Cenário econômico em Pernambuco, no Brasil e no Mundo, por Fernando Castilho

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Por Fernando Castilho
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Lula vê Banco Central, Campos Neto e mercado como os gigantes que Cervantes descreveu em Dom Quixote

O presidente tem suas opiniões com altíssima taxa de certeza e não será Fernando Hadda quem vai faze-lo mudar.

Fernando Castilho
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Fernando Castilho
Publicado em 06/02/2023 às 16:30 | Atualizado em 06/02/2023 às 21:18
Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil
O ministro da Economia, Fernando Haddad,e o presidente Luiz Inácio Lula - FOTO: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

Em 1550, Miguel de Cervantes escreveu Dom Quixote de La Mancha onde conta a história de um cavaleiro que investe sua lança contra as imensas pás rodantes de um moinho de vento, enquanto seu fiel escudeiro Sancho Pança, o adverte com uma frase que entrou para história: Olhe bem. Aquilo não são gigantes, são moinhos de vento. E o que parece braços não são senão as velas, que tocadas do vento fazem trabalhar a pedra pesada e redonda para moinho.

A belíssima obra de Cervantes serve para ilustrar o comportamento do presidente, Lula da Silva nesse embate (que ele julga épico) com o presidente do Banco Centra, Roberto Campos Neto e por consequência com a manutenção da taxa Selic em 13,75% ao ano desde agosto do ano passado.

Como o cavaleiro De La Mancha, o presidente irrompe afirmando: Quero saber do que serviu a independência do Banco Central? Eu vou esperar esse cidadão (Roberto Campos Neto) terminar o mandato dele para fazermos uma avaliação do que significou o banco central independente. Mas quero dizer que isso é irrelevante para mim. Isso é irrelevante, não está na minha pauta. O que está na pauta é a questão da taxa de juros."

De fato,  a questão da taxa de juros é o que importa. Só que o presidente tem suas opiniões com altíssima taxa de certeza e, certamente, não será o fiel escudeiro, Fernando Haddad que o fará vê não faz sentido lutar contrar os moinhos de vento que ele enchega comandando a economia global. O presidente acredita que Banco Central é para baixar taxa de juros para ajudar o governo.

Não é assim que a banda toca. Em 2012, a então presidente Dilma Rousseff também achava isso. E ela foi mais longe ao determinar que o Banco do Brasil e a Caixa Econômica reduzissem suas taxas e cobrar a diminuição do "spread" dos bancos (a diferença entre o que o banco "paga" para captar dinheiro e o que ele "recebe" pelos empréstimos). E sabemos onde isso nos levou em 2015 e 2016.

O presidente Lula agora quer o Banco Central baixe a Selic, sem se preocupar como se forma a taxa básica de juros. O presidente tem absoluta certeza de que o presidente do BC pode numa reunião do Copom baixar a taxa. E o critica por não fazer isso no início de seu Governo.

Lula, certamente, nunca leu uma ata de reunião do Copom onde os diretores explicam direitinho porque ela sobre e porque ela desce. As atas do Copom são uma herança da criação do Plano Real, em 1994, quando o BC passou a publicá-las.

Por exemplo, na ata de 4 de agosto de 2020, o BC justificou a redução da taxa básica de juros em 0,25 ponto percentual, para 2,00% a.a. dizendo que o Copom entendia que a conjuntura econômica continuva a prescrever estímulo monetário extraordinariamente elevado. E que as projeções de inflação de seu cenário básico estavam suficientemente próximas da meta de inflação.

Assim como, em 15 de março de 2021, decidiu elevar a taxa básica de juros em 0,75 ponto percentual, para 2,75% a.a. iniciando a série de altas que chegou aos 13,75% - reclamados por Lula - avaliando que, naquela momento, o cenário já não prescrevia um grau de estímulo extraordinário e lembrou que o PIB encerrou 2020 com crescimento.

Funciona assim desde junho de 1994. Tanto que quando a inflação de 2021 disparou o BC decidiu elevar a taxa básica de juros em 0,50 ponto percentual, para 13,75% a.a. afirmou que a decisão refletia a incerteza ao redor de seus cenários e um balanço de riscos ainda maior para a inflação.

Bolsonaro, em campanha para reeleição, reclamava que a taxa estava um absurdo Mas não se queixava de Roberto Campos Neto que, no seu governo, ganhara autonomia para ficar até 2024. Até porque ele mesmo estava gastando o que o Governo não tinha.

Então, a reclamação do presidente Lula, porque o Copom manteve a taxa em 13,75, ao ano, é frágil. Porque o BC lembrou que o cenário de desaceleração do crescimento o mercado de trabalho segue menor que nos meses anteriores de modo que a manutenção da taxa básica de juros por um período suficientemente prolongado será capaz de ajudar na queda da inflação.

A ideia da manutenção da taxa básica num período prolongado é o que irrita e assusta o presidente. Este ano, a previsão da taxa de inflação é de 5,78% porque o mercado financeiro não ver atitudes do novo governo no controle das contas públicas.

Para completar, o presidente não ajuda muito. Ele insiste em assumir o papel de Dom Quixote de La Mancha lutando contra os moinhos de vento esquecendo que quanto mais faz isso, quem está pagando a conta é cidadão eleitor contribuinte que nessa disputa assume o papel da móz, pedra pesada e redonda para moinho.

Para os bancos, os investidores e para mundo corporativo, a opinião de Lula não tem qualquer importância no sentido de baixar as expectativas das taxas de juros se elas não forem acompanhadas de ações do fiel escudeiro Fernando Haddad.

Dificilmente, o Governo Lula terá condições políticas de revogar a lei que deu autonomia ao BC, em 2024. Precisará ter mais capital politico do que tem hoje no começo do Governo. Haddad sabe disso, embora no inicio o governo Lula tenha mudado regras que não ajudam a passar uma imagem de um governo preocupado com as contas.

O cavaleiro de La Mancha continuará a brigar com moinhos de vento que só ele avalia como uma ameaça ao seu Governo. E enquanto isso, o mercado vai aumentando não só a taxa Selic, mas os custos dos juros de longo prazo que, tradicionalmente, caem muito no início dos governos, mas que no de Lula estão subindo.

Mas o presidente continuará a duelar com Roberto Campos Neto, com os bancos e com o vento. Acreditando que, como no romance de Cervantes que “esta é uma boa guerra, e bom serviço faz a Deus quem tira tão má raça da face da terra”.

Paciência.

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