Não havia sequer um aparelho de som na casa onde o pernambucano Fábio Cabral, 50 anos, morava quando criança, no município de Joaquim Nabuco, na Zona da Mata. Seu pai preferia o silêncio. Mas a mãe, não. Ela costumava cantarolar clássicos de Maria Bethânia, Simone, Dorival Caymmi, entre tantos outros nomes da música brasileira. Acabou despertando no filho o interesse pelos acordes e pelas melodias, sem imaginar que o gosto se tornaria paixão e também trabalho décadas mais tarde na vida dele.
Aquele menino de então tornou-se o homem por trás da loja Passa Disco, principal ponto de divulgação da música pernambucana no Recife e no Brasil. De tão mergulhado no que faz, o empresário acabou incorporando a marca que criou. Muito antes de ser conhecido como Fábio Passa Disco, porém, poucos sabem que ele era chamado de “filho do prefeito” quando pequeno.
Seu pai, Fernando Cabral, foi o chefe do executivo de Joaquim Nabuco, no final da década de 1960. Ele era também gerente de uma usina, o que o levou a morar com a família em uma espécie de vila, conhecida como Arruado, com cerca de outras 50 pessoas, entre funcionários da usina e seus familiares. No ano em que Fábio nasceu, 1963, não havia maternidade na cidade. Se dependesse do caminho natural de seus irmãos, ele teria nascido no Recife. O problema é que era fevereiro, semana anterior ao Carnaval, e a casa da avó que servia de apoio na capital já estava lotada de foliões que se preparavam para a festa.
O jeito foi ir a Palmares, cidade vizinha. Fábio nasceu lá e cresceu como menino de engenho na Zona da Mata pernambucana, até se mudar para o Recife quando tinha cerca de 10 anos. Foi nessa época que comprou o primeiro aparelho de som da vida com o dinheiro que ganhou de familiares quando fez a primeira comunhão.
Por herdar do pai o gosto pelas plantas, em particular pelas orquídeas, acabou se formando em agronomia. Mas nem durante o período da faculdade deixou a música de lado.
Mesmo sem ter aprendido a tocar nenhum instrumento musical, sempre buscou se manter atualizado sobre as novidades do meio. “O programa E o espetáculo continua, de José Mário Austregésilo, que ainda vai ao ar na Rádio Universitária, foi muito marcante na década de 1980. Eu ficava torcendo para que as aulas acabassem e eu pudesse ouvir as notícias sobre os artistas da época”, recorda.
Insistente, a música se firmou na sua vida durante meados da década de 1990, quando gerenciou o bar Rei do Cangaço, ao lado de um dos irmãos. Promovendo shows e lançamentos dos artistas da terra, o local inspirou a loja Passa Disco, que está completando uma década este ano.
Lá, entre tantos encontros com clientes e artistas, recorda com carinho um em especial. “Quando Alceu Valença entrou por aquela porta, lembrei das músicas dele que nunca canso de ouvir e de todos os trabalhos de sua carreira que tenho guardados. Mesmo se a loja não tivesse dado certo, já teria valido a pena por esse momento.”
Com a memória curta para datas, Fábio situa os episódios da sua vida em uma linha do tempo baseada nos anos de lançamento dos discos que marcaram sua trajetória. “Sei que foi perto de 1976 que comprei minha primeira radiola, porque foi na mesma época que Chico Buarque lançou Caros amigos.” E se arrepende de não ter guardado as caixinhas das primeiras fitas cassete que comprou. Ficou a lembrança: eram Bem, de Jorge Ben, e Gita, de Raul Seixas.
Inspirado em uma das canções de Dorival Caymmi que ouvia a mãe cantar na infância, deu o nome de Marina à filha. O filho Jáder, apesar de estudar administração, toca violão e integra o grupo Sal. De uma forma ou de outra, Fábio Passa Disco acabou transmitindo a veia musical aos seus herdeiros.