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Alta cozinha macrô

Formados por Kikushi, o introdutor da macrô no Brasil, três chefs do Recife elevam a potência gustativa da cozinha natural

Bruno Albertim
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Bruno Albertim
Publicado em 24/08/2012 às 12:23
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Formados por Kikushi, o introdutor da macrô no Brasil, três chefs do Recife elevam a potência gustativa da cozinha natural - FOTO: Igo Bione/JC Imagem
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Restaurante “natural” no Recife já não é gueto. Além de veganos tão militantes quanto Morissey (o ex-Smiths que proíbe comercialização de carne a léguas de qualquer palco onde cante), as casas do gênero recebem, também, interessados apenas em leveza. E por um fator: esta cozinha já pode ser conjugada com um ingrediente indispensável aos não militantes, o bom e velho sabor.

“Recebo tanto gente que tem uma alimentação permanentemente equilibrada quanto quem procura desintoxicação por uns dias”, diz Hilda Gil, verdadeira musa da turminha macrô que tem seu nome entre os poucos chefs que elevam a potência gustativa desta culinária a níveis notoriamente gastronômicos. No Centro, seu restaurante Nossa Casa tem fiéis até Gilberto Gil – habituê quando de passagem pelo Recife.

Assim como seus pares, Hilda é formada pelo imigrante Tomio Kikushi, o guru responsável pela introdução da macrobiótica no Brasil. Os outros dois discípulos do mestre no Recife são Albanita Almeida, do Céu e Terra, no Centro; e Mário Acioli, que, depois de cozinhar muito arroz integral no Recife, mudou suas panelas para Olinda.

São três endereços semelhantes, mas de sutis diferenças que justificam a afirmação: cada um, à sua maneira, executa uma culinária micromacrô (assim chamada por levar em conta também os pequenos aspectos do equilíbrio) absolutamente autoral.

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As semelhanças estão na equação desse tipo de refeição. Em cada um dos três restaurantes, a base da alimentação – e do equilíbrio vital – está no arroz integral, normalmente do tipo cateto, de grãos mais curtos e sabor ligeiramente adocicado. O arroz é acompanhado de um pratinho secundário, composto de vegetais, raízes e pastelaria salgada. Como complemento, há uma sopa do dia.

Na casa de Hilda Gil, o arroz é grudadinho, como um gohan japonês, ideal para se comer de hashis. O secundário muda a cada dia. Mas sempre temperado com uma delicadeza comovente: limão, gengibre, gergelim e algas, por exemplo. Esta semana, houve bolinho de cará no forno com azeitona, cebola, cenoura, salsinha, azeite e shoyu, mais uma saladinha de feijão verde com rabanete e alface. De suas sopas, a de milho verde com cenoura, cebola, águas marinhas e araruta (uma raiz que se transforma em farinha) é marcante.

Nestas casas, o cardápio muda a cada dia, escrito numa lousa. No Céu e Terra, Albanita oferece, além do arroz em água (finalizado com gersal), o risoto (esqueça o italiano e lembre da receita caseira de arroz com legumes picadinhos). Das sopas de acompanhamento, o missoshiro com abóbora japonesa e cebola é inesquecível.

A tortinha de cebola, como de resto sua pastelaria, também cativa. Aliás, não deve ser ignorados o empório da casa. Denso, quase sem fermento, o pão integral é o melhor da cidade. Inesquecível é a sua versão doce feita sem açúcar, mas com compota natural de maçã.

No restaurante de Mário Acioli, o prato secundário tem sempre o acréscimo de uma saladinha verde (temperada com vinagrete shoyu, azeite e limão) e legumes refogados. Esta semana, ele incluiu no conjunto tortinha de grão-de-bico com legumes e pastel de massa de arroz com alho-poró, de uma delicadeza artesanal. Como suas colegas, trata-se de um cozinheiro com grande sensibilidade para conjugar ingredientes.

Mas não estranhe se chegar a um dos três restaurantes e encontrar um prato especial como bobó de bacalhau com cará ou dobradinha de feijão-branco com bacalhau. “Se quisermos usar proteína animal, recorremos a peixe ou ovos caipira”, justifica Albanita.

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