O dilema dos aliados do PT que não podem parecer aliados do PT
Caso o presidente Lula venha ao Recife e cumpra agenda com o candidato à reeleição, João Campos, o prefeito pode perder votos à direita.
O dilema dos aliados de Lula (PT) em boa parte dos municípios brasileiros assemelha-se a Hamlet decidindo entre a nobreza de sofrer e o risco de enfrentar as dificuldades. “Lular ou não lular, eis a questão”, repetem muitos dos candidatos a prefeito espalhados pelo Brasil.
O cálculo para alguns é mais fácil. Quando não se tem muito o que perder, em terceiro ou quarto lugar, com eleitorado bem segmentado e só com a esquerda votando em você, a decisão é simples e Lula é bom para a campanha.
Mas e quando você é João Campos (PSB) ou Eduardo Paes (PSD), faz como?
“Ser ou não ser, eis a questão: será mais nobre em nosso espírito sofrer pedras e flechas com que a Fortuna, enfurecida, nos alveja, ou insurgir-nos contra um mar de provocações e em luta pôr-lhes fim?”, repete Hamlet em seu monólogo mais famoso.
A pergunta desses candidatos, baseada em Shakespeare, é se Lula mais atrapalha que ajuda ou mais ajuda que atrapalha.
Arriscado
Tanto Eduardo Paes quanto João Campos estão com mais de 60% das intenções de voto. O candidato à reeleição no Rio de Janeiro beira os 70%. Campos, no Recife, beira os 80%. Os adversários, bolsonaristas, estão com 13% no Rio e 6% na capital pernambucana. Isso significa que em meio à votação dos líderes há eleitores bolsonaristas. Uma visita do presidente da República pode reforçar bastante os votos à esquerda, que eles já tem. Mas também pode afastar os votos da direita. E aí, quem arrisca?
Discreto
No caso de João Campos, que tem sido apontado como um futuro candidato ao governo de Pernambuco em 2026, evitar Lula na eleição do Recife pode afastar o PT de vez para o futuro e comprometer a tão falada unidade da Frente Popular daqui a dois anos.
No programa Passando a Limpo, da Rádio Jornal, a jornalista Terezinha Nunes contou que uma fonte petista chegou a dizer que se Lula pode vir a Pernambuco para eventos mais reservados.
Como?
A agenda, então, seria bem restrita e evitaria fazer um alarde muito expressivo. Nada de um grande comício ou carreata, tudo para tentar manter um equilíbrio. Mas é bom lembrar que um presidente da República sempre chama muito a atenção. Não dá pra ser discreto e ser presidente do Brasil ao mesmo tempo.
E outros municípios?
Em Pernambuco, atender demandas necessárias do estado sem prejudicar João Campos é um desafio para os petistas. Caso Lula venha ao Recife e cumpra agenda com o candidato à reeleição, Campos pode perder votos à direita.
Mas se visitar Olinda e Jaboatão, onde os candidatos precisam mesmo de Lula, e não vier à capital, vai parecer que a relação entre o prefeito do Recife e o presidente não é boa. Para Campos, o ideal seria que Lula ficasse "ocupado demais" e não pisasse por aqui.
Agreste
Além do Recife, Caruaru também é foco desse dilema shakespeariano. Por lá, o PT apoia José Queiroz (PDT) que trava uma disputa muito acirrada com o atual prefeito, Rodrigo Pinheiro (PSDB).
Se for à capital do Agreste, Lula pode ajudar Queiroz no primeiro turno, mas atrapalha o candidato no segundo turno, quando ele vai precisar de votos hoje com a direita, representada pelo bolsonarista Fernando Rodolfo (PL).
Eleições americanas
A partir desta sexta-feira (13), às 8h, a Rádio Jornal inicia uma cobertura especial das eleições americanas. Dentro do Passando a Limpo, sempre às sextas e até o resultado da disputa nos EUA em 5 de novembro, os cientistas políticos Antônio Lavareda e Ricardo Rodrigues, mais o economista Maurício Romão, discutem a importância do pleito americano para o mundo e as consequências das decisões que estão sendo tomadas por lá, inclusive para o Brasil.