Cenário econômico em Pernambuco, no Brasil e no Mundo, por Fernando Castilho

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Por Fernando Castilho
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Bolsonaro inventa o gênero óbvio irritante

O presidente tem conseguido, com suas frase curtas, dizer coisas óbvias que não apenas surpreendem o cidadão, mas o irritam

Fernando Castilho
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Publicado em 29/12/2020 às 6:00 | Atualizado em 29/12/2020 às 7:16
GABRIELA BILO/ESTADÃO CONTEÚDO
Bolsonaro tem se esmerado, por ocasião da covid-19, dizer coisas óbvias cuja contextualização surpreendem e irritam o cidadão - FOTO: GABRIELA BILO/ESTADÃO CONTEÚDO

Por Fernando Castilho da Coluna JC Negócios, do Jornal do Commercio 

Num artigo publicado em 2008, alisando o exagero como método, o professor José Luiz Ratton afirma que Nelson Rodrigues, “pelo seu exagero caricatural de uma análise confessadamente parcial, nos fazia ver o que estava escondido à compreensão rasteira e, ao final, nos convencia de que, bem ao seu gosto, nada mais havia feito do que exibir o óbvio, o óbvio ululante”.

Doze anos depois da competente análise rodrigueana do futebol brasileiro de Ratton, podemos dizer que o presidente Jair Bolsonaro inventou o que poderíamos chamar de "o óbvio irritante".

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O presidente tem conseguido, com suas frase curtas e vocabulário de pouco mais de 1.000 palavras, dizer coisas óbvias cuja contextualização não apenas surpreende o cidadão, eleitor, contribuinte, mas o irrita.

Bolsonaro tem se esmerado por ocasião da covid-19. E nessa segunda-feira (28) nos brindou com mais uma obviedade irritante ao dizer que os laboratórios é que deveriam estar interessados em pedir a autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para os imunizantes poderem ser usados aqui.

O presidente brindou apoiadores na frente do Palácio da Alvorada com o raciocínio de que "O Brasil tem 210 milhões de habitantes, um mercado consumidor de qualquer coisa enorme. Os laboratórios não tinham que estar interessados em vender para a gente? Por que eles não apresentam documentação na Anvisa?"

De fato, com 210 milhões de habitantes o Brasil é, obviamente, um mercado consumidor de qualquer coisa, inclusive vacina.

Nada mais ululante. Se não estivéssemos com a perturbadora situação de 190 mil mortes e 7,5 milhões de infectados. E nada mais óbvio que diante de uma situação tão crítica, os laboratórios estivessem ávidos por vendê-las.

Eles estão. Mas não a um cliente que parece desconhecer a realidade que o mundo, com seus 7 bilhões de habitantes, também quer a vacina. Portanto, desconhece uma lei da economia bem óbvia. Ela atende pelo nome de Lei da Oferta e Procura.

O presidente ululante também perguntou por que eles não apresentam documentação na Anvisa. Eles apresentaram, mas a Anvisa, certamente atuando como se fosse mais do interesse dos laboratórios em vender do que o Brasil precisar comprar, pediu informações que nenhuma outra nação pediu. Inclusive a FDA americana, de quem o Brasil segue protocolos.

É difícil para qualquer cidadão questionar as ações da Anvisa. Mas parece óbvio que o presidente, quando insiste que ela tem que aprovar e que será responsável pela aprovação de vacinas novíssimas, está pressionando a equipe. É óbvio.

Mas o presidente fez mais. Avalia que neste momento pode discutir preços, prazos, condições de pagamento e... entrega.

Não pode. O mercado não dá ao Brasil condições especiais, porque atrás do Brasil existe uma fila de interessados.

O problema dessa mensagem é o que ela embute: O presidente não está interessado em começar a vacinação. Na verdade, aparenta estar torcendo pelo repique das contaminações no final do ano.

O presidente voltou a dizer que nenhum dos quatro laboratórios que realizam testes clínicos com vacinas no País até agora apresentou pedido de registro ou uso emergencial à Anvisa.

Óbvio. Com exceção da Pfizer, que teve aprovação do FDA, mas recebeu demandas específicas da Anvisa para aprová-la no Brasil; e da Sputnik V, que já tem aprovação na Rússia, onde foi desenvolvida; não há registros a serem apresentados. Nem da CoronaVac, da China, e nem da britânica AstraZeneca. Nada mais óbvio.

Os gestos de Bolsonaro estão mais para Abelardo Barbosa (o Chacrinha), que para o gênio Nelson Rodrigues. Ele veio para confundir, e não para explicar. Embora choque tanto os seus eleitores como Rodrigues a seus leitores no Jornal do Brasil, mostrando coisas óbvias do cotidiano.

O problema é que não estamos no “Cassino do Chacrinha” e nem as histórias de tragédias humanas são diversão ou ficção. O presidente desrespeita famílias. Pessoas reais que a covid-19 privou de entes queridos. Não há nada de ululante nisso. Embora o desrespeito presidencial com a vida seja óbvio.

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