádio e TV, trabalhei no programa Curta Pernambuco, da TV Universitária. Comecei a descobrir o cinema aí, a partir do contato com o que se fazia em Pernambuco. Meu trabalho de pesquisa em cinema foi recente. Nunca tive isso de “ah, quero ser cineasta quando crescer”, o que é bacana porque não tinha os cânones do cinema como algo muito cristalizado.

JC – A que se dedica além da sétima arte?

GABRIEL – Minha casa tem um jardinzinho, gosto de ficar cuidando dele. Também passo muito tempo com meu filho, Calun, de 10 meses e meio. Estamos aproveitando bastante esse momento. Ser pai é uma experiência muito intensa, muito bonita. Muda você todo dia. Eu e minha esposa, Rachel, não contratamos babá nem empregada doméstica, então cuidamos dele o tempo inteiro.

JC – Sempre morou no Centro?

GABRIEL – Morei por uns 20 anos no Cordeiro. Quando comecei a trabalhar com audiovisual, passei a ter mais contato com o Centro e achei um lugar muito bacana, com uma energia muito boa. Rachel, que é inglesa e já trabalhava no Recife quando nos conhecemos, morava por aqui e me encorajou a mudar pra cá. Muitos recifenses têm preconceito com o Centro, mas ela não tinha essa visão. É uma região muito especial da cidade, ligada a movimentos culturais, e tem uma rede muito forte de vizinhos. Adoro isso.

JC – Gosta de morar bem em frente ao Mercado da Boa Vista?

GABRIEL – Muito. O chá de bebê do meu filho foi no mercado, assim como muitos encontros e celebrações. Venho aqui umas três vezes por dia, fazer a feira, almoçar, etc. Dá até pra fazer reuniões de trabalho aqui, tem wi-fi e tudo.

JC – Pensa em sair do Recife algum dia?

GABRIEL – Não. Nas décadas de 80 e 90, as pessoas que trabalhavam com cultura precisavam sair daqui para ter referências, produzir filmes, coisas que eram um pouco mais difíceis aqui nessa época. Hoje, com a internet e com a consolidação de uma rede de produção local, a cidade é um lugar possível para se viver e fazer cinema. Curto muito morar aqui.

JC – Qual é seu programa preferido de domingo?

GABRIEL – De vez em quando, a gente dá um pulo no Bar do Elói, em Calhetas. Gosto de levar Calun pra brincar na areia. Gosto tanto de praia que morei em Calhetas por um ano. Também adoro acampar e vou fazê-lo pela primeira vez com Calun no réveillon. Pretendemos passar dez dias viajando pelo litoral, indo até o Ceará.

JC – E como é sua rotina?

GABRIEL – Todo dia, acordo às 6h e venho passear com Calun no mercado. Ficamos só eu, ele e os pombos e vemos as carnes e frutas chegando. Depois disso, varia muito. Eu e Rachel somos autônomos, então nossa vida tem um timing diferente. Nunca sei o que vai acontecer no dia seguinte, então não planejo muito. Acho ótimo não ter rotina.

JC – Qual é o filme que mais te inspira?

GABRIEL – A cada novo projeto, busco novas referências. Mas alguns filmes que me tocaram muito durante minha formação, como Iracema: uma transa amazônica. Ele me marcou muito, por ter um modelo de produção e uma história que me interessam. É uma referência de cinema no Brasil pra mim. Mas não tenho dogmas.

JC – Que outra arte mexe mais com você?

GABRIEL – Tenho me interessado muito por artes plásticas e videoarte. Gosto dos trabalhos de Marina Bramovitch, uma artista muito forte, muito bacana. Mas, pra mim, é aquela coisa: corpo aberto, o santo baixa. Fico aberto pra o que toca, tanto exposição, filme, livro, como uma cena da vida real.

JC – Tem algum livro de cabeceira?

GABRIEL – Estou lendo no momento Vida capital, de Peter Pal Pelbart. Esse livro tem sido muito forte pra mim. Percebi que estou há um ano sem conseguir acabar de lê-lo, acho que essa resistência é por não querer acabar. Não quero sair dele.

JC – Quem você mais admira?

GABRIEL – Eu admiro os momentos em que as pessoas falham. Admiro todos os grandes mitos, mas quando eles falham, porque a falha é humana e isso me interessa.

JC – Como surgiu a ideia de filmar Avenida Brasília Formosa, seu último documentário?

GABRIEL – Surgiu da vontade de investigar essa coisa do espaço comum, que é muito particular em Brasília Teimosa. Eu já frequentava o lugar, que me lembrava um pouco onde eu cresci, no Cordeiro, que também é uma região de periferia. Mas Brasília Teimosa é um espaço hiperpotencializado. O que mais me interessou foi ver como era comum as pessoas sentarem na rua, com a cadeira virada pra dentro de casa, assistindo à televisão no máximo volume. É como se a sala de estar fosse a rua. Como se o espaço da afetividade e da intimidade fosse fora de casa.

JC – E como foi sua infância?

GABRIEL – Fui criado em frente à maior avenida em linha reta da América Latina, a Caxangá. O meu maior orgulho de infância era esse. Brincava muito pela rua, jogando bola, andando de bicicleta. Nunca gostei muito de videogame. Tive mais essa vivência da cidade, de experimentar o espaço urbano e fazer amigos na comunidade, que são meus amigos até hoje.

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