PISO SALARIAL DA ENFERMAGEM: Congresso usou Piso dos Enfermeiros para se cacifar nas eleições
A nível federal, o piso salarial da enfermagem só vai impactar apenas três empresas. A Hospitais Universitários Federais (EBSERH), o Grupo Hospitalar Conceição (RS) e o Hospital das Clínicas de Porto Alegre
O Congresso Nacional (com forte apoio do Centrão) e um grande número de deputados da oposição usou o projeto do piso salarial da enfermagem para se cacifar junto a possíveis eleitores nas próximas eleições, sem levar em conta a repercussão dessa nova despesa nos municípios onde serão votados.
Ninguém razoavelmente informado pode ser contra se definir e pagar um piso salarial aos 1,5 milhão de profissionais do setor. Até pela contribuição deles no enfrentamento da pandemia do coronavírus. Afinal, quem cuidou das pessoas nas enfermarias não foram apenas os médicos.
O problema é que, ao analisar a proposta do piso salarial da enfermagem apresentada pelo senador Fabiano Contarato (PT-ES), os parlamentares estavam mirando apenas na sua eleição, até porque deputado não é ordenador de despesas.
A reação de indignação dos profissionais da saúde contra a CNSaúde (Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos de Serviços), que entrou no STF contra a lei, é perfeitamente justa.
E, mais ainda, pela reação dos prefeitos e governadores, especialmente pelo risco de ela se tornar uma enorme frustração provocada na classe depois de toda sua mobilização.
Mas é preciso observar que, até agora, o mesmo Congresso que, celeremente, aprovou a nova lei do piso salarial da enfermagem, não se posicionou - tendo os seus presidentes Rodrigo Pacheco, do Senado, e Arthur Lira, da Câmara, afirmado que é preciso esperar o STF.
É uma situação bem cômoda do Congresso. Assim como é cômodo o posicionamento do presidente Jair Bolsonaro em dizer que o piso salarial da enfermagem tem que ser pago.
Antes da aprovação, o ministro da Economia, Paulo Guedes, explicou ao presidente que no setor público federal não haverá problema.
Na verdade, boa parte dos servidores da União já vêm recebendo acima do mínimo (embora distante do piso aprovado) de modo que, para a União, a despesa iria subir R$ 26,5 milhões por ano. E porque os hospitais federais são poucos e localizados no Rio Grande do Sul.
Existem apenas três empresas da área de saúde ligadas diretamente à União: a Hospitais Universitários Federais (EBSERH), o Grupo Hospitalar Conceição (RS) e o Hospital das Clinicas de Porto Alegre.
O ministro, porém, advertiu que o impacto efetivo será sobre as despesas dos chamados hospitais filantrópicos (em sua maioria vinculada às Santas Casas de Misericórdia) e sobre as prefeituras no segmento de equipes de saúde básica.
Haverá ainda impacto nos hospitais particulares, de modo que essa despesa fatalmente vai estar nos boletos dos planos de saúde de 2023.
A defesa do pagamento imediato do piso salarial da enfermagem vem mobilizando as entidades, mas nas últimas semanas o apoio dos deputados tem ficado restrito às suas contas nas redes sociais. E até mesmo os deputados do PT não estão tão ativos quanto estiveram no dia da aprovação.
O problema é que os prefeitos, que ainda têm dois anos de mandato, estão preocupados com a pressão dos custos já a partir de janeiro. E eles já começaram a reagir fortemente.
REAÇÃO DOS MUNICÍPIOS AO PISO DA ENFERMAGEM
Nesta segunda-feira, a Confederação Nacional de Municípios (CNM) apresentou ao STF um estudo em que aponta que, sem a fonte de custeio, o piso da enfermagem pode levar ao desligamento de quase 25% dos 143,3 mil profissionais da enfermagem ligados à Estratégia de Saúde da Família (ESF) e à desassistência de 35 milhões de brasileiros.
A CNM foi intimada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a apresentar, em até 60 dias, dados sobre os impactos da Lei 14.434/2022. A entidade estima que o piso deve gerar despesas de R$ 10,5 bilhões ao ano apenas aos cofres municipais.
A Confederação aponta que, dos 280 programas federais mapeados, 76 são da saúde. De acordo com o estudo, existem déficits de incentivos financeiros acumulados que chegam a cerca de 150% somente nos últimos dez anos.
Um exemplo é o incentivo destinado ao financiamento das equipes de Saúde da Família (eSF), principal eixo da Atenção Primária à Saúde.
Atualmente, 5.563 municípios integram o programa, que conta com 52.193 equipes credenciadas, além de representar uma cobertura cadastral de 153,8 milhões de pessoas, o que corresponde a 73,19% da população brasileira.
O impacto do piso da enfermagem, somente na estratégia Saúde da Família, será superior a R$ 1,8 bilhão no primeiro ano e, para manter os atuais R$ 6,1 bilhões de despesas com os profissionais de enfermagem, os Municípios brasileiros terão que descredenciar 11.849 equipes de eSF/eAP, representando uma redução de 23% no total de equipes.
PISO DA ENFERMAGEM x FUNDEB DOS PROFESSORES
O problema do piso salarial da enfermagem é que a categoria não tem um fundo especial como têm os professores, por exemplo.
O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) é um fundo especial, de natureza contábil e de âmbito estadual (um total de vinte e sete Fundos), composto por recursos provenientes de impostos e das transferências dos Estados, Distrito Federal e Municípios.
Além dos estados, integram a composição do Fundeb os recursos da União a título de complementação aos entes federados que não atingiram o valor mínimo por aluno/ano definido nacionalmente.
Ou seja, a União faz o complemento para que as verbas ajudem na melhoria de gestão e alcancem a evolução dos indicadores a serem definidos sobre atendimento e melhoria de aprendizagem com a redução das desigualdades.
Par se ter uma ideia do que é o Fundeb: da receita total do fundo em 2022, R$ 205,3 bilhões são as contribuições dos Estados, Distrito Federal e Municípios.
A complementação da União será de mais R$ 10,2 bilhões relativos a 5%, do mínimo de 10,5% a ser alcançado em 2026 e mais R$ 20,5 bilhões referente a 10% da complementação federal que serão pagos até 2026.
Os enfermeiros não têm nada disso e terão que se contentar com uma decisão do STF validando a nova lei sem que até agora se saiba de onde virá o dinheiro.