Silvio Santos criou uma marca, um novo negócio e uma rede de TV cantando nas tardes de domingo

Silvio Santos, ao lado de Adolpho Bloch, da Revista Manchete, são responsáveis pela maior rasteira em empresas de prestígio no jornalismo no Brasil.

Publicado em 18/08/2024 às 23:00

Agora que o Brasil já rendeu as homenagens a Silvio Santos, certamente o maior apresentador de televisão brasileira, cabem dois minutos de conversa sobre esse personagem da cena nacional em diversos aspectos e que vão do showbiz à economia criativa passando por vários negócios, inclusive o financeiro.

Silvio Santos é reconhecido pela sua colaboração à formação da TV brasileira. Mas o que é pouco destacado na sua biografia é como ele transformou o seu ofício em negócio e em cima desse negócios criar outros.

As pessoas se acostumaram a dizer que Silvio Santos começou a vida vendendo canetas bicolor no Rio de Janeiro e fez tanto sucesso que acabou virando um empresário bem-sucedido.

Isso é verdade, mas isso não seria suficiente para colocá-lo no mundo dos negócios apenas pelo seu sorriso. Silvio Santos, como se sabe, sempre pagou suas contas na juventude com a voz e o sorriso.

Mas o que o torna diferenciado é como ele sai da rádio e entra na TV aproveitando uma oportunidade que estava ali para ser aproveitada e que os donos de TV na época sequer conseguiam perceber.

Novo horário na TV

O negócio que projetou Silvio Santos começou, de fato, quando ele alugou um horário que ninguém da TV achava que poderia gerar receita nas manhãs de domingo. Para quem não lembra, na década de 70, a TV brasileira podia até dizer que começava pela manhã e terminava de madrugada. Mas a verdade é que só existia das 12 às 22 horas.

Por isso, quando ele começou a fazer seu programa nas manhãs de domingo ninguém prestou atenção. E é aí que o apresentador Silvio Santos vira empresário de rede de TV porque ele começou a inventar atrações de baixo custo, transformando desconhecidos em astros pelo talento. Em 60 anos de Programas Silvio Santos, ele criou mais de 50 programas dentro do programa.

Silvio Santos começou seu negócio vendendo anúncios baratos de baixo custo para empresas de pequeno e médio porte. E boa parte não tinha nem uma agência de publicidade. Foi no programa Silvio Santos que o hoje ancora boa parte dos programas dos horários mais baratos, o merchandising começou a se estruturar.

Além disso, quando ele começou a pensar como capitão de rede percebeu que ninguém iria lhe dar um canal. Precisava comprar e assim ele começou a organizar sua empresa de mídia nacional comprando participações para exibir seu Programa Silvio Santos.

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Silvio Santos com Lula - Divulgação

Rasteira de TV

Silvio Santos, ao lado de Adolpho Bloch, dono da Revista Manchete, são responsáveis pela maior rasteira em duas empresas de altíssimo prestígio no jornalismo no Brasil quando venceu a concorrência pelos canais da extinta TV Clube, cujo governo militar tomou dos Diários Associados.

Dez entre dez banqueiros achavam que o Jornal do Brasil do Nascimento Brito teria uma das duas redes e o Victor Civita levaria a outra. Seria a TVJB e a TV Abril.

Ganharam Silvio Santos e Adolpho Bloch que criaram o Sistema Brasileiro de Televisão e a Rede Manchete. Bloch não conseguiu sobreviver no novo negócio. Talvez porque sua emoção fosse o papel e as tintas das revistas.

Então Silvio Santos criou a segunda rede de televisão a partir das praças dos estados. Ganhou uma rede nova mesmo tendo 50% da TV Studios Silvio Santos e 50% da TV Record, que mais tarde comprada pela IURD do Bispo Macedo.

A TVS virou rede

Isso não aconteceu por acaso. Bloch era respeitado pelos militares e isso pesou para que o presidente João Figueiredo lhe desse os canais.

Entretanto, Silvio Santos precisou construir um caminho e para isso ele não hesitou em abrir uma resenha semanal para mostrar os despachos mais importantes no meio do Programa Silvio Santos. Era A semana do presidente. Exibido a custo zero. A atração continuaria no ar até o governo de Fernando Henrique Cardoso.

Deu certo e quando ele venceu a concorrência o SBT já estava pronto para funcionar enquanto Bloch precisaria selecionar as máquinas e construir os prédios.

Baú da Felicidade

Outra coisa que pouca gente fala é como ele estruturou um veículo de financiamento de custo financeiro zero com o Baú da Felicidade. A história de que ele pegou um sistema de carne de prêmios de Manoel da Nóbrega que estava falido e transformou no Carnê do Baú e a seguir na Telesena não conta que Silvio viu um negócio financeiro ancorado em prêmios.

Para o cliente o Carnê do Baú era uma sistema de prêmios onde a partir de uma parcelinha “paga rigorosamente em dia” a pessoa concorria um prêmio em dinheiro ou até um carro zero quilômetro.

O que pouca gente sabe é que atrás da ideia lúdica de acertar as dezenas do carnê do baú estava montado numa empresa de venda de títulos de capitalização (a Liderança) que gerenciava o financeiro resultante dos milhões de pessoas.

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Criação da Telesena - Divulgação

Liderança da Telesena

Isso representava uma captação de recursos enorme que ajudava muito nas despesas da rede de TV e do grupo. Até porque além de funcionar como um veículo financeiro também era um anunciante. Por que, contabilmente, a Liderança da Telesena pagava tabela cheia.

Quando Silvio Santos virou rede, ele viu uma oportunidade na locação de horários da madrugada às igrejas neopentecostais e passou a aceitar a ocupação de horários que, anos depois, fizeram o Bispo Edir Macedo usar o mesmo esquema de capitalização de custo zero para a Igreja Universal do Reino de Deus quando conseguiu comprar a Record que lá atrás tinha sido em parte de Silvio Santos.

O que na Liderança Capitalização permitia que o SBT recebesse financiamento de capital de giro a custo zero além de faturar com a publicidade da Tele Sena, na Record serviu para também ter um veículo financeiro com a IURD comprando a preço de tabela cheia os horários de seus cultos.

O que pouca gente sabe é que isso ajudou muito no fluxo de caixa do SBT. Hoje, a Liderança Capitalização não lidera mais o mercado de título de capitalização, porque os mega bancos descobriram o potencial de mercado usando o Título de Capitalização como segundo produto de concessão de crédito. Mas ainda hoje, o Grupo Silvio Santos ganha muito dinheiro com a Telesena.

Criando em cima de sucesso

Uma coisa que era a marca de Silvio Santos era criar um novo negócio usando o sucesso de outro negócio. Quando ele criou a marca de perfumes Jequiti. Ele contratou a produção de perfumes de uma empresa terceirizada e passou a dizer às consultoras da Avon ou da Natura no programa Silvio Santos que poderiam também vender os produtos da Jequiti.

Foi uma jogada extraordinária, pois ele estava oferecendo às consultoras de duas gigantes ter um marca de segunda linha agregando renda. Não se sabe se a Avon e a Natura gostaram disso, mas hoje tem muita gente vendendo apenas a linha jequiti.

As pessoas falam do empresário Sílvio Santos como empreendedor, mas o que pouca gente fala é que ele era intuitivo. Tentativa e erro. Isso num ramo de TV é complicado porque TV assim como rádio é hábito .

Mas Silvio Santos era o dono e o que não respondia no Ibope fora do Programa Silvio Santos ele cortava sem nenhuma cerimônia.

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Silvio Santos - Divulgação

Banco Panamericano

E isso ficou muito claro, em 2010, quando o Banco Panamericano que ele havia criado entrou no redesconto e ele decidiu usar seu prestígio para que a instituição não tivesse sua liquidação extrajudicial decretada. O Banco Central apontou novo problema nas contas do Panamericano: um rombo de R$2,5 bilhões. Sem essa capitalização, a instituição, que agora tinha um banco estatal como sócio, seria liquidada.

A Caixa Econômica comprou parte do banco de Sílvio Santos que não precisou recorrer a seu patrimônio. Em 2021, a Caixa vendeu sua participação no Panamericano, encerrando sua ligação com o banco.

Como se sabe, quando o BC decreta uma liquidação extrajudicial, todo o patrimônio da empresa que o controla é afetado. Ele resolveu rápido que não poderia correr o risco de ter sua empresa mãe travada por uma liquidação extra judicial. Ele conseguiu vender o banco e se livrar de uma crise que enterraria sua empresa.

Finalmente é importante observar que Silvio Santos foi o dono de uma das maiores marcas do mercado brasileiro. Ela por mais de 50 anos foi o produto que vendeu tudo o que anunciou. No fundo Silvio Santos virou uma marca ultrapassando o patamar de uma pessoa. Na língua popular, Silvio Santos virou uma autarquia.

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