FISCALIZAÇÃO

Ampliar a cobertura de creches é um desafio urgente e complexo; cobertura em Pernambuco é de 20%

O alerta foi resultado da "Operação Ordenada Educação Infantil 2023", realizada pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE)

Imagem do autor
Cadastrado por

Mirella Araújo

Publicado em 10/11/2023 às 14:51 | Atualizado em 10/11/2023 às 15:16
Notícia
X

Em Pernambuco, a cobertura do atendimento em creches corresponde a apenas 20%, o que significa que grande parte dos municípios está em nível considerado crítico e não conseguem cumprir a meta estabelecida pelo Plano Nacional de Educação (PNE).

O alerta foi resultado da “Operação Ordenada Educação Infantil 2023”, realizada pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE).

Ao apresentar os dados apurados durante a fiscalização que percorreu 2.500 unidade de ensino infantil em todos os 184 municípios pernambucanos, o presidente do TCE-PE, Ranilson Ramos, apontou que a falta de recursos seria o primeiro grande desafio para que os gestores consigam garantir políticas públicas para a primeira infância.

"Não é só porque o município tem a competência de executar, que ele necessariamente tem que ter o financiamento, ele precisa ser ajudado pelo governo federal e pelo governo do Estado", declarou Ramos, durante apresentação do balanço, na última quarta-feira (8). 

As equipes do Tribunal de Contas verificaram o percentual de cumprimento das metas de cobertura de vagas em cada município, a necessidade de construção de novas unidades de creche e pré-escola, a quantidade de profissionais e a proporção entre professores e alunos, para identificar casos de superlotação, além das condições de higiene e de saneamento (água, esgoto e destinação do lixo), entre outros quesitos.

Presidente da Comissão de Assuntos Municipais da Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) e ex-prefeito de Afogados da Ingazeira, o deputado estadual José Patriota (PSB), afirmou que a cultura de começar os investimentos na educação pelas ampliação da rede de creches, é algo recente. 

"As creches viraram uma prioridade em um tempo mais recente, então essa é uma questão a ser analisada. Como não tem os investimentos necessários para as estruturas, os financiamentos são escassos, imagine que vem o imobiliário e depois a grande dificuldade que era a manutenção", disse o parlamentar, que esteve à frente da Associação Municipalista de Pernambuco (Amupe) por dez anos. 

O parlamentar também chama atenção para o fato de que mesmo onde há cobertura no atendimento, grande parte das vagas são ofertadas em apenas um turno. "Isso é insuficiente para as mães que precisam trabalhar e muitas são arrimos de família. A grande reivindicação é que sejam oferecidas as vagas nos dois turnos", afirmou Patriota. 

A reportagem entrou em contato com a Amupe, mas a associação não disponibilizou nenhum porta-voz para falar sobre o tema. Em resposta, a assessoria de comunicação informou que a presidência da Amupe vai entrar em contato com os prefeitos para se inteirar sobre a situação apontada pelo relatório do TCE. 

RENATO RAMOS/JC IMAGEM
O presidente do TCE, Ranilson Ramos, informou que os resultados da auditoria serão encaminhados por ofício aos prefeitos de todos os municípios para ciência e correção das falhas e irregularidades - RENATO RAMOS/JC IMAGEM

RESPONSABILIDADE DOS ENTES DA FEDERAÇÃO

Em setembro, o Ministério da Educação (MEC), liberou R$ 95.226.251,05 para novas matrículas em turmas de educação infantil, em 221 municípios. Os recursos transferidos por meio do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) são destinados às creches e escolas públicas.

De acordo com a Secretaria de Educação Básica, essa montante foi direcionado para 19.756 novas vagas, sendo 6.727 em creches de período parcial e 4.431 em creches de período integral. Outras 7.447 vagas serão destinadas a vagas pré-escolares em período parcial e 1.151, em período integral. As informações são da Agência Brasil.

Os estados contemplados com essa liberação foram: Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rondônia, Roraima, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Sergipe e São Paulo.

Já no dia 6 de outubro, o Governo do Estado sancionou o Programa Estadual de Incentivo a Novas Turmas de Educação Infantil (Lei 18.326/2023), com objetivo de incentivar a criação de novas vagas em creches. No entanto, passado pouco mais de um mês, as prefeituras ainda aguardam a publicação do decreto com critérios, metodologias e prazos definidos para seleção dos municípios.

De acordo com o programa, a transferência dos recursos para os cofres municipais será feita a partir do mês e ano de funcionamento da nova unidade escolar durante 12 meses, ou até o mês anterior à remuneração das respectivas matrículas pelo Fundeb, o que ocorrer primeiro.

A secretária de Educação, Ivaneide Dantas, destacou que uma das prioridades da política de estado Juntos pela Educação é estabelecer o regime de colaboração com os municípios, e que um dos pontos altos desse gesto é a oferta de vagas em creches.

"A nossa perspectiva é a construção de 250 prédios para 60 mil vagas, mas não só a construção, nós queremos fazer o custeio de até um ano para essas creches. Também queremos colaborar pedagogicamente para realmente fortalecer a questão da primeira infância", disse a secretária, em entrevista concedida ao JC no dia 24 de outubro. Na ocasião, a reportagem também havia questionado sobre a publicação do decreto, mas não foi fornecida nenhuma previsão. 

ADMINISTRAÇÃO DOS RECURSOS E FISCALIZAÇÃO

Para o ex-presidente da Amupe José Patriota, a luta municipalista não é apenas sobre a abertura de novas matrículas, mas é com relação a manutenção destas creches. "O financiamento é que é o grande nó. Os municípios com recursos próprios, na conjuntura que está ai posta, não têm condições [de manter]", afirmou. 

Mas, um dado que chamou atenção no relatório do TCE-PE é que cidades consideradas maiores, e por consequência com mais recursos, não estavam nas melhores colocações. Sobre esse ponto, o analista de controle externo e um dos coordenadores da operação, Elmar Pessoa, diz que é preciso avaliar a aplicação dos recursos na educação infantil.

“A gente mostra que mais importante é a qualidade do gasto, do que os recursos que se disponibiliza para aquele fim. Às vezes se tem muitos recursos, mas não se aplica direito, ou tem até poucos recursos, mas os municípios aplicam de forma equilibrada conseguindo ter uma educação e equipamentos de qualidade”, pontuou o analista.

Os resultados da “Operação Ordenada Educação Infantil 2023” serão encaminhados por ofício aos prefeitos de todos os municípios para ciência e correção das falhas e irregularidades.

Segundo o presidente do TCE, com a inserção do Orçamento da Criança na Lei Orçamentária Anual (LOA) para o exercício de 2024, garantindo um espaço de financiamento específico para a primeira infância, será possível, inclusive, punir os municípios que não cumprirem com as garantias desses direitos. 

“E essa punição poderá ir até às últimas consequências, que é a rejeição de contas. Esse vai ser um dos itens que em breve, nos próximos exercícios, vai ser resultado para análise de aprovação ou rejeição de contas para os municípios e Estado, e todos os responsáveis pela Primeira Infância”, afirmou Ranilson Ramos. 

De acordo com o Executivo, para garantir ações, projetos e programas que visam à construção de políticas públicas e eficazes, o governo prevê um investimento de R$ 2.148.963.798,00 só para o próximo ano.

RANKING DOS MUNICÍPIOS

O levantamento divulgado pelo Tribunal de Contas analisou a taxa de cobertura da educação infantil de acordo com as metas estabelecidas no PNE. Eles foram confrontados com os dados do Censo 2022 e do Censo Escolar 2022, para identificar se são ofertadas vagas suficientes para atender 100% das crianças de pré-escola (4-5 anos) e no mínimo 50% das crianças de creche (0-3 anos).

No ranking dos dez municípios com as piores coberturas de creche, publicados pela reportagem na última quarta-feira, a cidade de São José do Belmonte, no Sertão do Estado, a cobertura no atendimento em creche é de 2,98%, o que significa um déficit de 1,1 mil vagos no munícipio.  

Esse dado foi contestado pela secretaria de Educação de São José do Belmonte, que por meio de nota, informou que o município atende hoje "cerca de 933 crianças em idade de creche e pré-escola, sendo 171 com 3 anos, 344 com 4 anos e 418 com 5 anos de idade"

"O TCE equivocadamente deixa de contabilizar as 171 crianças na faixa etária dos 3 anos, matriculadas na nossa rede. Os dados reais estão no Ministério da Educação e as informações indicadas no censo escolar de nosso município", disse o comunicado assinado pelo secretário de Educação Izaias Barros. 

Também por meio de nota, o Tribunal de Contas do Estado afirmou que os dados divulgados para o município de São José do Belmonte "estão estritamente de acordo com o Censo Escolar e o Censo Demográfico, ambos de 2022". "A partir da divulgação oficial do Censo Escolar de 2023 o TCE-PE atualizará o ranking de cobertura de creches e pré-escolas para todos os municípios pernambucanos”, disse o órgão de controle. 

 

ARTES/SJCC
Municípios listados nos ranking de cobertura de vagas em creches e pré-escola - ARTES/SJCC


Tags

Autor