MERCADO

Liberação da venda direta de etanol das usinas para os postos vai baixar o preço do combustível? Entenda

A Medida Provisória (MP) editada pelo presidente Jair Bolsonaro nesta quarta-feira (11) autoriza a venda direta de etanol por produtores ou importadores a revendedores varejistas, dispensando a intermediação das distribuidoras

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Edilson Vieira

Publicado em 11/08/2021 às 20:49 | Atualizado em 11/08/2021 às 21:41
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A Medida Provisória (MP) editada pelo presidente Jair Bolsonaro nesta quarta-feira (11) autorizando a venda direta de etanol por produtores, ou importadores, a revendedores varejistas, dispensando assim a intermediação das distribuidoras de combustíveis, o que era obrigatório até a edição da medida, vai provocar profundas mudanças no mercado de combustíveis, disseram os entrevistados ouvidos pela reportagem do JC. A MP também permite que os postos de combustíveis de bandeiras definidas possam revender combustíveis de distribuidores diferentes da marca da sua bandeira, desde que fique sinalizado para o consumidor qual distribuidora é a fornecedora do combustível.

A MP entra em vigor ao final de três meses após a publicação no Diário Oficial (o que deve acontecer nesta quinta-feira-12). O tempo é necessário para que os estados possam se adequar aos novos processos de arrecadação do ICMS. A expectativa é que, com o fim da obrigatoriedade da presença das distribuidoras na venda entre as usinas e os postos, o custo do álcool caia, e o combustível chegue mais barato ao consumidor, seja quando misturado à gasolina como álcool etílico ou vendido nas bombas, como etanol.  Mas a relação entre venda direta e preço menor não é tão direta assim.

PAUTA

Reinvindicação antiga dos produtores de álcool, a iniciativa, segundo o governo federal, vai propiciar maior eficiência logística, com benefícios diretos aos consumidores, e maior competitividade ao setor. Ainda melhora o ambiente regulatório e trata de aspectos tributários do setor de combustíveis automotivos, diz a nota divulgada pelo Ministério das Minas Energia. 

Para não haver renúncia de receitas, o texto prevê que as alíquotas aplicáveis à venda direta de etanol serão aquelas decorrentes da soma das alíquotas atualmente previstas para o produtor ou importador com aquelas que seriam aplicáveis ao distribuidor (Lei 9.718/98). A MP ainda retira a desoneração tributária na venda de álcool anidro importado adicionado à gasolina pelo distribuidor quando este for importador, hipótese em que não há tributação nessa adição pelas distribuidoras. "Tal proposição tem a finalidade de equalizar a incidência tributária entre o produto nacional e o produto importado", diz a nota do Ministério das Minas e Energia.

SETORES

Para Alfredo Pinheiro Ramos, presidente do Sindicombustíveis - PE, a Medida Provisória é vista com reservas pelos donos de postos de combustíveis. Ele acredita que o governo acertou ao iniciar a discussão sobre  o mercado, mas se a intenção principal era a redução no preço do combustível para o consumidor final, a venda direta é apenas um componente da complexa cadeia de precificação do setor.

"O preço do etanol hoje é atrelado ao da gasolina, naquela proporção de 70% do valor. Assim, quando a gasolina aumenta, o etanol também aumenta. Outros fatores são a cotação do açúcar no mercado internacional e a valorização do dólar. Com o açúcar e o álcool valorizados, não há sobras" [da safra da cana para produção de mais álcool, o que reduziria os preços].  Ramos conta que, em relação ao preço da gasolina que puxa o valor do etanol para cima, a Petrobras poderia criar uma espécie de estoque regulatório para suportar a flutuação do preço do barril do petróleo no mercado internacional e a valorização do dólar, reduzindo o preço do combustível. "Isso parece exigir um esforço enorme, mas acredito que a Petrobras poderia fazer esse esforço pelo povo brasileiro".

Ramos acredita que a venda direta entre usinas e postos não contempla todo o mercado varejista, e passa pela criação de uma nova cadeia logística. "O dono de um posto de combustível pequeno (e eles são maioria), se organiza para comprar de uma vez, tudo o que precisa [gasolina, diesel e etanol] na base das distribuidoras no Porto de Suape. Se ele inventar de comprar somente etanol diretamente às usinas, será preciso uma outra logística, mais um custo com frete. Vai valer a pensa se ele comprar em grande quantidade. Tem ainda a questão dos postos do interior do estado. O dono de um posto no Sertão, longe das usinas produtoras de álcool, vão preferir continuar comprando das distribuidoras em Suape, não serão beneficiados em nada com a venda direta", diz Ramos. Para o presidente do Sindicombustíves, os possíveis beneficiados serão os postos que se localizam próximo às usinas produtoras, sobretudo na Mata Norte e Sul de Pernambuco.

PRODUTORES

O presidente-executivo da Novabio (associação de açúcar, etanol e bionergia) e presidente do Sindaçúcar-PE, Renato Cunha, destacou que ainda não tem conhecimento da redação final da MP, que só será conhecida após a publicação no Diário Oficial, mas se mostrou satisfeito com a inclusão de duas reivindicações antigas do setor, a venda direta "de maneira alternativa e complementar", e a mudança no processo de importação de etanol. "Até agora, as importadoras de etanol eles usufruiam de um crédito maior do que os produtores tinham no mercado interno, mas essa assimetria acabou", destacou ele.

Renato Cunha destacou que caberá aos produtores pagar os tributos que antes cabiam às distribuidoras, embora a venda indireta vá continuar existindo, sobretudo para as longas distâncias. 

Cunha disse ainda que o presidente Bolsonaro incluiu na MP a flexibilização para que os postos bandeirados (que utilizam uma marca de empresa petrolífera)  possam comprar etanol de outros fornecedores e não exclusivamente da sua bandeira. "Na verdade, isso já existia até 2012, depois foi cassada. A ideia é que isso contribua para a redução dos preços para ao consumidor", disse o presidente do Sindaçucar-PE.

Sobre a possibilidade de redução no preço do etanol com a venda direta, Renato Cunha pondera que "não pode responder por todo o setor", mas ele acredita que o posto que fizer a compra direta na usina terá a possibilidade de reduzir seu preço final, até porque "há um potencial claro de redução" baseado a uma economia de frete. "Não tem mágica. A possibilidade [de redução no preço] é balizada pelo frete. Antes o o etanol ia da usina para a distribuidora e de lá para o posto. Agora ele pode ir direto para o posto, se ele economiza no frete há potencial de redução no preço final", afirmou. Cunha lembrou de outras variáveis que compõem a precificação do produto. "A gente sabe também que o preço do etanol também é determinado em função do preço da gasolina, uma política de preços extremamente confusa. Mas eu vejo essa MP com esperança, porque é uma disrupção, uma possibilidade de você evoluir o varejo, promovendo uma competitividade mais salutar", argumentou.

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