Cenário econômico em Pernambuco, no Brasil e no Mundo, por Fernando Castilho

JC Negócios

Por Fernando Castilho
[email protected]

Informação e análise econômica, negócios e mercados

Coluna JC Negócios

Brasil adere ao consumo de cerveja puro malte e quer produzir seu próprio lúpulo

Consumindo quase 15 bilhões de litros, acostumando-se a beber cerveja puro malte em vasilhame de vidro, o próximo passo do Brasil foi de produzir seu próprio lúpulo, um dos quatro elementos que formam a cerveja

Fernando Castilho
Cadastrado por
Fernando Castilho
Publicado em 22/02/2023 às 13:00 | Atualizado em 22/02/2023 às 15:51
Aprolúpulo
O próximo passo do Brasil foi de produzir seu próprio lúpulo, um dos quatro elementos que formam a cerveja que são água, malte, lúpulo e leveduras - FOTO: Aprolúpulo

O novo Relatório Global de Consumo da Cerveja da Kirin Holdings, publicado há um mês, revela que o Brasil continua sendo o terceiro maior consumidor de cerveja do mundo, perdendo apenas para a China e para os Estados Unidos. Ano passado, bebemos 14,54 bilhões de litros e tomamos 7,8% de toda cerveja servida no mundo.

Mas o fato novo no mercado Brasil foi o crescimento das cervejas puro malte, algo que há pouco mais de uma década, simplesmente não existia. Entre os anos de 2015 e 2020, o consumo de cervejas puro malte cresceu em 85% no País.

Na verdade, o Brasil ainda bebe, essencialmente, as cervejas pilsen, que representam 55% de todo o mercado. E mesmo que 43% das embalagens de cervejas no Brasil já sejam em vasilhames de vidro, especialmente as garrafas retornáveis, que são servidas nos bares e restaurantes na porção 600 ml, o aumento do consumo da cerveja puro malte acabou pressionando o mercado para a embalagem de vidro, especialmente a de 365ml não retornável.

Picasa Aprolúpulo
Produtores brasileiros buscam um lúpulo com mais qualidade em 2020 a área de plantio aumentou 110% em relação a 2019. - Picasa Aprolúpulo

O aumento das cervejas de melhor qualidade fez explodir o setor de cervejas artesanais, que também só usam vasilhame de vidros. Segundo o Anuário Brasileiro da Cerveja de 2022, do Ministério da Agricultura, o Brasil fechou 2021 com o número de produtos registrados de 35.741.

Apenas nos últimos 5 anos, o maior aumento de produtos registrados passou de 8.790 produtos em 2018 para 15.554 em 2022, um crescimento de 77,0 %.

EM BUSCA DO LUPULO.BR

Consumindo quase 15 bilhões de litros, acostumando-se a beber cerveja puro malte em vasilhame de vidro, o próximo passo do Brasil foi de produzir seu próprio lúpulo, um dos quatro elementos que formam a cerveja, que são: água, malte, lúpulo e leveduras que transformam o álcool em açúcar e gás carbônico.

Mas o fato é que produzir lúpulo não é fácil. O Brasil não está na melhor zona do mundo para essa planta, que faz parte da família da cannabis e ainda terá que percorrer um longo caminho para conseguir uma curva de aprendizado.

O Humulus Lupulus L., ou lúpulo, é usado na fabricação de cerveja, mas apenas as inflorescências femininas, os chamados cones, cuja função é conferir amargor, sabor, aroma e propriedades bacteriostáticas. E pela produção por séculos, as melhores variedades são as europeias, selecionadas naturalmente ao longo de vários séculos, chamadas de Lúpulos Nobres.

O Brasil quer entrar nesse mercado, que é altamente rentável, sustentável, pode ser produzido por pequenos produtores e suprir parte da indústria cervejeira que hoje importa dos Estados Unidos, Alemanha, Argentina e África do Sul (4.800 toneladas) quase 100% do utiliza.

E de olho no crescimento das cervejas artesanais, que buscam um lúpulo com mais qualidade. Em 2020, a área de plantio aumentou 110% em relação a 2019, chegando a 42 hectares e 24 toneladas produzidas, segundo a Associação Brasileira de Produtores de Lúpulo (Aprolúpulo), fundada em 2018 e hoje com 120 associados em onze Estados brasileiros.

Atualmente, 17 viveiros estão cadastrados no Registro Nacional de Sementes e Mudas (RENASEM), com pedidos para comercialização de mudas de lúpulo no Brasil, dois deles no Nordeste em Camaçari (BA) e Nísia Floresta (RN). O lúpulo virou uma cultura de tanto potencial que existem hoje registrados 4 TCCs, 9 dissertações de Mestrado e 11 teses de doutorado sobre a planta.

Mas o que interessa para o mercado é o potencial de negócios. Tanto que a gigante Ambev implantou no município de Lages (SC) desde 2019 um projeto de fomento ao cultivo de lúpulo, especialmente voltado para agricultura familiar.

O projeto consiste em abranger produtores rurais num raio de 100 km de Lages, preferencialmente enquadrados como agricultores familiares e que tenham interesse em ingressar no cultivo de lúpulo.

Como a Ambev tem uma cervejaria em Lages, foi montada pela empresa uma unidade de processamento de lúpulo, com todas as etapas de pós colheita (separação dos cones das ramas, secagem, peletização, embalagem e armazenagem a frio).

ENTREGAR LÚPULO PELETIZADO

A questão da peletização é estratégica, porque se é difícil produzir e colher lúpulo, mais difícil é entregar ao cervejeiro um produto que ele possa usar para fazer seus produtos, especialmente as cervejarias artesanais.

A Ambev não está só. O Grupo Petrópolis, terceiro maior grupo cervejeiro do país, anunciou que a venda do lúpulo cultivado em Teresópolis (RJ) ocorrerá a partir de abril através do e-commerce Bom de Beer, nas variedades Cascade Argentino e Triple Pearl.

O objetivo é desenvolver a cultura no país para atender à crescente demanda do mercado cervejeiro nacional, com a proposta de disseminar conhecimento adquirido e facilitar o acesso do lúpulo aos pequenos produtores.

Como um dos três maiores consumidores de cerveja do mundo, os brasileiros têm vários motivos para considerar a cerveja um produto 100% nacional. Mas com a total importação de lúpulo e 68% de malte, dizer que a cerveja é uma bebida brasileira é forçar a barra.

Grupo Petropolis
Lupulo das As variedades Cascade Argentino e Triple Pearl. - Grupo Petropolis

Cervejeiros têm linguagem, estilo e modo de produzir cervejas. Pouca gente sabe que Porto Alegre é a cidade com mais registro de marcas de cerveja do Brasil (1.581), suprindo São Paulo (1.549), marcas que podem disputar o mercado.

Daí porque os cervejeiros raiz desejarem ter um lúpulo.br. Depois de quase uma década tentando, o único estilo considerado nativo é o Catharina Sour, oficializado em 2018 uma versão frutada do Berliner Weisse que dificilmente o consumidor encontrará nos bares de cerveja artesanal do país, nos quais as cervejas IPAs costumam roubar a cena.

ORIGEM DA CERVEJA IPA

Praticamente todo o consumidor brasileiro bebe cerveja IPA, que é sigla de India Pale Ale, que foi desenvolvido na Inglaterra do Século XIX, para abastecer a colônia inglesa na Índia.

Os cervejeiros da cidade de Burton-on-Trent começaram a produzir suas Pale Ale com altas doses da planta, de olho no comércio entre Londres e Calcutá, com mais lúpulo e com um teor alcóolico mais alto.

Mas os pubs em Londres descobriram e começaram a exigir a “Pale Ale das Índias”.

A Embrapa, assim como fez com a soja e o milho, que foram modernizados, acha que o Brasil também pode ser um grande produtor de lúpulo. As áreas serranas são consideradas as mais aptas, embora em algumas regiões temperadas, com até 14 horas de luminosidade se consegue um bom resultado do lúpulo.

Na verdade, lúpulo precisa de luz solar para crescer e depois brotar as sementes. Isso é o que produtores do Nordeste também veem como potencial, pois se é uma coisa que a Região tem é luminosidade, daí a aposta de produtores do RN e BA.

Aprolúpulo
Catharina Sour, oficializado em 2018 uma versão frutada do Berliner Weisse. - Aprolúpulo

Se o Brasil conseguir formar, como está formando, uma Rede Lúpulo, estará resgatando uma tentativa de produção de lúpulo em território nacional de 1869, pelo comendador Pereira Bastos, que plantou 159 plantas. Naquele período, foram registrados resultados positivos na Fazenda Normal, no Jardim Botânico do Rio de Janeiro.

O mercado de lúpulo é extraordinário. Dados do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC) apontam que, em 2020, o Brasil importou 3.243 mil toneladas de lúpulo, o equivalente a US$ 57 milhões.

Outro insumo que compõe a cerveja é a cevada, matéria-prima do malte, principal fonte de açúcares fermentáveis, que confere corpo, cor, aromas e sabores para a bebida.

Para que possa ser utilizado, o cereal passa por processamento para produção do malte cervejeiro. Em 2021, a produção passou de 424 mil toneladas. A demanda por malte no país é de cerca de 1,6 milhão de tonelada. O Brasil produz cerca de 32% desse volume e importa o restante.

Se o Brasil produzir lúpulo e malte, vai poder ampliar a participação dos componentes nacionais na nossa cerveja, já que a água nós temos, e por que as leveduras - que transformam o álcool em açúcar e gás carbônico e são responsáveis pela carbonatação das cervejas - não têm tanto peso na formatação da cerveja.

Então estaremos mais próximos da cerveja 100% nacional.

Aprolúpulo
dois deles no Nordeste em Camaçari (BA) e Nísia Floresta (RN). - Aprolúpulo

SAIBA MAIS

ANUÁRIO DA CERVEJA

Associação Nacional dos Produtores de Lúpulo

Comentários

Últimas notícias