No meio do debate da compra de vacinas, o presidente Jair Bolsonaro se queixou das condições de venda do imunizante do laboratório Pfizer, acusando a companhia americana de impor cláusulas que violavam a soberania nacional.
As redes sociais do presidente se inflamaram, enrolando-se na bandeira nacional, criticando a empresa e defendendo a independência do País. Grande bobagem. O contrato padrão da Pfizer foi aceito por todas as ações porque a principal cláusula dizia que onde ela não tivesse produção de imunizantes, os possíveis efeitos colaterais das vacinas nas pessoas deveriam ser de responsabilidade dos governos locais.
Acreditando que a Pfizer faria um contrato específico paro Brasil, o então ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, esnobou os representantes da empresa de imunizantes e deixou sem respostas ao menos 10 propostas, até que a pressão do Congresso, no começo do ano passado, fez o Governo aprovar a compra das vacinas, embora o Brasil tenha perdido a vaga na lista de entregas.
Um ano depois, a gigante Pfizer virou a fornecedora preferencial do Governo, que já comprou mais de 400 milhões de doses da e pagou, ano passado, exatos R$ 9,88 bilhões em vacinas.
O volume de compras foi tão grande que a companhia teve que criar uma linha especial de cargas aéreas com entregas a partir do terceiro trimestre onde a cada semana ao menos cinco aviões traziam lotes de 1 milhão de doses em voos direto do aeroporto da Flórida (EUA) para Campinas (SP).
A Pfizer terminou o ano com o maior percentual de imunizantes aplicados do Brasil, desbancando a CoronaVac envasada no País pelo Instituto Butantan de São Paulo e que efetivamente vacinou os brasileiros mais velhos enquanto a vacina da AstraZeneca e a da Pfizer não estavam disponíveis.
A expertise da multinacional farmacêutica fez com que ela depositasse na Anvisa o pedido de registro definitivo de sua vacina, antecipando-se às concorrentes, e agora com as vacinas para as crianças, sendo a única fornecedora do imunizante para essa parte da população brasileira.
Como o Brasil tem 20 milhões de crianças na faixa de 5 a 11 anos, o Governo Bolsonaro terá que comprar R$ 40 milhões de doses para a vacinação desse público.
Curiosamente, a Pfizer queria fazer do Brasil seu grande aliado em 2020. Certamente, mirando o mercado de 400 milhões de doses que poderia vender, a empresa ofereceu parcerias para completar o desenvolvimento da vacina na fase 3, mas isso acabou sendo retardado.
Parte dessa questão se deveu a politização que Bolsonaro estabeleceu com o governador de São Paulo, João Doria, quando este, percebendo a inércia e até mesmo a resistência de Bolsonaro em comprar vacinas, anunciou um acordo com a chinesa Sinovac para a compra de 100 milhões de doses da CoronaVac, o que enfureceu Bolsonaro.
O presidente desautorizou e humilhou o general da ativa Eduardo Pazuello, revogando um acordo inicial de distribuição da vacina pelo Programa Nacional de Imunização, que o próprio Pazuello assinou meses depois de proferir a célebre frase: “Senhores. É simples assim, um manda ou outro obedece”, na maior manifestação de subserviência que um militar fez a um presidente da República.
De qualquer forma, enquanto Bolsonaro inventa nova polêmica dizendo que não vai vacinar sua filha, Laura, a Pfizer se prepara para emitir um novo lote de notas fiscais de vendas ao Brasil, já que é a única companhia com autorização da Anvisa para ter seus imunizantes usados em crianças.
No mercado de medicamentos, nada como um dia atrás do outro e uma pandemia no meio.
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