VINHOS

Tempo de colheita gaúcha

A safra de Bento Gonçalves promete ser uma das melhores da história. Se 2013 estiver inscrito no rótulo da garrafa, pode beber sem medo

Bruno Albertim
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Bruno Albertim
Publicado em 15/02/2013 às 9:00
Gilmar Gomes/Divulgação
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Para a angústia de produtores temerosos de que a chuva estragasse a concentração de açúcar nas uvas, o céu ameaçava ficar cada vez mais cinza no final de tarde do pacatíssimo sábado pré-Carnavalesco de Bento Gonçalves, epicentro da Serra Gaúcha. O pároco local mal cumprimentou o trio de beldades lideradas pela jovem Letícia Dal Magro, antes de entrar no salão de festas anexo à matriz de Nossa Senhora das Graças.

Estudante de odontologia, 18 aninhos, a moça foi eleita princesa da uva e do vinho do Vale dos Vinhedos para um reinado de dois anos. “Um cargo de muita responsabilidade para a comunidade”, que, segundo a loura platinada de quase 1,80 metro, olhos verdes convictos e pele alva como nos contos infantis, exige uma dedicada preparação para vencer as muitas sabatinas do colegiado comunitário sobre cada tipo de uva e vinho dali. “Não é só a beleza que conta”, gosta de frisar.

Antes que o padre pudesse adentrar o salão da Sociedade Recreativa e Cultural Oito da Graciema, a moça ouvia contrita o discurso protocolar de um quase octogenário vinicultor local para, finalmente, despir-se dos saltos medianos em que se apoiava e pisar, com suas colegas, as uvas da variedade merlot depositadas numa antiga, simbólica e hoje inútil tina de madeira.

Depois, a jovem nobreza teve os delicados pés atenciosamente enxutos pelo prefeito local. Como o padre, o líder da câmara, o delegado e demais autoridades e o líder do Executivo cumpriram a liturgia de abertura de mais uma vindima. Terminada a celebração de mais de uma hora de missa, a audiência de 300 pessoas pôde, enfim, se empanturrar de vinho e salame ao som de antigas canções italianas. Estava inaugurada, oficialmente, a colheita no Vale dos Vinhedos – a única e cada vez mais prestigiada região com Denominação de Origem no Brasil.

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Safra de Bento Gonçalves de 2013 promete ser uma das melhores da história - Gilmar Gomes/Divulgação
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André Laurentis é um dos jovens cujos tintos têm corpo, concentração e preços abaixo de R$ 30 - Lucinara Masiero/Conceitocom Brasil
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Merlot é a uva de maior expressão na região - Lucinara Masiero/Conceitocom Brasil
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Vale dos Vinhedos conta com 31 empresas. Em toda a serra, são cerca de 70 - Lucinara Masiero/Conceitocom Brasil
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A indústria na Serra Gaúcha movimenta 80% do mercado de R$ 2 bilhões de vinhos finos no Brasil - Gilmar Gomes/Divulgação
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Uvas da Serra Gaúcha fazem nascer vinhos de várias categorias e faixas de preço - Gilmar Gomes/Divulgação

As cenas dignas de uma Sucupira ou Saramandaia banhadas em vinho terminam aí. Hoje, o vinho doce e de garrafão é cada vez mais uma peça no retrato sépia dos bisavôs imigrantes na parede. Vinhos elegantíssimos, de várias categorias e faixas de preço, consumidos pela classe média que, às vezes, sua para girar a taça, ou por endinheirados que terão adegas herdadas por seus filhos. Eles arrebatam cada vez mais prêmios e prestígios. Uma indústria séria, que movimenta nada menos que 80% do mercado de R$ 2 bilhões de vinhos finos no Brasil.

Fomos até lá, para constatar que esta safra, que começa a ser vinificada agora, deve ser uma das melhores da história. Melhor até que a de 2005, quando alguns vinhos, depois de quase esgotados, chegaram ao patamar de R$ 500. Se 2013 estiver inscrito no rótulo como ano da safra, pode beber. Se o vinho em questão, claro, for gaúcho. Até porque, naquele sábado, a chuva não diluiu o caráter das uvas.

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