Cena Política | Análise

Igor Maciel: O texto e o contexto na ida de Raquel Lyra para o partido de Kassab

O PSD e Kassab têm condições de ajudar na articulação do governo de Pernambuco, tanto em Brasília quanto no Estado. Mas é preciso aceitar a ajuda.

Por Igor Maciel Publicado em 26/02/2025 às 20:00

Foi numa visita de Lula (PT) a Pernambuco que surgiu a frase seguida de interrogação: “o que falta para ela entrar num partido da base?”. O presidente questionava isso a um colega petista em referência à governadora do estado.

O PSD é esse partido da base. Mas houve conversas e ensaios com um cenário no qual Raquel entraria no próprio PT. Havia, no círculo do Palácio do Campo das Princesas, quem defendesse essa possibilidade com uma estratégia muito clara para isolar João Campos (PSB) e deixá-lo afastado da popularidade do presidente. Obrigaria o prefeito do Recife a ser oposição a Lula ou ficar neutro, sem subir em palanque estadual. Os altos índices de aprovação do líder petista em Pernambuco seriam a chave desse plano.

Mas, que aprovação?

Opções

Primeiro, é importante dizer que a transferência de Raquel Lyra, do PSDB para o PSD, está acertada desde antes das eleições municipais. A data para oficializá-la é que foi mudando, atendendo ao contexto político, hora da governadora, hora do PSD e do próprio PSDB. Seria logo após o pleito, ficou para o fim do ano, passou para o início de janeiro, fim de janeiro e, agora, anuncia-se para o dia 10 de março. Raquel ainda não confirma diretamente, mas o PSD já prepara um evento.

A hipótese de ir para o PT estava sobre a mesa sempre, como também foi discutida a possibilidade de integrar o MDB, mas nunca foi algo levado a sério pela governadora. Os dois partidos são difíceis.

MDB

No caso do MDB é um problema local. Raquel e Raul Henry, que preside o MDB estadual, não são próximos. Ela até tentou ganhar força dentro do partido e conseguiu uma boa aproximação, mas no período das eleições municipais o esforço foi perdido com a articulação entre João Campos e o prefeito de Vitória de Santo Antão, Paulo Roberto (MDB). Este era aliado do Palácio e mudou de lado.

Mesmo que controlasse a sigla, a governadora chegaria como alguém que divide e conquista. Isso sempre é ruim. No PSD ela agrega.

PT

Com o PT a questão não é ter ou não ter unidade local. O PT é um partido que vive e se alimenta de contradições internas e que dificilmente fogem ao controle do grupo. Tirando o episódio de 2012, quando a briga escalou e deu prejuízo grande, normalmente eles se “estapeiam”, mas terminam numa unidade possível e vantajosa para quase todos. Haveria resistência do grupo ligado a Teresa Leitão (PT), mas seria algo facilmente administrável. Há, porém, dois riscos: um de forma e outro de conteúdo.

Forma

No caso da forma, seria difícil explicar ao eleitor de centro, centro-direita e direita, como foi acontecer de a candidata de 2022 que se apresentava como porto seguro e neutro para os que estavam cansados da “polarização esquerda x direita” transformou-se numa petista de carteirinha (literalmente).

De repente, todo o discurso de “querer o voto para desenvolver o estado” independente de ideologia e todo o esforço para mostrar que a aproximação com o governo Lula se dá “pelo bem do estado e não por aproximação ideológica”, iriam por água abaixo. Haveria afastamento de todos os apoiadores que não fossem adeptos do lulopetismo.

Conteúdo

No caso do conteúdo, o risco seria pela aprovação local do governo Lula. Estando no PT, é difícil sustentar a ideia de que a relação carrega o pragmatismo da busca de verbas. O governo Raquel viraria sócio do governo Lula automaticamente. E isso não seria problema num cenário de alta aprovação lulista por aqui, o que era comum. Mas tudo pode mudar muito rápido, como mudou.

A pesquisa Genial/Quaest com a aprovação do governo petista despencou em Pernambuco. Em dois meses, as menções positivas perderam 17 pontos percentuais. A rejeição passou a ser maior que a aprovação pela primeira vez na terra natal de Lula.

Neste cenário, estar junto é bom, dentro não.

Texto e contexto

Raquel Lyra indo para o PSD é como visualizar uma letra encontrando uma música, um texto e um contexto criando vínculos. O PSD de Gilberto Kassab construiu uma reputação de estar à margem do sangue que escorre dos embates ideológicos pouco objetivos do Brasil, onde se discute muito o que não se entende e se entende em excesso o que não existe.

Tendência

Não é por acaso que o próprio PSB, de João Campos, tem propostas para se transformar de “Socialista” em “Sociedade”, indo mais ao centro e tentando emular o comportamento do PSD. É a tendência dos próximos anos depois de um cansativo debate entre bolsonaristas e lulistas em que os dois tiveram chances e nenhum conseguiu fazer o país avançar.

Ganha-ganha

O curioso é que o posicionamento da governadora de Pernambuco já era esse desde a eleição de 2022. Pode nem ter sido o vislumbre de um futuro. Na época, em 2022, foi a condição do momento mesmo que a fez assumir essa posição. Agora é que virou objetivo dos partidos.

O casamento dela com o PSD acaba sendo bom para todos. O partido ganha uma governadora alinhada com esse futuro e diversos prefeitos que devem migrar para a sigla. Já a governadora ganha uma estrutura que o PSDB não tinha, além de fugir do risco de ficar num partido que teima em implodir pela divisão.

Pra frente

A mudança de partido é também um novo começo nas perspectivas da governadora. Mas isso tem que ser visto dessa maneira por ela. O PSD e Kassab têm condições de ajudar muito na articulação do governo de Pernambuco, tanto em Brasília quanto no Estado.

Para isso, é necessário que essa vantagem seja aceita e absorvida por quem trabalha no Palácio. Ouvir é bom, mas o resultado vem da ação.

Confira o podcast Cena Política

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